Existem pessoas e realidades que são ‘invisíveis’ aos nossos olhos. Deparamo-nos sistematicamente com elas, mas não as vemos. Não damos fé que são ‘reais’, concretas e palpáveis. Não percebemos que, afinal, não as vemos porque o nosso coração e a nossa mente estão concentrados em ‘outras realidades’. Que somos cegos só para com aquelas realidades e pessoas que não queremos que façam parte da nossa vida. Não imaginamos que elas também nos exigem um olhar, um gesto, uma atitude.
O rico ‘epulão’ de que fala a parábola hodierna era incapaz de enxergar a presença do ‘mendigo’ Lázaro que vivia sistematicamente deitado à porta da sua mansão. Que vivia no seu mesmo espaço físico. Passava por ele, mas não lhe dirigia uma palavra, e sequer um gesto, mesmo que fosse de rejeição. Simplesmente, ignorava-o. Jesus, ao apresentar o rico e festeiro ‘epulão’, descreve-o como alguém que ‘se vestia de púrpura e linho fino e que dava banquete todo dia’(v.19). Nisso residia a sua concentração, o seu verdadeiro interesse, e a sua motivação de vida. O seu desligamento e a sua indiferença para com as demais realidades e pessoas faziam com que estas aparecessem ao seu coração cego como ‘invisíveis e inexistentes’. Jesus nos diz que o desejo consumado por riqueza, festança e esbanjamento torna a pessoa cega e indiferente. Incapacita-a a permanecer ligada, solidária e compassiva para com aquelas pessoas que foram reduzidas a viverem no seu ‘lado oposto’.
Cria-se entre as duas realidades um ‘grande abismo’ (v.26) Uma separação aparentemente insanável. Mas só se for deixada para ‘depois’ da morte. É preciso preencher agora esse abismo, enquanto há tempo. Ouvir, agora, a voz de ‘Moisés e dos profetas’ (v. 29) que chamam para a justiça, a compaixão, a equidade. Ao mesmo tempo Jesus se dirige àqueles que 'vestiam púrpura e linho' e que acreditavam que a riqueza era fruto da benevolência de Deus. Jesus, ao contrário, diz que são ‘os Lázaros’ os reais bem-amados de Deus. Aqueles que moram definitivamente no seio de Abraão. E não adianta os acumuladores de riquezas, festeiros e esbanjadores achar que por se considerarem ‘filhos de Abraão’ vão se livrar das conseqüências das suas escolhas de vida! Eles já estão recolhendo agora, os frutos amargos de sua falta de compaixão, de solidariedade, de sobriedade e austeridade de vida. Enfim, de sua cegueira de coração e de sua irresponsabilidade social.
2 comentários:
Se tratássemos o nosso próximo com um pouquinho só do amor que dedicamos aos nossos amigos, daríamos um grande passo. Pois, para lidar com as diferenças entre nós e as outras pessoas, temos que aprender compaixão, autocontrole, piedade, perdão, simpatia e amor - virtudes sem as quais nem nós, nem o mundo, podemos sobreviver.
Excelente reflexão! A melhor que eu vi sobre esta parábola. O Padre escreve muito bem.
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