sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Padre Victor Asselin (1938-2013)- Homenagem póstuma

No dia 23 de agosto faleceu em Quebec (Canadá) o padre Victor Asselin, nascido em 1938. Formou-se em advocacia e ordenou-se sacerdote em 1964. Veio ao Maranhão em 1966 e aí atuou por mais de quarenta anos. Sua vida representa, de forma significativa, a figura do sacerdote católico inspirado pelas ideias do Concílio Vaticano II, do pacto das Catacumbas (compromisso com os pobres, celebrado em Roma no final do Concílio por um grupo restrito de bispos) e de Medellín. Por sugestão do padre Ernanne Pinheiro, Victor faz o curso do Instituto Pastoral Latino-americano (IPLA) em Quito, no Equador, no ano de 1973, ocasião em que entra em contato com um grupo de professores comprometidos com a Teologia da Libertação, como Gustavo Gutiérrez, Enrique Dussel, José Comblin e Segundo Galileia. Numa entrevista, dada em 2010, ele relembra o curso no IPLA: ‘foi um momento decisivo em minha vida’. Como outros cursistas do IPLA, em Quito, Victor Asselin aprende a interpretar a América Latina de forma crítica e principalmente a perceber o ‘sistema de pecado’ que a domina. De volta ao Maranhão, é convidado pelo bispo Dom Motta a trabalhar com as comunidades de base (CEBs) e se torna o primeiro coordenador dessas comunidades no Maranhão. Como advogado, percebe com perspicácia as manobras jurídicas do sistema político vigente em relação à população camponesa, especialmente no que se refere a questões relacionadas à posse de terra. Essa sua capacidade em analisar o plano jurídico que domina o Maranhão começa a chamar a atenção de seus colegas. Assim, ele se aproxima de um grupo de uns dez bispos que costumam se reunir após as assembleias da CNBB em torno de Dom Helder Camara, para estudar problemas urgentes existentes no país. Assim surge, no seio desse agrupamento episcopal, a ideia da criação de uma Comissão Pastoral da Terra (CPT), que é apresentada a Dom Moacyr Grecchi, responsável pela linha missionária dentro da CNBB. O bispo aceita o desafio e, em junho de 1975, nasce a CPT, em Goiânia, tendo Dom Moacyr como presidente e Victor Asselin como secretário. 

Victor resolve, então, reunir a farta documentação que possui sobre a grilagem no Maranhão e principalmente na região de Carajás num livro intitulado ‘Grilagem, corrupção e violência em terras de Carajás’, publicado em 1982 pela editora Vozes. Ele é chamado ao Rio de Janeiro para se explicar diante de uma alta patente do exército que lhe faz a seguinte pergunta: ‘donde você tirou as informações contidas em seu livro?’. Ao que ele responde: ‘de documentos cartoriais e de informes oficiais emitidos pela Polícia Federal, acessíveis ao público’. Na entrevista de 2010, que mencionei acima, Victor constata que, trinta anos após a publicação de seu livro, a grilagem no Maranhão continua, assim como as fraudes cartoriais. Ele comenta com tristeza: ‘parece que esquecemos a luta pela terra’. Por ocasião de uma viagem à terra natal, em 2011, para visitar família e amigos, Victor faz um check-up rotineiro de saúde e os médicos descobrem em seu corpo um câncer já generalizado. Com a mesma tranquilidade com que enfrentou as ameaças de morte no Maranhão, Victor comunica a notícia a familiares e amigos e, nos meses seguintes, manda sucessivos e-mails que tratam da progressão da doença e aproximação da morte. Os jornais do Maranhão noticiam sua morte em poucas palavras, ‘sem comentários’, o que indica que sua memória continua a incomodar as classes dominantes no Maranhão. (Fonte: Eduardo Hoornaert)

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