Muitas vezes diante dos desafios da vida fugimos. Fugimos ao nos refugiar em formas paliativas de segurança. Ou em rápidas sensações de bem-estar. Fugimos mediante experiências místicas e espirituais alienantes. Anestesiamo-nos com celebrações carregadas de emoções que entorpecem a nossa percepção da realidade. Extravasamos os nossos sentimentos de culpa, de medo, de louvor, de súplica. Fugimos do nosso passado traumático que gostaríamos de esquecer. E do nosso presente frustrante. Refugiamo-nos em mundos densos de sonhos impossíveis, e de drogas paralisantes. De busca doentia de novas sensações. Fugimos mediante um ativismo exacerbado que nos dê a ilusão que somos fortes no enfrentamento dos ‘reais’ problemas da vida. Temos medo de nos encarar. De encarar quem somos, e o que queremos. De encarar a nossa incapacidade de dar sentido à nossa existência. Sequer conseguiríamos. Tudo nos parece confuso. Temos medo de parar. De parar para olhar para dentro de nós. Parar significa olhar sem véus e sem disfarce a nossa fragilidade e a nossa limitação humana. Temos medo de entrar numa depressão que nos angustia e ofusca a luz da alma e da mente. Temos medo do futuro que se apresenta incerto e fluido. Gostaríamos de ter respostas exaustivas, agora.
No evangelho hodierno, Jesus, com palavras e imagens próprias, retrata a situação humana e social das primeiras comunidades. São as comunidades eclesiais de ‘todos os tempos’. Homens e mulheres que alimentavam sonhos, que regavam esperanças e olhavam para o futuro com os olhos da incerteza e da insegurança. Porque o seu presente era de perseguição, de angústia, de sofrimento. Dentro de si, e dentre os seus experimentavam incompreensão, indiferença, contradição e violência. Nada disso, porém, pode significar fim da história. Nada disso pode afastar o nosso desejo de construir uma nova história. E sermos humanos de forma nova. Homens e mulheres que olham para o seu presente como um momento inédito carregado de graça e de oportunidade. Onde podemos já vislumbrar os meios para derrubar o que ontem nos parecia inamovível, pois o que ontem nos parecia desgraça, no ‘presente’ de Deus se torna salvação. A reviravolta é possível. Não há espaço para o desânimo, para a tristeza e o desespero. Nenhuma fuga é justificada. É agora, no enfrentamento da insegurança e da incerteza do hoje que nos capacitamos para enfrentar as incertezas futuras. Compreender e acolher o hoje com suas contradições é garantia que o amanhã terá a cara dos seus construtores de hoje. Dos que constroem paz na guerra, fraternidade no egoísmo, justiça na iniqüidade, liberdade na escravidão.
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