sábado, 10 de dezembro de 2011

Testemunhas de uma 'luz' espalhada que surge das trevas (Jo.1,6-8,19-28)


Num mundo onde parece ser preciso ‘brilhar’ sempre, em qualquer lugar, e a toda custa, estranhamos quando alguém se apresenta como uma simples ‘testemunha da luz’! Quando alguém admite publicamente não ser ele próprio ‘luz’. Mas ser um singelo indicador que aponta para uma luz ‘externa’ a ele. Estranhamos porque significaria para alguns ou para muitos analistas sociais falta de auto-estima. Para outros seria, talvez, admitir incapacidades pessoais que negam ‘o valor de ter valor’. Para outros mais ‘virtuosos’ poderia ser a prova cabal de sua humildade pessoal. Virtude tão louvável quanto rara. Para outros, enfim, poderia ser a constatação real, histórica, de que ‘a luz’ é algo difuso. E que não está concentrada numa só pessoa. Enfim, o reconhecimento de que temos que olhar sempre para além de nós mesmos, e descobrir as miríades de matizes da luz presente nos outros. E sermos comprovadores da sua existência e da sua validade. Talvez seja justamente a descoberta da luz presente também nos outros que nos ajuda a tomar consciência da grandeza da luz que está em nós!João, na sua narração evangélica, manifesta a clara finalidade de ‘submeter’ João a Jesus. Redimensionar a sua espessura moral e profética perante o outro grande personagem contemporâneo, Jesus de Nazaré. Apresentar a sua pregação e a sua missão como ‘algo funcional’ ao próprio Jesus. Independentemente desse compreensível estratagema literário e teológico, podemos identificar na relação João-Jesus algo que significou ruptura radical com dogmas e crenças históricas consolidadas. E, principalmente, fazendo emergir dimensões do ser que afetam os humanos de forma direta.

Aos fariseus bitolados à idéia de um messias poderoso, restaurador do templo e da dinastia monárquica João afirma de forma contundente e ríspida que ‘ele’, João, não era a luz esperada. Mesmo assumindo algumas características messiânicas, o verdadeiro messias tinha outra identidade. E que não correspondia ao que eles esperavam. A ‘verdadeira luz’ já se encontrava no meio deles. Misturada naquela multidão de famintos, de mendigos, decepcionados, e doentes que lhe pediam batismo. E que invocavam a Deus uma ‘nova chance’ para escapar da destruição. O messias dos fariseus, o poderoso salvador, assumia para João, o rosto/destino daquela ‘massa informe’, sem nome, sem identidade e sem prestígio algum. Não haveria provas e nem sinais a oferecer aos fariseus. A não ser a impotência de um povo desejoso de luz, mas que vivia nas trevas produzidas pela arrogância deles. Desejoso de potência de vida, mas se chocando cotidianamente com a morte, a destruição, a falência gerada pela lógica do templo e por uma concepção distorcida de Deus. Era preciso, portanto, tomar uma decisão: esperar e sonhar com um ‘super-homem’ todo-poderoso, uma luz poderosíssima vinda de fora a nos iluminar e salvar ou descobrir e valorizar as inúmeras ‘luzes espalhadas’ que se encontram no meio de nós. Estas, conscientes de não possuírem em si mesmas a plenitude da luz iriam se associar às outras luzes que estão ao seu alcance. Cada uma portadora de novas esperanças. De vidas re-acendidas. De práticas originais. João nos ensina que nós somos vozes emprestadas que gritam, indicadores que apontam, ondas que divulgam e multiplicam a corações cegos e desertificados uma luz que não está só em nós, mas de que podemos ser testemunhas da sua existência e da sua força. De uma luz que não pode ser monopolizada por um ou por outro ‘poderoso redentor’. Mas que ela surge e brilha de forma difusa lá onde as trevas e a noite da vida parecem dominar.

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