quarta-feira, 30 de março de 2011

Awá-Guajá isolados fazem contatos com Guajajara na T.I. Arariboia



Em fevereiro deste ano, indígenas do povo Tenetehara/Guajajara tiveram contato com grupo isolado, por opção, na Terra Indígena Araribóia. As lideranças indígenas Edilsom, Alcides, Zezico e Luís Carlos, todos Tenetehara/Guajajara, informaram à equipe do Cimi Regional Maranhão que no final de fevereiro o indígena Clóvis Guajajara encontrou um jovem Awá, no centro (roça) próximo a aldeia Vargem Limpa, na terra indígena Araribóia, oeste do Maranhão. Segundo os indígenas, no momento do encontro com o jovem este saiu correndo, mas em seguida retornou com seu grupo, composto de cinco integrantes. Além dessas cinco pessoas, havia outras que ficaram de longe a observar.


Clóvis não soube dizer exatamente quantas pessoas eram, mas informou que havia jovens, crianças e idosos. De acordo com os indígenas, houve uma tentativa de diálogo por parte de Clóvis, que não obteve sucesso. O grupo, que na negativa de conversas, retornou à mata, demonstrou mais uma vez a renúncia do povo Awá em fazer contato com outros indígenas. O povo Awá, assim como diversos povos indígenas do país, continua ameaçado pela ação dos madeireiros, que agem impunemente na terra indígena Araribóia e que estão chegando cada vez mais próximo das aldeias do povo Guajajara. Numa ação desrespeitosa para com as comunidades indígenas, tais atividades têm colocado em risco a vida dos grupos Awá que vivem dentro do território, onde encontram caça e frutas em abundância.


Os Tenetehara/Guajajara estão preocupados e denunciam a ação dos madeireiros no estado. A região onde o grupo foi avistado é um dos últimos lugares que não tinha a ação predatória dos madeireiros, rica em recursos naturais indispensáveis para a sobrevivência dos Awá, como também dos Guajajara. Segundo os indígenas, a região é composta de árvores de grande porte, a mata nativa, riqueza hoje ameaçada pelas atividades madeireiras.


Os indígenas denunciam ainda omissão da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Ibama em relação à depredação das terras indígenas pelos madeireiros, velhos conhecidos na região. De acordo com eles, houve um aumento significativo da presença de madeireiros que entram dia e noite na terra, destruindo os últimos recursos naturais onde vivem os grupos Awá, povo com grupos isolados e outros de recente contato. (Fonte: CIMI/MA)

segunda-feira, 28 de março de 2011

Morre aos 88 anos José Comblin, teólogo e profeta!



'É com tristeza que comunico a vocês que, na manhã de hoje, domingo, dia 27 de março, depois de completar 88 anos, nesta semana, faleceu no interior da Bahia, onde estava assessorando grupos de base, o amigo e mestre de todos nós, José Comblin. Levantou-se cedo, tomou banho, aprontou-se, mas não apareceu para a oração da manhã. Procuram-no e o encontraram-no sentado no quarto e já morto. Rezemos por ele que dedicou praticamente toda sua vida ao povo e à Igreja da América Latina, no Brasil, no Chile e no Equador e em centenas de assessorias por todos os países. Ele veio para o Brasil em 1958, junto com o Pe. Michel Schooyans e o Pe. Laga, todos doutores por Lovaina, mas que foram dar aulas no seminário menor, para onde os mandou o Bispo Paulo de Tarso! Esteve conosco antes da Conferência de Aparecida, analisando a situação e dando-nos todo apoio, para as iniciativas do Fórum. Perdemos um mestre e um guia inquieto e exigente como os velhos profetas, denunciando sempre nossas incoerências na fidelidade aos preferidos de Deus: o pobre, o órfão, a viúva, o estrangeiro. Trabalhou por uma Igreja profética a serviço destes últimos nas nossas sociedades. Que ele siga nos inspirando e acompanhando. Sentiremos e muita sua falta'.


(Padre Oscar Beozzo)

sábado, 26 de março de 2011

Mais um índio baleado no Maranhão. A luta dos Krikati não conhece fim.

Em 9 de março, o indígena Bebeto Tum Krikati, de 24 anos, que vive na Terra Indígena Krikati, foi baleado no tórax enquanto caçava dentro de seu território. Ele ainda está internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital em Imperatriz (MA) em estado muito grave. Lideranças indígenas na região acreditam que esse ataque tem relação com o processo em curso de 'desintrusão' da terra, ou seja, a saída dos fazendeiros do território reservado aos índios.O mandante da tentativa de homicídio foi um dos fazendeiros que invadiram as terras e tem que deixá-la, de acordo com as lideranças indígenas.


O povo indígena Krikati vive uma a situação de conflito praticamente permanente no sudeste do Maranhão, onde ficam cinco aldeias distribuídas numa área de 146 mil hectares, com as ameaças dos fazendeiros. A área abrange quatro municípios maranhenses, em uma região marcada pela grilagem de terras por fazendeiros nas décadas passadas. Com a demarcação da área em 1997 e a homologação em 2004, a pressão têm aumentado sob os povos indígenas.A situação na região está tensa. Para evitar o recrudescimento dos ataques, os indígenas cobram uma intervenção dos órgãos responsáveis na região.


Há anos os povos Krikati vêm solicitando a retirada dos fazendeiros da área. Esse problema não se limita a esse território. Há lideranças indígenas ameaçadas, sendo que muitas foram assassinadas, em outras regiões do Maranhão, inclusive em áreas com terras já homologadas e sem ocupação de não-indígenas. Nesses casos, os conflitos são causados pela ação ilegal de madeireiros para retirar madeiras dos territórios, como acontece na Terra Indígena Arariboia, onde os indígenas lutam pela preservação de suas matas.

(Por: Reynaldo Costa- Da Página do MST)

Quaresma III - Bebendo e oferecendo a água/sentido de um poço comum! (Jo. 4,1-29)


A nossa vida parece ser uma incessante busca de sentidos. Às vezes, afanosa. Procuramos e fazemos numerosas e variadas experiências na tentativa de satisfazer a nossa necessidade de encontrar um sentido acabado, pleno, para o nosso viver. Para o nosso sofrer, correr, chorar, esperar, amar. Muitas vezes temos a impressão, e a ilusão, de termos encontrado, enfim, o seu sentido último. Contudo, rapidamente, uma nova sensação de amargura e insatisfação nos invade. Voltamos a um novo começo: à procura de novos sentidos. A vida inteira parece ser assim. Encontros e desencontros, ilusão e realismo, tristeza e alegria, esperanças e angústias se entrelaçam de forma rocambolesca sem nos deixar plena e interiormente satisfeitos. Flagramo-nos sempre com uma renovada sede. Jamais totalmente saciados.....

....Jesus também tem sede. Uma sede que é muito mais do que uma mera necessidade fisiológica. Ele também está à procura de sentidos. À procura de clareza sobre a sua missão. Está à procura de mais luz, de mais inspiração, de mais coragem para continuar a sua viagem...a Jerusalém. Aproxima-se de um poço. Não é um poço qualquer. É o poço onde os ‘pais e antepassados’ do seu povo paravam para se abastecer. É um poço que contém a água da recordação de tantas histórias de vida, de testemunhos, alianças e compromissos. Uma água que pode matar a sua sede. É um poço, porém, situado numa terra ‘estranha, estrangeira e hostil’. Controlado simbólica e momentaneamente por uma mulher. Uma samaritana, uma herege, como toda aquela terra. Só ela, contudo, possui, agora, os meios para puxar a água e ‘matar’ a sede que Jesus experimenta. Jesus precisa, portanto, estabelecer um encontro profundo e inédito com ‘ela’ para que possa ter acesso à água que mate definitivamente a sua sede.

A ilimitada liberdade de Jesus, a ausência nele de preconceitos de todo tipo, a sua transparência em reconhecer que ele também ‘tem sede’ de vida e pede acolhida, compreensão e apoio, - como todo ser humano, - faz com que as posições entre os dois interlocutores se invertam. De sedento, Jesus passa a ser aquele que tem condições de matar a sede da samaritana. Esta que aparentemente controlava o poço, - mas que buscava na sua vida um sentido acabado, inutilmente perseguido (cinco vezes havia casado!), - vislumbra em Jesus a possibilidade de sair definitivamente da sua dependência de ‘correr sempre atrás de mais água’. Uma água que jamais a havia saciado. O encontro à beira do poço havia mudado os dois. A samaritana descobre uma ‘nova água’, um novo sentido para a sua vida. E Jesus se sacia ao proporcionar a outros uma água que ele já possuía, mas que agora não pertence só a ele.

Para aquelas pessoas que no ‘meio dia’ da sua vida iniciam sempre novas viagens para encontrar a água-sentido que sacie a sua sede de paz, de justiça, de acolhida, de fraternidade não devem existir barreiras. Não podemos erguer os muros dos preconceitos religiosos, sociais, políticos ou sexuais para separar uns dos outros. Nem pode existir tampouco alguém que se sinta dono do poço onde corre a água cristalina que dá sentido à vida dos humanos. Todos somos convidados a beber e a oferecer a água da solidariedade, da reconciliação, do respeito que brota de um ‘poço comum’. Este poço pertence a toda a humanidade. Ele não é nem meu, e nem seu. Não conhece donos nem controladores. A sua água corre muitas vezes longe dos templos e das igrejas, das sinagogas e das mesquitas. É uma água que pode saciar definitivamente todos os seres humanos desde que a procurem no 'monte' onde reside o ‘espírito e a verdade’.

sábado, 19 de março de 2011

Quaresma II - Re-configurar a nossa realidade, indo além da destruição e morte (Mt. 7, 1-8)


Japão, março de 2011. Por via satélite chegam imagens apocalípticas. Tem-se a sensação de um filme de ficção ou de um exagerado surrealismo. Dezenas de milhares de cadáveres de crianças, homens e mulheres se misturam com as águas sujas, os carros, e restos de madeira e blocos de concreto. Outros sobreviventes, mesmo mantendo uma postura altiva, não escondem em seus olhares a dor e o drama. Além da perda de pessoas queridas e do fruto de tantos anos de suor e trabalho, para eles permanece o pesadelo da contaminação radioativa, da árdua reconstrução e da esperada indiferença dentro de poucas semanas....

Para quem está experimentando desolação e morte, e a perspectiva de mais destruição, só restam poucas opções: se entregar ao desespero ou tentar ‘trans-figurar’ a sua própria realidade. Transfigurar a sua própria realidade significa ir além do momento que se está vivendo. Significa dar imagem a uma realidade nova, transformada, positiva, futura. Não como fuga, mas como esforço e compromisso em ‘re-configurar’ e re-construir o que foi deformado ou até destruído. Dentro de si e fora de si. Não se entregar às ‘imagens’ reais de um presente que parece deletar toda possibilidade de ‘re-criação’, mas acreditar que a morte de hoje pode e deve ser vida num futuro próximo. Afinal é o paradoxo de quem vive!

Esta foi, também, a postura de Jesus de Nazaré. Ao percorrer o caminho que leva a Jerusalém Jesus começa a intuir que há muita rejeição à sua pessoa e à sua mensagem. Isto poderia redundar em ações de ameaça e perseguição. Possivelmente morte. Jesus que é uma pessoa atenta a todos os indícios e sinais começa a perceber que um cenário a não ser ignorado é a sua própria morte violenta. Sentimentos de angústia e pavor o perseguem, como é normal para quem ama a vida. A tentação de dar um tempo, de recuar, de fugir é grande, mas resiste. Não se entrega a essas imagens. Ao contrário, vislumbra num momento de iluminação como poderá ser o seu futuro próximo, mesmo com a perseguição e a morte. Sente que ele não está só. Que não é uma das muitas vítimas anônimas do Império e do Sinédrio. Percebe que pode ser um sinal profético para Israel e para o mundo de que a compaixão e a solidariedade são maiores que a indiferença e a arrogância. Experimenta na ‘trans-figuração’ da sua própria realidade uma presença inédita de tantos outros ‘homens inconformados’. Profetas e líderes libertadores que fizeram a história do seu povo. Que o educaram e o moldaram para que ele também fizesse parte dessa história. São pessoas ousadas, denunciadores de iniqüidades e escravidões, mas também construtores de novas formas de convivência social (Elias e Moisés).

A partir dessas 'figuras' re-criadas e re-propostas à sua vida, Jesus ‘re-configura’ e ‘re-significa’ o seu futuro. Aprende a conviver com o medo e a angustia, mas já incorporou definitivamente a perspectiva de que a sua morte não será vã!

sexta-feira, 11 de março de 2011

QUARESIMA I - CONVIVER COM A INCERTEZA E O INDEFINIDO

A narração das ‘tentações’ de Jesus segundo o trecho evangélico hodierno salienta que Jesus nunca teve plena certeza de que as escolhas que havia feito estavam corretas. Jesus sentiu o drama humano de ter que rever sempre tudo. O evangelista situa as tentações de Jesus justamente logo após a ‘confirmação luminosa’ por parte de Deus de que ‘Ele era o filho amado’ (batismo). Logo após a experiência de deslumbramento vocacional em que parecia que Jesus havia tido clareza absoluta da sua vocação e missão. No deserto que é a vida tudo deve ser revisto. Nada é definitivamente adquirido. Em Jesus, sonhos e projetos de vida, oportunidades e possibilidades se misturam a tendências e desejos inesperados, a limites e fragilidades humanas. Ambições, necessidade de reconhecimento público, vontade de dominação e mania de grandeza se entrelaçam com seus imperativos éticos. Com aqueles valores que havia adquirido na sua primeira infância. E que, aparentemente, pareciam definitivamente incorporados e consolidados em sua vida. Jesus sente-se permanentemente dividido e atraído pelo dia-bólico (aquele que dispersa, que desarruma)

Frequentemente fazemos a experiência da dúvida, da incerteza. Parece até irônico: após uma decisão muitas vezes sofrida, que nos custou noites insones e intensa angústia interior, parece que a sensação de incerteza se torna até maior. Mil pensamentos e questionamentos percorrem a nossa cabeça. Vozes interiores parecem murmurar aos nossos ouvidos questionando o que acabamos de fazer. Parecemos dominados pela terrível sensação de termos feito a escolha errada, de termos tomado a decisão equivocada. Às vezes parece ser algo obsessivo. Algo diabólico. Uma verdadeira tentação.

Aqui não se trata de alguém que nunca chega a tomar uma decisão na vida. Que chamado a escolher fica paralisado, pois nunca sabe o que decidir, o que escolher. Que adia infinitamente. Que sempre questiona tudo e todos. Algo patológico. Trata-se, ao contrário, de experiências reais, concretas, humanas. Sentimos vivo dentro de nós o desejo que alguém externo ou uma luz interior clara e objetiva nos confirme sistematicamente naquilo que acabamos de decidir. Isto, porém, não ocorre. Afinal, continuamos sendo nós mesmos, na nossa fragilidade e limitação humana, a arcar com as conseqüências de uma nossa decisão e opção de vida. Este processo de constante discernimento, sofrido e incerto, nos acompanhará durante toda a nossa vida.

É nessa ‘quarentena’ – quaresma da existência humana, da vida, num árido deserto carregado porém de oportunidades e expectativas que Jesus descobre a sua força interior. A força daqueles que não se espantam em ouvir constantemente as ‘vozes interiores’ que questionam e desarrumam as ‘próprias certezas’. Nesse continuo peregrinar, no murmúrio sistemático do dia-bólico, Jesus descobre as possibilidades reais, concretas, de fazer frente às indissociáveis sensações de incerteza e indecisão que vida lhe apresenta. Na busca constante do ‘sim-bólico’ (o que arruma e une) Jesus constrói um novo jeito de ‘estar com’ os humanos!

quinta-feira, 10 de março de 2011

Após 200 anos de Grajaú racismo marca a convivência social. Reconciliação já!

Grajaú, cidade do sertão maranhense está em festa. Comemora os seus 200 anos de existência como cidade. É a forma tradicional, tristemente consolidada de reconhecer a existência de um aglomerado humano só a partir da chegada de...’brancos’. Havia indígenas, e muitos, antes da chegada desses estranhos não indígenas que começaram a tomar de conta de territórios destruindo suas matas com o pretexto de plantar e colher.

A história, ao longo desses dois séculos, se encarregou para criar uma progressiva convivência, embora tensa e conflituosa. Duzentos anos, contudo, parecem não ter sido um período suficiente para algumas pessoas de Grajaú para entender que chegou a hora de abandonar atitudes racistas e bárbaras. Aconteceu justamente nesses dias no povoado Remanso, a poucos quilômetros de Grajaú. Alguns moradores do Povoado Remanso foram ao encontro da diretora Alessandra Sousa Alberto, da Escola Municipal Sirino Rodrigues. O motivo: protestar e exigir que a diretora suspendesse a matrícula de oito crianças indígenas da Nação Guajajara na referida escola do povoado. É bom recordar que Remanso é constituído de famílias retiradas do Povoado São Pedro dos Cacetes, quando em 1996 aconteceu a demarcação definitiva da Terra Indígena Canabrava. Um conflito que já durava mais de vinte anos.

À exigência destes moradores somou-se à cumplicidade e a arrogância do vereador Sebastião Leão, que endossou o protesto ameaçando a diretora. Apesar das ameaças Alessandra manteve-se firme. Alegou que as crianças indígenas tinham o direito de estudar ali. Um direito que a Constituição lhes garantia. Que o passado de rixas e preconceitos precisava ser superado. Diante da postura firme e cidadã da diretora Alessandra, como também da diretora da pré-escola Cleonice Chaves, os insatisfeitos, acompanhados pelo ‘digníssimo’ vereador, foram ter com o secretário municipal de educação, Antonio Carlos dos Santos Carvalho que, num primeiro momento, tentou dissuadi-los. Os revoltosos ameaçaram, então, derrubar a escola caso a Secretaria de Educação não tomasse providência, e a diretora sairia junto com as crianças indígenas.

As famílias indígenas, constrangidas, para não agravar o conflitos, re-matricularam suas crianças em duas escolas da cidade de Grajaú: Marli Araujo e Paulo Ferraz. E a Secretaria de Educação disponibiliza diariamente o transporte para elas. Agora espera-se que o Ministério Público Federal intervenha e puna os ‘racistas’ de Grajaú pelo crime de racismo. Crime que pela Constituição Federal do Brasil é inafiançável. Infelizmente, as políticas de ‘reconciliação’ adotadas pelo presidente Mandela na África do Sul para ‘perdoar’ e ‘construir’ com os seus antigos perseguidores uma nova noção ainda não chegaram a esse município!