quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Quando o 'NÃO DITO' da imprensa contribui para naturalizar as arbitrariedades e a 'negação da verdade'!


Muitos setores da mídia tupiniquim local não deixam de surpreender a cada dia. Na cobertura de fatos e acontecimentos, além de uma seleção prévia para decidir qual deles merece ser publicado, parece existir uma abordagem padronizada que reflete parcialidade, ideologização e preguiça investigativa. Alguns casos recentes ocorridos no Maranhão dão provas do escasso profissionalismo. Uma rápida análise de algumas versões veiculadas sobre dois acontecimentos, em particular, tendo como foco a morte de um indígena e uma operação policial numa aldeia, fazem emergir alguns elementos comuns do ‘modus operandi’ de alguns setores da imprensa local que nos preocupam. Vejamos.

1. Os veiculadores de notícias, em geral, afirmam que ‘possuem suas próprias fontes’ como se isso fosse suficiente e já bastasse para garantir a sua absoluta e inabalável veridicidade. Outra fonte informativa não inscrita em suas ‘listas fechadas’ parece suscitar, de imediato, desconfiança e, em muitos casos, a depender dos interesses em jogo, é sumariamente descartada sem a devida investigação. Acredito que o ofício de transmissor de informações, que queira ser razoavelmente imparcial e rigoroso, a respeito de um determinado acontecimento impõe a escuta e a apuração dos diferentes atores que entram em jogo, algo que exige paciência, habilidade e profissionalismo. E, na situação real em que isso se torna inviável, por uma serie de motivos, caberia uma breve nota ou janela, à margem, dando voz ao ‘outro lado’, se assim ele o desejar, algo que, infelizmente, é sistematicamente ignorado em inúmeros casos. Já houve casos, por exemplo, em que uma fonte externa ao veiculador de notícias ao chamar a sua atenção para corrigir ‘quantidades e tamanhos’ errados veiculados, portanto, dados oficiais, ouviu respostas irônicas e deselegantes porque a ‘sua fonte confiável’ não poderia, jamais, repassar dados...errados!

2. Um segundo elemento que se destaca na cobertura jornalística parece ser a de uma permanente e velada ‘solidariedade político-moral’ com um dos atores de um determinado acontecimento, em geral, corporações e/ou instituições, em detrimento de ‘pessoas físicas’ a não ser que estas representem algum tipo de ‘bandeira’ com que a imprensa se identifica. Concretamente, ao dar cobertura a uma operação policial, por exemplo, em geral a corporação policial é apresentada quase sempre como ‘a mocinha’ a ser sistematicamente defendida e justificada, em que pesem eventuais abusos e arbitrariedades cometidas por ela. Para satisfazer a fome popular de ‘notícias policiais’, os delegados de polícia, em geral, são, sistematicamente, procurados pela imprensa, e acabam se constituindo como ‘fornecedores confiáveis’ de informações de primeira mão e/ou exclusivas. A ‘suposta vítima’ que, contudo, sofreu agressão, violência, ou foi negligenciada por parte da corporação policial para poder merecer a devida atenção por parte desses setores da mídia, em geral, deve ser ‘totalmente íntegra’, caso contrário é ignorada ou, pior, apresentada como a ‘vilã’, em que pesem os abusos sofridos. Se um jovem indígena, por exemplo, ao conduzir uma moto é vítima de descaso e negligência alheia que chegam a causar a sua morte, quando a imprensa descobre que, porventura o indígena é de menor a ‘notícia da morte’ produzida por atos de irresponsabilidade externa, parece perder força impactante. O interesse em divulgar a notícia diminui ou até desaparece, e a atenção do veiculador da informação parece ser desviada pelo elemento da ‘situação ilegal’ da vitima que não ‘deveria’ estar dirigindo a moto por ser de menor. Evidente que ao afirmar isso não se quer ‘justificar a ilegalidade formal’, mas mostrar como a tragédia da morte de um jovem causada por um fazendeiro irresponsável passa em segundo plano e parece perder força denunciante e impactante. Ou, num caso mais recente, (veja postagem anterior) setores da imprensa se omitem em relatar que a Polícia Civil para prender um cidadão acabou criando pânico, terror e arbitrariedades de todo tipo numa pequena aldeia do Maranhão. O foco era, para eles, a detenção de um cidadão supostamente envolvido num assassinato, e não o 'modus operandi' da polícia foi abertamente ilegal e arbitrário! Dessa forma a 'imprensa' naturaliza o arbítrio e o 'estado de exceção' em pleno 2023!

Evidentemente, o que se coloca não são dados científicos ou frutos de análises muito elaboradas. São meras impressões, mas que não deixam de ter suas raízes em muitas observações sólidas. Acredito que não se trata de exigir imparcialidade e objetividade absolutas no exercício desta profissão tão complexa em que, muitas vezes, o próprio profissional é ‘censurado ou podado’ pelo responsável da edição final, mas de garantir a veiculação das diferentes versões, reações, posições dos principais atores que estão envolvidos num determinado acontecimento. Constata-se, com efeito, que a omissão de certos detalhes e dados, ou seja, o ‘não dito’ ou ‘o dito’ de forma unilateral, contribuem, frequentemente, a potencializar opiniões distorcidas e ‘modus pensandi’ muito mais perigosos do que as fake! 


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