terça-feira, 8 de abril de 2008

Emaús: peregrinos para enfrentar a noite que está a chegar

Os dois discípulos de Emaús refletem a nossa realidade existencial. Pessoas que fazem a experiência de acariciar sonhos e projetos de vida, comunhão e admiração profunda para com uma pessoa e, de repente, tudo desmorona. Os sonhos se dissolvem, os projetos de vida desabam, a pessoa amada e admirada morre ou se afasta. Sentimentos de dor, de decepção, de amargura, de falência humana tomam de conta. A cena evangélica, a metáfora pedagógica nos ajuda a entender como dar a volta por cima a tudo isso....passo a passo.
1. Os dois discípulos saem de Jerusalém e se afastam do grupo de Jesus que insiste em permanecer trancafiado em sua casa, vítima do medo e imobilizado pelo trauma da morte do mestre.
2. Iniciam uma caminhada, à procura, buscando, tentando saídas e ensaiando soluções. Sabem que não é se isolando numa casa que vão poder dar a volta por cima. Procuram luzes e apoios.
3. Ao longo do caminho encontram outros "peregrinos" que sabem compreender e ouvir suas angústias e decepções. Oferecem conforto e luzes para compreender os acontecimentos que marcaram sua vida e produziram tamanha decepção.
4. São peregrinos "humanos" que se inserem em nossas vidas sem ostentar grandes gestos, sinais, milagres. Nem parecem manifestações do "divino" entre nós. Nós aguardamos os grandes sinais e Deus nos propõe "a força da cotidianidade", do comum, do singelo...Somos incapazes de "reconhecê-lo" nesses gestos humanos.
5. O encontro "nos caminhos da vida" com pessoas solidárias, entretanto, começa a produzir um calor novo no coração, uma força redentora, uma esperança quase desaparecida e que se renova. Volta a motivação interior e o desejo profundo de retornar "a viver".
6. No caminho comum criam-se laços de afeto e amizade/solidariedade entre os "peregrinos" e "o peregrino" em que toda tentativa de afastamento uns dos outros é barrada por ambos. "Fica conosco, pois a noite da vida está a chegar e precisamos enfrentá-la juntos!"
7. Na noite da vida, na intimidade familiar, ao redor de uma mesa/banquete, na fraternidade já intuída e antecipada durante o caminho, o pão é partido e distribuído. Não o pão em si, mas o gesto de parti-lo para ser distribuído "abre" definitivamente os olhos de quem vivia na decepção e na morte interior, de quem não vislumbrava saídas.
8. O divino é compreendido no que há de mais profundamente humano: partilhar a vida, os afetos, a amizade, a doação, a gratuidade, a vontade comum de superar tudo o que representa morte. É comunhão e proximidade com os outros. Nisso compreendemos que "Deus" nunca se havia afastado de nós quando pensávamos que estávamos sós na vida.
9. Uma vez intuído e compreendido isso o "peregrino Jesus, Antônio, Maria, Mário...." desaparece. Não precisamos mais vê-lo ou tocá-lo. Ele já faz parte da nossa vida. Já sabemos que está entre nós. A "memória" da sua presença amiga nos mantém vivos e animados. Podemos caminhar "sozinhos"...Podemos enfrentar sozinhos outras decepções e desafios. Ao mesmo tempo, porém, temos a obrigação moral de nos tornar peregrinos de outros que caminham na vida à procura de esperança, de saídas, de felicidade.
10. É a Jerusalém que os dois devem voltar. É lá que encontram os grupo de Jesus ainda trancafiado em casa. É lá que as portas devem ser escancaradas e a nova esperança deve ser testemunhada. "Ao longo do caminho, ao partir o pão nós o vimos e reconhecemos"! Não há como ficar mais fechados e trancafiados. O mundo está precisando de peregrinos que sabem caminhar juntos, e juntos enfrentar "A NOITE QUE ESTÁ PARA CHEGAR"!

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