terça-feira, 2 de junho de 2009

VALE:MODELO DE EMPRESA A NÃO SER SEGUIDO. Os Combonianos se pronunciam.....


Coloco uma síntese livremente re-elaborada por mim de um artigo redigido pela Equipe Comboniana de Açailândia/Piquiá sobre a atuação da VALE no Brasil e no mundo.



No mês de maio uma enchente sem precedentes invadiu no Maranhão os vales dos rios Pindaré e Mearim, uma das regiões mais pobres do Brasil. Por semanas inteiras os moradores daquelas regiões ficaram desabrigados; as estradas cortaram-se inúmeras vezes no Maranhão todo, interrompendo o transporte de pessoas, mercadorias e alimentos; pontes caíram e algumas cidades ficaram isoladas.


Nos mesmos dias, as águas cobriram também a via férrea de Carajás e provocaram desmoronamentos, interrompendo o tráfego em dois pontos. A diferença é que a ferrovia de Carajás transporta o ferro mais puro do Brasil, desde a mina mais rica do mundo até o porto mais fundo do continente latinoamericano. A cada dia, ao longo dos trilhos, passa minério pelo valor médio de 21 milhões de dólares!


A lei do lucro, também nesse caso, fala mais alto de qualquer outra prioridade: a Companhia Vale do Rio Doce (Vale), gestora da estrada de ferro e da mina de Carajás, utilizou criatividade, tecnologia e abundância de mão-de-obra (500 homens foram mobilizados na operação) para levantar diques com sacos de terra dos dois lados dos trilhos e retirar de dentro dessa barragem improvisada a água acumulada através de bombas de sucção.

A Vale do Rio Doce vítima e corresponsável da crise


A Vale tem um poder econômico comparável ao de inteiros Países: é a segunda maior mineradora do mundo por receita bruta, que supera o PIB de nações como o Quênia (37 milhões de habitantes). No mês de Março de 2009 declarou suas perspectivas de crescimento no Moçambique pela realização de uma mina de carvão e de uma central de energia térmica (fortemente poluidora): o investimento previsto é de mais de 4 bilhões de dólares, correspondentes a mais do 30% do PIB do Moçambique em 2008!



Pode-se objetar que não cabe a uma empresa privada socorrer as vítimas de desastres naturais; duvidamos porém que as repetidas enchentes desses meses sejam somente fruto da loucura ambiental. A responsabilidade social de qualquer empresa deve levar em conta sem desconto os efeitos colaterais desse modelo de produção, baseado sobre a monocultura, a devastação da mata nativa para alimentar os fornos de carvão para as siderúrgicas, a poluição (somente em São Luís 70% dos óxidos de nitrogênio, 53% do dióxido de enxofre e 30% do material particulado deve-se à Vale!).

Mesmo assim, vamos considerar um exemplo ainda mais diretamente de responsabilidade das empresas: a crise e o desemprego.



Ao longo desses anos, o refrão da Vale é que a maior riqueza da Companhia são os próprios trabalhadores; em tempo de vacas gordas, é fácil encher a boca com esses proclamas, mais difícil é manter a palavra durante a crise. Daí o conflito desses dias: Vale anunciou o corte de 300 pessoas em Minas Gerais, mas os sindicatos suspeitam que esse número possa chegar até a 850.

Mesmo tendo uma diminuição nos negócios no último trimestre, Vale fechou 2008 com um desempenho recorde (lucro e receita bruta cresceram de 2007 para 2008 respectivamente de 19% e 16,3%). O preço do minério permaneceu fixo ao longo do ano todo, mas nos últimos meses Vale está vendendo minério às empresas chinesas com 20% de desconto sobre o preço de referência de 2008, para não perder o mercado oriental em concorrência com outras mineradoras.


Na região de Carajás, porém, onde Vale detém o monopólio da mineração, não houve desconto algum: por isso, no Pará de 10 siderúrgicas existentes somente 3 estão trabalhando. Em Açailândia, importante centro siderúrgico do Maranhão, somente 6 sobre 15 altofornos estão ativados.


Em paralelo a essa “agressividade econômica”, temos desde já numerosos exemplos de violência ambiental. Os últimos foram um incidente grave na Nova Caledônia em Abril A poderosa máquina da propaganda da Vale divulgou no mesmo período dos acidentes o lema de ”empresa cada vez mais verde”. Para o sistema do lucro, os acidentes são pequenos empecilhos e, às vezes, até oportunidades, como podemos aprender dessa fala emblemática do presidente da Companhia, Roger Agnelli: "Esta crise está boa para nós. Todos os rios caminham para o mar. A realidade é que nós temos os melhores recursos; nós temos o mais baixo custo e muitos dos grandes caras - que eram grandes há alguns meses - estão desaparecendo. De fato, Vale aproveitou nesses últimos meses para realizar operações economicamente muito significativas.

Em busca de respostas evangélicas


A violência socioambiental continua coletando mártires silenciosos, mortes lentas e outras mais chocantes. Esse apelo chega forte a nosso coração de missionários, chamados por Deus às fronteiras da luta para que Tudo tenha Vida. A justiça ambiental é a utopia mais completa que podemos buscar, a partir dessas terras preamazônicas que já sofreram inúmeras violações e saques.


As palavras de São João, padroeiro tão querido pelo povo do Nordeste, ressoam em nós com sabor de raiva e paixão pela justiça: ”Raça de cobras venenosas, quem lhe ensinou a fugir da ira que vai chegar? Façam coisas para provar que vocês se converteram!”


Quando Jesus mandou escolher entre Deus e o dinheiro, não isentou a classe empreendedora dessa opção: há meios e possibilidade de investir e gerar trabalho e lucro no respeito da vida e do meio ambiente. Esses meios se encontram através de dinâmicas de partilha, de participação, de acesso de todos às decisões: são esses os valores profundamente evangélicos que devem permear também o mundo da economia, em profundo conflito com os valores do anti-reino (acumulação, centralização do poder e das escolhas, controle do capital, financeirização dos recursos, etc).

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