A nossa religião já foi definida a religião da dor. Do sofrimento. Do sacrifício. Da tristeza. Dos que esperam só por uma eternidade futura. A religião dos conformados. É inegável que demos muita munição para os nossos críticos! Não foi o conteúdo da ‘boa nova’ de Jesus de Nazaré que a forneceu. Foram as nossas interpretações do conteúdo da boa nova. Muitas delas têm se alicerçado em nossos interesses de grupo, em projetos mesquinhos institucionais, em jogos de poder que, infelizmente, existem em toda religião. Nesse sentido toda religião tende a matar a fé que está no coração dos humanos! Recuperar o sentido profundo das bem-aventuranças é fazer prevalecer a fé sobre a instituição. A prática da caridade/compaixão sobre os dogmas. O serviço gratuito ao pobre sobre o culto à autoridade, à hierarquia.
As bem-aventuranças não foram e não são um ‘discurso’. Nem tampouco um conjunto de normas e mandamentos. Não são piedosas admoestações pronunciadas por Jesus circunstancialmente. Nem uma lista de categorias sociais que poderão ganhar num futuro próximo, - se aceitarem a sua condição – um suposto prêmio eterno. Uma espécie de reino da felicidade por terem se conformado com sua situação adversa. Ao contrário, elas refletem e sintetizam as prioridades que emergiram do itinerário moral/espiritual de Jesus de Nazaré. Resgatam o miolo da pregação e da prática ousada do mestre da Galiléia. E, principalmente colocam em evidência a nova consciência por parte daqueles que historicamente sempre haviam sido deixados de lado. As bem-aventuranças representam uma espécie de linha de demarcação. A lógica que vigorava até Jesus era de que o abençoado, o feliz, o bem-aventurado era aquele que tinha fartura, que possuía coisas e pessoas, que dominava e perseguia, que praticava a sua autoridade mediante abusos e transgressões. Afinal, se ele agia daquela forma era porque Deus o estava confirmando!
Os primeiros cristãos ao resgatarem a prática de Jesus fazem emergir uma nova consciência. Para eles, a partir do serviço de Jesus aos pobres Deus veio definitivamente para governar de uma forma totalmente nova. Bem diferente de como o fazia Tibério César, herodes e outros. Os esquecidos de Israel são, de fato, os novos protagonistas que manifestam e concretizam a realeza de Deus. Ou seja, Deus administra de forma nova a humanidade escolhendo como mediadores os que lutam por justiça e paz. Os que sofrem perseguições. Os que agem de forma transparente. Todos eles são bem-aventurados não porque são amados e abençoados por Deus, ou porque poderão receber prêmios futuros, mas porque está em suas mãos, agora, a possibilidade de produzir uma inversão de valores e práticas. De realizar tudo o que sempre esteve no coração de Deus e que Jesus o tornou explícito.
Felizes são vocês se compreenderem que chegou a sua hora. A hora de despedir os ricos de mãos vazias, de derrubar dos tronos os poderosos e de reconhecer a dignidade dos humilhados. Para Jesus, esse é o verdadeiro modo de Deus governar!
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