sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Parla Francesco! Entrevista a Francisco

Existe uma “guerra justa”?

Precisamos distinguir e ter muito cuidado com os termos. Se ladrões entram em sua casa com a intenção de roubar e agredir, você se defende. Mas não gosto de chamar essa reação de ‘guerra justa’, porque é uma definição que pode ser instrumentalizada. É justo e legítimo defender-se, isso sim. Mas, por favor, falemos de legítima defesa, para evitar justificar as guerras, que são sempre erradas.

Como você descreve a situação em Israel e na Palestina?

Agora o conflito está dramaticamente se ampliando. Havia o acordo de Oslo, tão claro, com a solução de dois Estados. Enquanto esse acordo não for aplicado, a verdadeira paz permanece distante.

O que o senhor mais teme?

A escalada militar. O conflito pode piorar ainda mais as tensões e as violências que já marcam o planeta. Mas, ao mesmo tempo, neste momento estou cultivando um pouco de esperança, porque estão sendo realizadas reuniões reservadas para tentar chegar a um acordo. Uma trégua já seria um bom resultado.

Como está agindo a Santa Sé nesta fase dos confrontos no Oriente Médio?

Uma figura crucial é o Cardeal Pierbattista Pizzaballa, Patriarca de Jerusalém dos Latinos. Ele é muito bom. Ele se movimenta bem. Está tentando com determinação mediar. Os cristãos e as pessoas de Gaza – não me refiro ao Hamas – têm direito à paz. Eu faço diariamente uma vídeochamada para a paróquia de Gaza, nos vemos na tela do Zoom, converso com as pessoas. Há 600 pessoas lá na paróquia. Elas continuam suas vidas encarando a morte todos os dias. E além disso, a outra prioridade é sempre a libertação dos reféns israelenses.

Em Lisboa, no verão passado, perante milhões de jovens, o senhor gritou com força que a Igreja é para "todos, todos todos": tornar a Igreja aberta a todos é o grande desafio do seu pontificado?

É a chave de leitura de Jesus: Cristo chama todos para dentro. Todos. Há, de fato, uma parábola: aquela do banquete de casamento em que ninguém aparece, e então o rei manda os servos ‘para às saídas dos caminhos e convidais para as bodas todos os que encontrardes’. O Filho de Deus quer deixar claro que não quer um grupo seleto, uma elite. Aí talvez alguém entre ‘por baixo dos panos’, mas nesse caso já é Deus quem cuida dele, quem indica o caminho. Quando me perguntam: ‘Mas podem entrar também essas pessoas que estão em uma situação moral tão inoportuna?’, eu garanto: ‘Todos, o Senhor disse isso’. Recebo perguntas como essa especialmente nos últimos tempos, depois de algumas das minhas decisões....

Em particular a bênção dos “casais irregulares e do mesmo sexo”...

Eles me perguntam por quê. Eu respondo: o Evangelho é para santificar a todos. Claro, desde que haja boa vontade. E é necessário dar instruções precisas sobre a vida cristã (sublinho que não é a união que é abençoada, mas as pessoas). Mas somos todos pecadores: por que então fazer uma lista de pecadores que podem entrar na Igreja e uma lista de pecadores que não podem estar na Igreja? Isso não é Evangelho.

Durante a assistidíssima entrevista televisiva com Fabio Fazio no programa Che Tempo Che Fa, o senhor falou sobre o preço da solidão que tem que pagar depois de um passo como esse: como está vivenciando o clamor daqueles que se rebelam?

Aqueles que protestam veementemente pertencem a pequenos grupos ideológicos. Um caso especial são os africanos: para eles a homossexualidade é algo ‘ruim’ do ponto de vista cultural, não a toleram. Mas, em geral, confio que gradualmente todos serão tranquilizados pelo espírito da declaração “Fiducia supplicans” do Dicastério para a Doutrina da Fé: quer incluir, não dividir. Convida a acolher e depois a confiar as pessoas e a confiar-se a Deus.

O senhor sofre de solidão?

A solidão é variável como a primavera: naquela estação você pode passar um dia lindo, com sol, céu azul e uma brisa agradável; 24 horas depois talvez o tempo mude e se sinta triste. Todos vivemos solidões. Quem diz ‘Não sei o que é solidão’ é uma pessoa a quem está faltando algo. Quando me sinto sozinho, antes de tudo rezo. E quando percebo tensões ao meu redor, procuro com calma estabelecer diálogos e trocas de opiniões. Mas sigo em frente, dia após dia.

Teme um cisma?

Não. Sempre na Igreja houve pequenos grupos que expressavam opiniões de viés cismático... devemos deixá-los fazer e passar... e olhar para frente.


Nenhum comentário: