Há ainda alguma coisa a ser dita sobre a parábola do filho perdido? Algo que tenha escapado à meticulosidade de teólogos e exegetas, ou de pregadores de retiros, ou das concentradas meditações pessoais? Dificilmente foi deixada alguma sombra hermenêutica nessa obra-prima evangélica. Mesmo assim, a distância de anos, a parábola continua a nos surpreender e comover. Comove porque gostaríamos de ser e agir como aquele pai e não conseguimos. Comove porque nos identificamos com aquele filho perdido, solitário aventureiro à procura de um ‘amor ’ mais picante do que o amor de um pai. Mas desejosos, ao mesmo tempo, de encontrarmos um gesto de amor desinteressado quando descobrimos a desilusão e o nosso fracasso pessoal. Comove porque ao experimentarmos os mesmos sentimentos de intolerância do filho mais velho (que está dentro de nós!) descobrimos que, afinal, o pai sempre nos amava mesmo na dureza do nosso coração.
A parábola consegue nos comover porque ela é algo paradoxal. Porque paradoxal é o perdão. Porque o pai é alguém que foge da lógica brutal universal segundo a qual ‘errou tem que pagar’. Uma prática que se tornou sinônimo de ‘justiça’ hipócrita. O pai da parábola de Jesus continua andando contra correnteza: insiste em abrir seus braços e envolver no seu abraço misericordioso aqueles filhos que não o haviam valorizado, até eles fazerem a experiência de não se sentirem abraçados diuturnamente por um pai amoroso quando vivem afastados dele. O pai da parábola deixa de ser um personagem, uma caracterização, e assume o rosto e a conduta do Deus de Jesus de Nazaré. Ainda hoje, na nossa solidão e angústia, ao fazermos memória do Seu amor não valorizado, o Pai Nosso continua nos dizer: ‘quantas vezes te afastares de mim, tantas vezes ficarei à tua espera. Quantas vezes apostares no meu perdão, tantas vezes abraçar-te-ei e farei festa. Quanto mais me traíres, muito mais ser-te-ei fiel. Toda vez que errares estarei ‘reparando’ contigo o teu erro para que onde semeaste morte e divisão possamos plantar juntos amor sem limites’.
O amor gratuito, e o perdão incondicional continuam paradoxais para quem nunca fez a experiência de ser abraçado e perdoado por um pai/mãe!
Um comentário:
Maravilhoso! Certamente,ainda, não tinha ouvido todas as interpretações dessa obra-prima, faltava a sua, tão impolgante e bonito quanto quem a escreveu.
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