terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Indígenas - Morre Verônica Tembé, a líder histórica do povo Tembé.

Verônica Tembé pintando com jenipapo um antropólogo

Faleceu a semana passada Verônica Tembé mas somente hoje eu soube. Verônica foi a líder Tembé que me ajudou a abrir os olhos sobre a realidade indígena. Mulher generosa, de grande prestígio moral,  amada e respeitada por todos, Verônica faleceu bem velhinha na sua casa em Tekohaw, no Pará, à beira do Rio Gurupi.  A ela o meu obrigado! Re-proponho um breve texto que escrevi por ocasião da minha segunda visita à aldeia Canindé onde Verônica Morava.


Julho de 1985. Aldeia Canindé dos índios Tembé à beira do rio Gurupi, Maranhão. Cinco horas da tarde. Um grupo de caçadores acaba de chegar com cinco queixadas. A correria na aldeia é geral. A carne é despejada em frente da casa da cacique Verônica. Uma mulher sábia. Uma verdadeira líder. De facão na mão, Verônica esquarteja os animais e entrega um pedaço a cada pessoa. Um padre que naqueles dias se encontrava na aldeia como hóspede dos índios, ao ver aquele alvoroço, se aproxima timidamente da concentração. Observa tudo admirado. Repentinamente Verônica o chama para perto e lhe entrega uma enorme coxa de um queixada. O padre, um tanto constrangido faz escorrer quase que involuntariamente a sua mão pelo bolso onde guardava a carteira e pergunta quanto custava aquela carne. Dezenas de pessoas se viram para o padre e o fitam atônitos. Verônica toma a palavra e fala para ele:" Padre, a caça é de todos. Aqui, ninguém compra e ninguém vende. A gente reparte. Afinal, não foi Deus quem botou a caça na mata? Como, então, alguém poderia se atrever a vender uma coisa que pertence a Deus?" O padre, atordoado e admirado com tal resposta, pegou a carne, agradeceu e foi embora. A partir daquele momento porém, os seus olhos se abriram. Começou a perceber como um grupo de pessoas que nunca tinha ouvido falar em Jesus Cristo, que nunca tinha lido o livro dos Atos dos Apóstolos quando descreve a vivência das primeiras comunidades cristãs, vivia práticas profundamente evangélicas. Começou a fazer uma comparação com a sua sociedade que se dizia cristã. Nesta quem tem dinheiro pode comprar tudo e quem não tem, morre de fome. Aquele padre começou a perceber que Deus estava lhe falando através da prática dos índios. O Deus de Jesus Cristo já se tinha revelado àquelas pessoas, que muitos cristãos chamavam de pagãos, selvagens e bichos brutos. Percebeu que quem devia se converter aos índios era ele mesmo e que o desafio-missão, talvez, fosse o de comunicar à sociedade e à Igreja a que pertencia, os valores e as práticas de pessoas que não levavam o nome de cristãos, mas que possuíam a mesma dignidade dos filhos de Deus. 

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