sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

III Domingo de Advento - É preciso entrar na lógica da 'nova governança' de Deus-Pai, inaugurada por Jesus, caso contrário, permanece no Antigo Testamento!

 

É um grande equívoco achar que hoje é mais difícil enganar alguém, supostamente por existirem formas sofisticadas de desmascaramento. Promessas vazias ainda iludem muitos ingênuos, e as Fake News continuam a desvirtuar uma realidade que, aparentemente, parece inegável. Jesus de Nazaré, já dois mil anos atrás, não só ‘falava a verdade’ como ‘fazia a verdade acontecer’. Na narração evangélica de hoje, a uma comissão enviada por João para saber se Jesus era o enviado ungido, o Mestre não responde com peças de autopropaganda ilusionistas. Ele lista ações concretas que provam a adoção definitiva da compaixão e do cuidado misericordioso para com as ‘ovelhas feridas, humilhadas e desgarradas’ da nação. Jesus rejeita, assim, a metodologia assumida pelos radicais nacionalistas forçavam pela violência e a manipulação a ‘Governança de Deus’, e se escandalizavam pelas opções de Jesus. Jesus, diferentemente deles, inaugura o ‘verdadeiro modo de administrar do Pai’ que faz da graça e da acolhida ilimitada dos esquecidos e dos pequeninos o seu princípio norteador. Acabou, enfim, o governo da vingança e do castigo divinos! João, mesmo sendo um grande profeta, flertava ainda com o Deus do castigo e da chantagem. Por isso que Jesus sentenciou sem titubear: o menor microscópico, o aparentemente insignificante da sociedade, na nova Governança de Deus-Pai, é, desde já, muito maior do que João o Batista. 

quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

Senado aprova PEC do marco temporal às vésperas do julgamento no STF

 

Aprovado em dois turnos no mesmo dia, votação contou com discursos racistas e denominação aos povos originários de forma indevida. Durante sessão deliberativa no Senado Federal desta terça-feira (09), os parlamentares aprovaram um requerimento de calendário especial para a votação em dois turnos da Proposta de Emenda à Constituição (PECnº 48/2023, denominada de PEC da morte pelo movimento indígena. A votação do regime de urgência recebeu 49 votos favoráveis ao calendário especial e 21 votos contrários, totalizando a votação de 71 senadores.

Aprovado nos dois turnos na mesma tarde – ou seja, os senadores votaram duas vezes, a votação contou com 52 votos favoráveis e 14 votos contrários (Veja como os senadores votaram em 1º turno e 2º turno). Durante os discursos de defesa da PEC, parlamentares apontaram falta de progresso e acusaram a Funai e o Instituto Socioambiental (ISA) de controle autoritário das terras indígenas. Outros discursos, questionaram a necessidade do percentual de terras indígenas destinadas aos povos originários e continuaram denominando os povos originários de índios, termo considerado pejorativo pelo movimento indígena“O que esse povo quer mais da terra indígena? Eles já possuem 14% de terras indígenas pelo Brasil. Se olhar para os Estados Unidos, eles possuem apenas 2,3% destinados a terras indígenas, mas lá eles podem criar arrendamento de terras, destinar a agricultura, eles podem construir cassinos, o que eles quiserem dentro das suas terras e o Brasil, não deixa. Índio não quer apito, ele quer hilux, ele quer agro, ele quer hotel, ele quer reserva, ele quer turismo, ele quer dignidade para viver”, afirmou o senador Jorge Seif (PL-SC), ex-ministro da pesca do governo Bolsonaro.

O chamado “marco temporal” prevê que os povos indígenas só teriam direito à terra se estivessem sobre sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. A tese é considerada injusta e perversa, já que muitas etnias sofreram remoção forçada de suas terras originárias e outros tipos de violência antes e durante o período em que a Carta Magna brasileira foi promulgada. Durante a votação, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) divulgou nota técnica em repúdio a PEC, afirmando que “a lei abre caminho para insegurança jurídica, aumento de conflitos e legitimação de invasões, ao permitir atividades econômicas de terceiros e ao fragilizar o usufruto exclusivo dos povos indígenas sobre seus territórios”.

A nota conclui que declarar a Lei 14.701/2023 inconstitucional é “medida indispensável para preservar a supremacia da Constituição e garantir a continuidade física, cultural e territorial dos povos originários”, explica Auzerina Macuxi, Gerente da Assessoria Jurídica Indígena da Coiab. A lei, aprovada em 2023, está sendo questionada no Supremo Tribunal Federal inconstitucional. O julgamento no STF começa nesta quarta-feira (10). O Ministério dos Povos Indígenas (MPI) publicou uma nota nas redes sociais criticando a aprovação, afirmando que a aprovação da PEC “restringe o reconhecimento de territórios tradicionais e ignora expulsões históricas”. Trata-se de uma violação dos povos indígenas”. Com a aprovação, a PEC caminha para a votação na Câmara dos Deputados. Amanhã (10), o Supremo Tribunal Federal (STF) julgará quatro ações que questionam a constitucionalidade da Lei 14.701, de 2023, que prevê o marco temporal para as demarcações. (IHU)

terça-feira, 9 de dezembro de 2025

O DESEJO DO PAI É QUE NENHUM 'PEQUENO-INVISÍVEL' SE PERCA, MESMO QUE ISTO SIGNIFIQUE DEIXAR EXPOSTAS AS DEMAIS OVELHAS!

 

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos:12 "Que vos parece? Se um homem tem cem ovelhas, e uma delas se perde, não deixa ele as noventa e nove nas montanhas, para procurar aquela que se perdeu?13 Em verdade vos digo, se ele a encontrar, ficará mais feliz com ela, do que com as noventa e nove que não se perderam.14 Do mesmo modo, o Pai que está nos céus não deseja que se perca nenhum desses pequeninos". (Mt.18,12-14)

Jesus dá por descontado que um pastor de verdade ao dar fé que lhe falta uma ovelha do seu rebanho vai, imediatamente, à procura dela. Parece um paradoxo: deixa 99 ovelhas desprotegidas para buscar uma única ovelha perdida, e sem ter garantia de achá-la! É evidente que esse pastor não é pautado pela lógica do ‘custo-benefício’, pois agiria de uma outra forma. Ocorre que, em geral, quem já fez a experiência de ser pastor de ovelhas, vacas, bodes, etc. age da mesma forma que agiu o pastor da parábola. É a única faltante e não as 99 que determina a sua decisão, a sua escolha, algo que, aparentemente indicaria impulsividade e ausência de raciocínio. O sentido de responsabilidade, o apego e os cuidados com cada ovelha impulsionam o pastor a não ceder a cálculos frios e pragmáticos. O desvio e a ‘perdição temporária’ de uma única ovelha parece ser objeto de uma preocupação um tanto exagerada por parte do pastor, principalmente quando as 99 não estão totalmente em segurança, mas poderiam sofrer, elas também, ataques e agressões. O nosso evangelista, contudo, carrega propositalmente as tintas na parábola para nos preparar e acolher o cuidado e o amor desmedido do Pai para com os.... pequenos. Aqui não se fala de ‘pecadores’ e ‘desviados’, e sim, de pequenos, na língua grega ‘invisíveis’ (mikroi). Lembremos que Jesus em diferentes circunstâncias constatava o desamparo das multidões que parecia como ‘ovelhas sem pastor’. Isso para reafirmar que se, de fato, houvesse um pastor de verdade, as ovelhas não se encontrariam ‘perdidas, desamparadas, desnorteadas’ e tampouco ‘invisibilizadas’ do jeito que estão. Jesus de forma enfática deixa claro qual é o desejo do Pai: não perder nenhum desses pequeninos, invisíveis. A lógica do templo e da sua classe dirigente vai na contramão disso: os pastores sanguessugas cultivam somente as ovelhas graúdas, as vistosas, as bem alimentadas, as que dão retorno econômico e afetivo. A lógica dos maus pastores é a de vigiar e administrar as ovelhas que, a princípio, não precisam de proteção e de amparo, e deixam as ovelhas feridas, desgarradas, perdidas, desviadas porque elas dão só prejuízo. Aliás, eles sequer conseguem enxergá-las em sua perdição. Não fazem falta, logo, não existem!

Não é Flávio Bolsonaro o candidato a presidente do Bozo. É MICHEQUE!

 

Está ficando cada vez mais óbvio. A candidatura do senador Flávio Bolsonaro, do PL do Rio de Janeiro, à Presidência, anunciada na sexta-feira, 5, e relativizada pelo próprio senador 48 horas depois, é uma manobra de Jair Bolsonaro para reorganizar seu campo político. Com apenas 8% dos eleitores dizendo que o primogênito deveria ser o candidato apoiado pelo pai, segundo o Datafolha, Flávio não aparece como nome competitivo nem dentro da base bolsonarista.

Mas, então, o que está por trás da jogada da família Bolsonaro?

A declaração de que pode desistir “por um preço” expôs o caráter instrumental de sua candidatura. Desde então, análises vêm se avolumando, e a edição de hoje de Cartas Marcadas reúne as que considera mais pertinentes — não por especulação, mas por apontarem movimentos reais da extrema direita.Há uma leitura cada vez mais compartilhada por analistas e políticos: Flávio é apenas a fumaça. Quem pode incendiar a eleição tem nome, força e base própria: Michelle Bolsonaro, a vice-presidente ideal em uma hipotética candidatura de Tarcísio de Freitas. 

Entre as várias análises que pipocaram nos últimos dias, a do historiador Odilon Caldeira Neto, especialista em extrema direita, vale atenção. Ele aponta que a disputa relevante neste momento não é pela cabeça de chapa, mas pela vice-presidência numa possível candidatura do governador paulista Tarcísio de Freitas, do Republicanos.

A análise é plausível e tem circulado em Brasília. De acordo com ela, a luta da família Bolsonaro, agora, é para garantir o próprio sobrenome na chapa presidencial, em uma candidatura à vice. Isso forçaria que Tarcísio mantivesse vivo o compromisso de, caso eleito, atuar para tirar Bolsonaro da cadeia. A agenda anunciada pelo próprio senador reforça essa ideia: Flávio não disse que vai rodar o Brasil ou convocar comícios. Disse que pretende se reunir com os presidentes do União Brasil (Antonio Rueda), Progressistas (Ciro Nogueira) e PL (Valdemar Costa Neto).

Os integrantes do Centrão ouvidos pela imprensa indicaram que União Brasil, PP, Republicanos e PSD tenderiam a não embarcar na candidatura de Flávio, cogitando inclusive a neutralidade. O mercado financeiro, por isso, reagiu mal à novidade. No dia do anúncio, o Ibovespa registrou a maior queda diária desde fevereiro de 2021, recuando 4,31%, enquanto o dólar teve a maior alta desde outubro, subindo 2,3% e chegando a R$ 5,43. Os porta-vozes do mercado nos ajudam a entender essa reação: o economista Yihao Lin, da Genial Investimentos, afirmou a clientes que a reação negativa se explica pela percepção de que ele concentra a rejeição do pai sem construir uma alternativa viável. Ou seja, em portugês claro: Flávio perderia de Lula.

Mas, após a desastrosa coletiva de Flávio no domingo, 6, muita gente começa a perceber que o movimento de Jair produz outro efeito: colocar o primogênito na posição de fiador das negociações da família na corrida eleitoral. E com uma possibilidade evidente: a de que ele retire a própria candidatura, indicando Michelle como vice de Tarcísio. (Intercept)


sábado, 6 de dezembro de 2025

II Domingo de Advento - O DESERTO QUE ESTÁ DENTRO DE NÓS ....


João vive no deserto, mas quem tem o deserto dentro de si somos nós cidadãos estéreis de Jerusalém e de muitos lugares, incapazes de produzirmos frutos de mudança. O deserto que está dentro de nós nos torna impotentes, infrutíferos. Vivemos alienados buscando sinais e prodígios, ou salvação fácil. Somos adoradores de um ‘deus legalista’ manipulado e idolatrado por sacerdotes, líderes religiosos e funcionários do templo e do palácio. Estamos longe de compreender a urgência do momento presente, menos ainda o Kairós, o tempo da graça que já começou. Não temos consciência de que o tempo está esgotado, cheio, que não podemos mais fugir de uma dura realidade para mergulhar em ritos e belas liturgias, ao passo que o nosso povo passa fome, vive violentado e extorquido por líderes religiosos carrascos e políticos sem escrúpulos. A Realeza do Deus dos escravos, dos pobres, das viúvas e dos órfãos de hoje está a governar, mas nós não o percebemos. Daí a necessidade de produzirmos frutos que provem que a alienação, a dependência, a indiferença, a negligência social podem ser superadas. Esta seria a prova de que o deus do templo será derrotado e que o povo estaria pronto para receber e perceber uma ‘boa notícia’, inédita, mas que está ao alcance de todos: o Deus de Jesus está vindo para governar com justiça, graça e compaixão. Mas temos ainda fé para acreditar nisso?

sábado, 29 de novembro de 2025

ADVENTO - "Estamos abastecidos de futuro” (Pedro Arrupe, sj). É preciso desatá-lo. - Por Adroaldo Palaoro

 

Nossa concepção de futuro se atrofiou: vivemos “tempos sem futuro”. Não podemos prever o futuro com segurança. Hoje, o futuro se apresenta a nós muito mais aberto que em qualquer outra época de nossa humanidade. Os conhecimentos, os meios de comunicação, a tecnologia... não nos asseguram uma certeza do que virá. Aventurar no futuro torna-se cada dia mais complexo e difuso, pois predomina a incerteza que nós mesmos geramos. Vivemos uma geração que teme o futuro; por isso vivemos um “presente esticado” porque o futuro nos apavora. Já que preferimos não imaginar o futuro, alargamos o presente.

Precisamente porque faltam valores e um sentido para a existência é que se irrompe o medo do futuro, a acomodação, o refúgio no efêmero e no imediato, sem raízes e sem esperança. O medo do futuro nos ajuda a entender a mediocridade e o vazio do presente. Não esqueçamos que o Advento é toda uma possibilidade de vida que temos à frente. Por isso o grande grito deste primeiro domingo é “Vigiai!” porque “não sabeis quando virá o vosso Senhor”. Ninguém vigia o passado que já passou e já não existe mais. Vigiamos o que está por vir, o que está vindo. A vigilância olha sempre o futuro. Um futuro que depende de Deus e depende de nós. Porque uma coisa é a ação de Deus em cada um de nós neste tempo do Advento e outra coisa é o que nós fazemos para que algo novo aconteça. Nós mesmos somos um “advento”, porque nosso futuro humano depende do que esperamos. Haverá aqueles que já não esperam nada. Haverá outros que esperam algo novo, mas duvidam. E haverá aqueles que esperam o novo e dedicam suas vidas a criá-lo já agora. Porque em cada momento definimos nossas vidas; em cada momento algo surpreendente pode acontecer em nossa vida; em cada momento nossa vida pode apagar-se ou pode rejuvenescer-se. No evangelho deste domingo (primeiro do advento), as duas pequenas parábolas insistem na atitude da vigilânciaA primeira delas nos adverte com uma intencionalidade clara: o maior inimigo da vigilância é a dispersão, revestida de rotina e apego ao costumeiro (“comer, beber, casar-se”). Viver vigilantes para olhar mais além de nossos pequenos interesses e preocupações. Na segunda, a insistência se situa na importância de “estar vigilante”, porque o que está em jogo é nada menos que a segurança da “casa”, ou seja, a consistência da própria pessoa.

Não é raro que, ao sentir um mal-estar ou medo frente ao nosso mundo interior, optemos pela “distração” ou “dispersão”. Por outro lado, vivemos dispersos e ansiosos porque crescemos com a ideia de que nos falta “algo” que, supostamente, se encontra “fora” de nós, com o qual conseguiríamos, finalmente, desfrutar da felicidade desejada. dispersão é o estado habitual de quem se encontra identificado com seus pensamentos, sentimentos, emoções ou reações, ignorando sua verdadeira identidade. Vivemos num contexto marcado pela “dispersão”, seduzidos por estímulos ambientais, envolvidos por apelos vindos de fora, cativado pela mídia, pelas inovações rápidas, magnetizado por ofertas alucinantes. E então, nós nos esvaziamos, nos diluímos, perdemos a interioridade e... nos desumanizamos. “dispersão” corrói a interioridade da pessoa e dissolve aquilo que é mais nobre em seu interior. Longe de uma humanidade dinâmica, operante, ousada... o que a pessoa deixa transparecer é uma humanidade neutra, apática, estagnada; é humanidade lenta, afogada na “normose”, estacionada na repetição dos gestos e dos passos. Ela gira em torno de si mesma e não consegue fazer um salto libertador. Isso tudo leva a pessoa a debilitar-se, provocando a redução da vitalidade humana em vez de favorecer o crescimento pessoal.

Advento é tempo propício – “kairós” – para ajudar a superar nossa “dispersão” e poder recuperar a densidade humana interna. Para isso, precisamos entrar em “estado de vigilância”, repensar a interioridade perdida, reconquistar a autodeterminação. Estar atentos e vigilantes é uma condição humana e cristã para viver intensamente; viver distraídos e dispersos é perder as oportunidades de muitos encontros, é deixar que o outro passe ao nosso lado sem nos darmos conta, é deixar que Deus passe sem que o percebamos, é deixar passar o momento em que Ele nos chama e perdemos a oportunidade de dar uma resposta vivificadora. Viver é estar atentos à vida, a nós mesmos, aos demais. Viver é estar atentos às ocasiões únicas, às oportunidades que não voltam; viver é estar com os olhos abertos para contemplar, é estar com os ouvidos atentos para escutar. É nessa direção que o “tempo do Advento”, centrado n’Aquele que vem, mobiliza e reordena todas as dimensões da vida e propõe um caminho de humanização. Ele desafia cada um a assumir o potencial humano criativo que está latente em seu interior.

 

Reflorestar consciências: por que o Brasil precisa de uma universidade indígena?

 

“O Brasil é o único país no mundo a ter nome de uma árvore”, lembra a deputada Célia Xakriabá, que fez parte do processo de concepção da nova universidade. “Na verdade, a universidade indígena já existe há mais de 1.500 anos atrás. Hoje é apenas assinatura. Mas, na verdade, antes de assinar com a caneta, nós assinamos com sabedoria da floresta, nós assinamos com o jenipapo e o urucum”, afirma a parlamentar, que é graduada em Educação Indígena, pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e estudiosa das experiências de universidades indígenas na América Latina. “Em 2016, tive a oportunidade de pesquisar sobre universidade indígena no México e as universidades autônomas. E o Brasil ganha um momento muito importante porque é reconhecendo a universidade indígena, mas com a pluralidade de povos diferentes. E hoje pensar as epistemologias indígenas é pensar uma superação do epistemicídio também. Quantas vezes o nosso conhecimento indígena, a ciência indígena foi negada na universidade?”, comenta Xakriabá.

Consagração de um direito

Maurício Terena, advogado indígena, explica que a universidade representa a consagração do mandamento constitucional e o respeito ao conhecimento tradicional. “Uma universidade indígena vem que para consagrar o respeito ao conhecimento tradicional indígena, que a história desse país é fundada numa perspectiva da qual os nossos corpos, os nossos conhecimentos, eles eram invalidados por essa ciência hegemônica. Então, poder hoje estar testemunhando esse lançamento dessa universidade indígena, eu acho que acima de tudo como advogado indígena, é a consagração do mandamento constitucional, mas também a promoção e o respeito dos conhecimentos indígenas”, afirma. Terena lembra das dificuldades que passou para se formar em direito, sendo um estudante indígena. “Eu relembro um pouco das violências que a gente passa no ensino superior quando a gente fala que é indígena, quando a gente traz as perspectivas, no meu caso, do direito indígena para o debate”, recorda o advogado.

Territórios transformados

Além da importância epistemológica e climática, a universidade indígena é vista como um marco importante para a inclusão e a melhoria de vida nas comunidades. Para estudantes como Ricardo, do povo Potiguara, a universidade indígena é uma questão de resistência e proporciona visibilidade para seu povo. “Ajuda a dar visibilidade para o nosso povo e à nossa resistência”, comentou brevemente, tomado pela timidez, o jovem de 18 anos, que viajou da Paraíba a Brasília para prestigiar a criação da Unindi. Por sua vez, Maurício Terena já vislumbra transformações profundas a partir dessa experiência acadêmica que, se bem não está restrita aos povos indígenas, sendo uma universidade aberta a toda a sociedade, tem potencial para promover grandes viradas de pensamento na sociedade brasileira.“Isso gera na sociedade brasileira uma nova maneira de se organizar politicamente. Eu já fico curioso para daqui 10, 15 anos, ver como ela vai transformar acima de tudo as nossas realidades locais, mas também a configuração da sociedade como um todo, e a academia também, porque a gente vai passar a trazer conhecimentos que, em alguma medida, foram invalidados durante o processo de construção desse país. Acho que trazer uma virada epistemológica mesmo da ciência no nosso país”, avalia.

Universidade do clima

Celia Xakriabá aponta que não é possível pensar em soluções climáticas sem reconhecer a ciência e a tecnologia ancestral dos povos indígenas. Ela chega a sugerir que a universidade indígena pode ser reconhecida como a universidade do clima, algo que não existe em nenhum lugar do mundo. “No mundo inteiro não existe escola do clima e universidade do clima. E a universidade indígena já pode ser reconhecida também como a universidade do clima. Nós, povos indígenas, somos 5% da população mundial e protegemos mais de 80% da sociobiodiversidade”, propõe a parlamentar, que defende que a “ciência do clima” esteja enraizada nos territórios. Com um toque de poesia e ancestralidade, a deputada reforça a ideia de que preservar as florestas e o meio ambiente já é uma alternativa e uma solução, e deve passar pelo reconhecimento dos saberes tradicionais. “A Terra é a professora mais antiga do planeta e a floresta também é escola, a floresta também é universidade”, recita. Segundo o governo, os grupos técnicos interministeriais responsáveis pelo desenho das instituições atuarão ao longo de 2026 e a previsão é que as universidades entrem em funcionamento em 2027.

A reportagem é de Leonardo Fernandes, publicada por Brasil de Fato, 27-11-2025