sábado, 26 de maio de 2018

A TRINDADE QUE ESTÁ EM NÓS, E QUE SOMOS NÓS! (Mt. 28,16-20)


É difícil acreditar que alguém que não conhecemos nos ame, se a pessoa que nos fala desse amor, ela também, não nos manifeste amor e respeito de verdade. É difícil acreditar que alguém, no passado, foi justo conosco, se quem nos informa sobre isso nos desrespeita e nos usa. Ou seja, podemos sentir o amor ou os cuidados de alguém que não conhecemos somente mediante os gestos concretos de amor e compreensão de alguém que está ao nosso lado nos dando afeto e proteção. Os esquecidos e excluídos de Israel ao saborear os gestos de compaixão e de acolhida de Jesus podiam, de alguma forma, imaginar e crer que o Deus que eles não viam e nem conheciam poderia ser como Jesus. Podiam sentir que Deus os estava amando e acolhendo, pois o mesmo o sentiam e viam em Jesus. Jesus inverte a lógica da religião oficial judaica, e de todas as religiões: Deus é igual a Jesus, e não Jesus igual a Deus! Se Deus pudesse ser visto agiria e amaria como Jesus. Com Jesus, Deus não deve ser mais procurado, mas somente acolhido. A religião nos diz que devemos buscar a Deus, procurá-lo em tudo e todos, e a toda hora, mas ocorre que Deus já veio até nós na pessoa de Jesus, o humano divino. O que os humanos, então, devem fazer é simplesmente ‘amar e agir como Jesus’. 
É aprender a ser humanos como Jesus o era. Trindade é isso: amar como um Pai, acolher plenamente como um filho o amor de um pai, e possuir um Espírito de coragem para reproduzir e multiplicar permanentemente esse amor! Não se trata de afirmar dogmas, nem de especulação filosófica e nem de doutrina, mas de implementar as dinâmicas da vida. Celebrar e vivenciar a Trindade significa tomar consciência de que nós ‘filhos/as’ temos a missão de fazer imergir, ou seja, de batizar no amor invisível de Deus, - que se tornou visível em Jesus, - todas as criaturas, irmãos e irmãs de toda cultura e nação, eliminando confins, alfândegas, barreiras e preconceitos ! E sermos tão amorosamente ‘humanos’ ao ponto de sermos, de fato, ‘divinos’... como o Homem/Deus, Jesus.

quinta-feira, 24 de maio de 2018

Bem-aventurados os misericordiosos porque obterão mais misericórdia – Mt. 5,7 -


Num de seus inúmeros desabafos públicos o papa Francisco nos alerta que hoje ‘vivemos no meio do mar da indiferença’, e incentiva ardentemente ‘as nossas paróquias e comunidades a serem verdadeiras ilhas de misericórdia’ (Mensagem para a Quaresma em 2015). Realmente, na atualidade, o que mais deveria nos indignar é a nossa incapacidade de nos comover e compadecer diante de tantos sofredores. Afundamos no drama dos massacres e chacinas, mas o nosso coração permanece frio diante das dezenas de milhares de vítimas. Assistimos, cotidianamente, a múltiplas formas de abuso, de ódio e de vingança, mas encaramos tudo isso com cínica naturalidade. Ser misericordioso significa superar a violência da mórbida indiferença, e ‘educar-treinar’ o coração a ser generoso e sensível. O misericordioso, de fato, é aquele que tem ‘coração mole’, mas não débil. Que é incapaz de dizer um ‘não’ a alguém que necessita de compreensão e de perdão para recomeçar uma nova vida. Ser e agir de modo misericordioso, no entanto, exige educar e se deixar educar para tanto. Ninguém, pois, nasce ‘geneticamente misericordioso’. É por isso que Mateus, nessa bem-aventurança, nos diz que se aprendermos a ser solidários e compassivos como o fazem ‘os pobres pelo espírito’ podemos nos tornar efetivamente misericordiosos. A misericórdia é, de fato, para Jesus, o ‘efeito positivo’ de todos aqueles que se colocam ao lado dos aflitos, dos deserdados dominados, e dos que têm fome e sede de justiça. São aqueles que ao viverem a plena solidariedade com esses sofredores descobrem dentro de si o poder real de superar indiferenças e egoísmos e intolerâncias. E se abrem, definitivamente, para compreender, perdoar e proteger. Nesse sentido, para Mateus os misericordiosos não são uma nova categoria social de pessoas, - como o são os pobres, por exemplo, - mas são a expressão e o resultado da ação solidária de todos aqueles homens e mulheres que, como Jesus, deixam coração e entranhas estremecerem dentro de si. Pessoas que se indignam emotiva e eticamente ao sentir o que sente uma vítima do racismo, do estupro ou da homofobia. Ou que se revoltam ao verem a aflição do povo palestino massacrado pelo exército israelense, ou pessoas difamadas pela Globo e por outros plantadores de mentiras. Que sentem a mesma fome de justiça daqueles que são presos arbitrariamente e passam anos a fio, atrás das grades, pela má vontade de magistrados e de policiais cooptados. Ou, sofrem, enfim, com a angústia interior de uma filha adolescente que aprontou, e que não consegue obter o perdão de seus pais. 

Com isso, Mateus nos diz que se todos nós podemos ser capazes de produzir ‘gestos de misericórdia’, nem todos assumimos a misericórdia como ‘estilo de vida’. Como um modo de agir sistemático, e como uma opção fundamental e permanente de vida. Misericórdia não é um mero sentimento, nem uma louvável virtude, mas um agir claro e permanente em favor dos que se encontram na necessidade, e no abandono mais absoluto.  Pessoas que agem assim são ‘bem-aventuradas’ pois possuem a garantia que sentirão a misericórdia do próprio Deus! Isso permite que nos sentamos mais fortes na hora de perdoar uma injustiça sofrida. Quem não se compadece terá mais dificuldade em compreender e perdoar. A sua capacidade de amar tornar-se-á sempre mais estéril. É notório que vivemos um trágico momento histórico em que setores da sociedade brasileira e não, parecem dar mais vazão à sua cega intolerância e ódio, do que a gestos de solidariedade e compaixão. É nesse momento que Jesus de Nazaré nos repropõe a parábola do Pai que abraça com força e ternura o filho que volta até ele pela saudade do seu amor. E a lição de vida do ‘estrangeiro samaritano misericordioso’. Ele não teme sujar suas mãos e sua imagem para acudir não somente uma vítima anônima da violência física, mas também da cínica indiferença daqueles ‘hipócritas tementes a Deus’ que viravam o seu rosto do outro lado para não contrair a impureza religiosa. Na realidade, não queriam se confrontar com os apelos subversivos da prática humana da misericórdia e da compaixão. O único valor que conta no ‘soçobrado mar da vida’! (O presente artigo é publicado no O Jornal do Maranhão da Arquidiocese de São Luís)

sexta-feira, 18 de maio de 2018

PENTECOSTES

Quando aprendermos que Deus não se adora nem na igreja, nem no templo, nem na sinagoga, nem na mesquita, nem no céu infinito, mas em ‘espírito e verdade’, em toda montanha, em toda planície, em toda mata, em todo riacho e mar, em todo casebre e ou casa de taipa e maloca, será Pentecostes.

Quando deixarmos de ser guiados pelas fórmulas dogmáticas e catequéticas, e os credos ortodoxos, e proclamarmos com gestos coerentes o ‘hino à caridade’, será Pentecostes!

Quando deixarmos de competir com outras igrejas para ver quem faz mais sinais prodigiosos, e começarmos a balbuciar a linguagem do diálogo fraterno, será pentecostes!

Quando formos intolerantes com a nossa intolerância, os nossos preconceitos e racismos, e apertarmos com firmeza e ternura a mão do ‘outro e diferente’, será Pentecostes!

Quando derrubarmos os palanques dos espetáculos e dos teatros da fé, e começarmos a acreditar na fé dos pequenos excluídos e dos ignorados pelos profissionais dos templo, será Pentecostes.

Quando renunciarmos aos títulos eclesiásticos altissonantes, às vestes litúrgicas multicoloridas e aos altares dos sacrifícios, e nos revestirmos com as vestes do diálogo e calçarmos as sandálias da humildade, será Pentecostes.

Quando, enfim, sentarmos à mesma mesa e juntos comermos o mesmo pão no mesmo prato, sem inveja, nem ódio, sem cobiça e ambição, e reconhecermos pela ‘amorosidade’ recíproca que há um só Pai-Mãe,
só assim teremos a força e a ousadia de sair de nossas prisões domiciliares e de nossos egoísmos e sentiremos que não somos nós a agir, mas o espírito da Liberdade e da Luz sem fim.