domingo, 20 de julho de 2025

MAIS UMA COP COMBONIANA. PORQUE, PARA QUE? Por Claudio Bombieri

Mais uma COP a reunir em Belém, PA, os principais países poluidores do planeta no intuito de se enganarem reciprocamente numa suposta busca de saídas realistas e oportunistas para adiar o ‘Ponto de não retorno’ que nunca ficou tão próximo como agora! E, concomitantemente, mais uma ‘COP comboniana’, na capital do Pará, pela segunda vez. Talvez menos ambiciosa, mas, quem sabe, com igual presunção de reacender a chama da defesa da badalada ‘ecologia integral’. E, talvez, na ilusão de que, a partir de mais um encontro planetário, se transforme, enfim, numa prática histórica efetiva, e não somente uma estereotipada ‘prioridade provincial formal’. Por trás de tudo isso há, certamente, um longo, denso e inegável processo histórico-cronológico que poderia ser resgatado em toda a sua amplitude, desde o início, quando do Iº Social Fórum em Porto Alegre, no longínquo 2001 e que tinha como lema ‘Um outro mundo é possível’. Não cabe, aqui, contudo, fazer esse trabalho paciente e meticuloso de resgate e apreciação do que podem ter significado para os Combonianos em geral, e para os do Brasil, especificamente, os inúmeros e constantes encontros paralelos/alternativos de caráter global, realizados ao longo desses quase 25 anos em concomitância aos megaeventos mundiais. 

Para quem tem tido a oportunidade de participar direta ou indiretamente da convocação, preparação e execução dos históricos ‘encontros combonianos’ não passa batida a constatação de que, inicialmente, havia nos participantes, uma difusa convicção de que era urgente, - como ainda o é, - inclusive para o próprio instituto, debater não somente questões globais relacionadas às enormes e variegadas ‘mutações sociopolíticas e econômicas’ e seus derivados, mas também tentar rever, traçar e assumir, internamente, no nível micro, em nível provincial, projetos, opções, escolhas, metodologias, sensibilidades que pudessem nos ajudar a repensar e a reformular o todo. Em suma, à luz das macromutações readequar os rumos da missão/evangelização, da formação de base e permanente, da metodologia de administrar e organizar a participação do grupo e a sua coordenação, entre outros. Dito de outra forma e parafraseando o lema do Social Fórum poderíamos dizer que se acreditava que ’Um outro Instituto/Província é possível’.

Não temos observado ao longo desses anos, em que pesem as novas sensibilidades e o aparecimento de uma nova geração que participou escassamente ao longo do processo por óbvios motivos, uma tentativa de analisar crítica e sistematicamente os desfechos, os avanços, as mudanças de rumos, e, porque não, os resultados concretos desses encontros combonianos. Certamente, tem havido a clássica avaliação de fim-de-encontro que, sistematicamente cai no vazio no dia seguinte, mas referimo-nos, essencialmente, a um olhar mais atento, profundo e sistêmico do ‘conjunto da obra’ até para ver se, efetivamente, esses ‘encontros globais’ têm sido fonte de inspiração e de práticas concretas e, simultaneamente, expressão real e histórica delas, ou se, ao contrário, continuam sendo movidos por uma espécie de obscura força inercial, e nada mais. Essa tentativa de jogar luz sobre o processo como um todo é algo que deveria ser feito internamente, mas também institucionalmente, entre as províncias combonianas que têm enviado representantes, ou do continente americano ou de outros.  Não seria legítimo, por exemplo, se perguntar quais foram, de fato, as resoluções que foram implementadas nos diferentes níveis (provincial, continental, e no instituto)? Houve, concretamente, o esforço de criar mecanismos reais para dar continuidade e consistência às intuições e encaminhamentos que emergiam, progressivamente, nos diferentes encontros? Seria algo paradoxal se perguntar se valeu a pena e o porquê? A sensação que temos é de que até a lembrança histórica, não a documental, tenha evaporado com o tempo!

Causa-nos estranheza observar como ao se promover mais um encontro de tamanha envergadura, como o que vai ocorrer em Belém, dentro em breve, exista uma sorta de corrida automática às inscrições como se isso fosse um positivo reflexo concreto e coerente de uma sensibilidade e de um compromisso já efetivos, na província, na ordem da ‘ecologia integral’, nesse caso específico. Constatamos, todavia, que há ainda uma clara discrepância entre o que é proclamado e registrado em documentos provinciais formais e as práticas concretas das pessoas/missionários, comunidades combonianas, nessa dimensão. Não se trata, tampouco, de constatar as normais contradições próprias dos humanos, mas de enxergar um desvio ou omissão de intencionalidade, consciente ou não. Concretamente, torna-se urgente se perguntar se existe, de fato, uma sincera preocupação com a ‘integridade da criação’, - como se falava inicialmente, - como estamos a enfrentar nós, aqui, no Brasil, as assim chamadas ‘questões climáticas’ na atualidade? Quem de nós está a refletir, debater, produzir sobre os dramas da seca na Amazônia, a desolação dos ribeirinhos, a destruição praticada pelas dragas dos garimpeiros, os efeitos catastróficos da extração de minérios em várias aldeias indígenas e a sua industrialização em numerosas cidades desse País? Ou a progressiva e alarmante destruição do Cerrado, a monocultura da soja, as inundações no Sul do Brasil e suas vítimas, só para citar algumas? Quais foram os encaminhamentos operativos que surgiram ao longo dos anos nessa dimensão e que foram efetivamente acatados pela nossa Província, e se sim, quais mudanças concretas produziram na nossa Província? E, simultaneamente, como toda essa inegável riqueza de debate e de reflexões acumuladas interferiram na ‘formação de novas consciências, metodologias e sonhos’ e numa sensibilidade mais apurada dentro do próprio Instituto como um todo?

Acreditamos que não se trata de produzir alguns artigos supostamente científicos a respeito, pois existem em abundância, e nem de aderir, simplesmente a determinadas ‘plataformas’, mas de se perguntar onde nós nos situamos neste contexto sócio-histórico ambiental como missionários Combonianos do Brasil, defensores dos ‘últimos e abandonados’ como frequentemente nos autoproclamamos. Surge natural se perguntar se vale a pena continuar a promover e a sustentar ainda essas manifestações que, talvez, nesse momento concreto veiculem mais a imagem de uma contraditória e decadente vitrine de uma opção que já vem definhando há bastante tempo. Não se trata, aqui, de cuspir sentenças e de fazer sumários julgamentos históricos, - pois, afinal, estamos todos no mesmo barco, - e sim, de nos rever e avaliar com franqueza a partir do que somos e do que queremos nesse momento histórico, a partir dos recursos humanos que possuímos, sem medo de deixar emergir no grupo, divergências e conflitos patentes ou latentes. Será que ao afirmar isto estaríamos enganando a nós mesmos ou, porventura, o que aqui se coloca seria ‘totalmente falso’? Ou, por acaso, estaríamos deixando nos levar nas asas da memória de um tempo nostálgico, utópico, considerado luminoso, glorioso, mítico e que já não existe, mas que nos ilude de que nós somos ainda os profetas e defensores de causas e lutas de vanguarda, ‘ecologicamente corretas’? 

Que esta simples reflexão e provocação, - mesmo não encontrando confirmação, - seja, pelo menos, entendida como um mero e legítimo parecer de quem não alimenta mais esperança para um debate aberto e franco na atual conjuntura interna, nas suas instâncias formais onde tende a reinar, necessariamente, o clima de ‘fraternidade e de comunhão’ acima de tudo. E, ao mesmo tempo, que esses questionamentos sejam expressão de uma tênue e subjetiva percepção ou de um simples registro de quem, desde o seu ponto de vista singular, acredita que, talvez, tenha chegado a hora de nos olhar com desarmante franqueza, como grupo Comboniano do Brasil, sem subterfúgios e sem maquiagens, em assembleias formais ou não, e reconhecer com humildade e realismo as nossas rugas e rusgas. E, quem sabe, ao reconhecê-las, possivelmente possamos redescobrir um outro rosto mais autêntico e mais bonito. 

Piquiá, 21 de julho, 2025


Um comentário:

Joseph Mumbere disse...

Admiro sempre a sinceridade e a clareza das reflexões que Pe. Claudio faz aqui no seu blog a partir do seu próprio ponto de vista. Essa sobre "Mais uma COP Comboniana" é uma provocação pertinente para que o próximo encontro comboniano em Belém (novembro 2025) seja um questionamento profundo sobre o eixo transversal da Ecologia Integral nas nossas praticas missionarias como província (Brasil) e como instituto (MCCJ)