terça-feira, 29 de julho de 2025

Relatório Violência Contra Povos Indígenas no Brasil – 2024: primeiro ano de vigência da Lei do Marco Temporal foi marcado por conflitos e violência contra povos em luta pela terra

O ano de 2024 foi o primeiro a iniciar sob a vigência da Lei 14.701/2023, aprovada pelo Congresso Nacional e promulgada nos últimos dias de dezembro de 2023. A expectativa dos povos indígenas e seus aliados era de que, dada a flagrante inconstitucionalidade e o evidente conflito com a recente decisão de repercussão geral sobre o tema, a chamada “Lei do Marco Temporal” fosse rapidamente derrubada por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Não foi, contudo, o que aconteceu. A lei permaneceu em vigor durante todo o ano de 2024, fragilizando os direitos territoriais dos povos originários, gerando insegurança e fomentando conflitos e ataques contra comunidades indígenas em todas as regiões do país. Este foi o cenário registrado pelo relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2024, publicação anual do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Violência contra o Patrimônio

As “Violências contra o Patrimônio” dos povos indígenas, reunidas no primeiro capítulo do relatório, totalizaram 1.241 casos em 2024. Esta seção é organizada em três categorias: omissão e morosidade na regularização de terras, que reúne a lista com todas as terras indígenas com alguma pendência ou sem providências para sua regularização, que totalizou 857 casos; conflitos relativos a direitos territoriais, que teve 154 registros em 114 Terras Indígenas em 19 estados; e invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio, com 230 casos, que atingiram 159 Terras Indígenas em 21 estados do Brasil. Os casos registrados neste capítulo têm relação direta com a fragilização dos direitos indígenas ocasionada pela Lei 14.701, reconhecida pela própria Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Incitado a comentar o efeito da lei por meio de questionamento feito via Lei de Acesso à Informação (LAI), o órgão admite que a medida afeta potencialmente “todas as Terras Indígenas que se encontram em fase administrativa anterior à regularização”.

Violência contra a Pessoa

Reunidos no segundo capítulo do relatório, os casos de “Violência contra a Pessoa” totalizaram 424 registros em 2024. As nove categorias nas quais é dividida esta seção registraram os seguintes dados: abuso de poder (19 casos); ameaça de morte (20); ameaças várias (35); assassinatos (211); homicídio culposo (20); lesões corporais (29); racismo e discriminação étnico-cultural (39); tentativa de assassinato (31); e violência sexual (20). Os três estados com maior número de assassinatos têm se mantido constantes nos últimos anos. Em 2024, Roraima (57), Amazonas (45) e Mato Grosso do Sul (33) registraram os números mais altos, com destaque também para a Bahia, onde 23 indígenas foram assassinados. Os dados, que totalizaram 211 assassinatos, foram compilados a partir de consultas a bases do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e de secretarias estaduais de saúde, além de informações obtidas junto à Secretaria Especial de Atenção à Saúde Indígena (Sesai) via LAI. Foram graves e numerosos os ataques armados a comunidades indígenas em luta pela demarcação de suas terras, e tiveram implicações e desdobramentos registrados em diferentes categorias desta seção. Os assassinatos de Nega Pataxó Hã-Hã-Hãe e de Neri Ramos da Silva, morto durante uma operação policial contra uma retomada Guarani e Kaiowá na TI Ñande Ru Marangatu, destacam-se pela brutalidade e pela participação da Polícia Militar. Além do terror, das ameaças e dos ferimentos por agressões e tiros nos diversos ataques que atingiram comunidades como as das TIs Tekoha Guasu Guavirá, no Paraná, e Panambi – Lagoa Rica, em Mato Grosso do Sul, muitos indígenas relataram casos de discriminação e preconceito ao buscar atendimento médico em hospitais, evidenciando um contexto de racismo e desumanização.

Violência por Omissão do Poder Público

As “Violências por Omissão do Poder Público”, organizadas em sete categorias, são reunidas no terceiro capítulo do relatório. Segundo os dados obtidos junto ao SIM, a secretarias estaduais e à Sesai, foram registrados 208 suicídios de indígenas em 2024. Como no ano anterior, Amazonas (75), Mato Grosso do Sul (42) e Roraima (26) registraram os números mais altos, que se concentraram, no país, majoritariamente entre indígenas de até 19 anos (32%) e entre 20 e 29 anos de idade (37%). Dados obtidos junto às mesmas fontes registraram 922 óbitos de crianças de 0 a 4 anos de idade em 2024, com maior número de casos nos estados do Amazonas (274 óbitos), de Roraima (139) e de Mato Grosso (127). Novamente, a maioria dos óbitos de crianças indígenas de até quatro anos de idade foi provocada por causas consideradas evitáveis, entre as quais destacam-se as mortes ocasionadas por gripe e pneumonia (103); por diarreia, gastroenterite e doenças infecciosas intestinais (64); e por desnutrição (43). Ações adequadas de atenção à saúde, imunização, diagnóstico e tratamento poderiam evitar ou diminuir consideravelmente o desfecho fatal nestes casos.  Também foram registrados os seguintes dados nesta seção do relatório: desassistência geral (47 casos); desassistência na área de educação (87); desassistência na área de saúde (83); disseminação de bebida alcóolica e outras drogas (10); e morte por desassistência à saúde (84), totalizando 311 casos. Muitas das situações registradas neste capítulo são recorrentes e referem-se à falta generalizada, em aldeias do país inteiro, de infraestrutura escolar e de saúde, assim como à ausência de saneamento básico e de água potável. As inundações e acúmulo de chuvas, no Rio Grande do Sul, e a seca, no norte do país, agravaram estas circunstâncias e provocaram, em alguns casos, vulnerabilidade severa a comunidades inteiras. (Fonte: CIMI)


sexta-feira, 25 de julho de 2025

17º Domingo Comum - Deixar-se possuir pelo Espírito do Pai para realizar, nós mesmos, o que delegamos a Ele!

A oração do Pai Nosso não é uma oração propriamente dita, uma fórmula a ser repetida para obter de Deus graças, favores e vitórias! É, melhor dito, uma síntese dos principais eixos do plano de ação de Jesus em que Ele se relaciona com Deus considerado um ‘Abbá/Pai’ próximo de seus filhos. É, indiretamente, um compromisso por parte de seus seguidores em assumir a lógica e a própria metodologia de Jesus em sua relação com Deus e seus filhos/as. A oração deixa de ser, portanto, uma lista de pedidos genéricos e insistentes a Deus, e se torna uma tomada de consciência de cada discípulo do que lhe cabe para construir o mundo do jeito que Deus Pai quer! Afinal, não adianta pedir a Deus isto ou aquilo, pois Ele já sabe, de antemão, do que, efetivamente, precisamos! É, isso sim, insistir junto ao Pai para que doe aos seus filhos/as o que precisamos realmente, ou seja, o Espírito do Pai no coração de cada filho e filha. Só assim começaremos a sentir, a olhar e a agir como um Pai de verdade ama. Só mediante o Espírito de Deus dentro de nós é que podemos discernir o que realmente é central na nossa vida, e o que é periférico. Só assim encontraremos coragem para construir e produzir, nós mesmos, o que muitas vezes pedimos com insistência e delegamos ao próprio Deus!


quarta-feira, 23 de julho de 2025

Ao som dos tambores, abraços, sabores e chegança, São Luís do Maranhão recebe o V Congresso Nacional da CPT



Com a alegria do reencontro, mesmo depois do cansaço das longas viagens, o centro histórico de  São Luís, estado do Maranhão, recebe esta semana mais de mil pessoas para o momento de celebração e reflexão sobre os 50 anos de caminhada da Comissão Pastoral da Terra (CPT) junto aos povos da terra, das águas e das florestas. É o V Congresso Nacional da CPT, que se realiza dez anos depois do encontro anterior, em Rondônia, e após uma pandemia que impediu a realização do Congresso no ano de 2020.

Desde os momentos de acolhida, que antecederam o café da manhã e a celebração de abertura, as caravanas mostraram a força da solidariedade e das lutas das comunidades onde a CPT está presente, na resistência onde se percebe a presença divina e a profecia. Uma pastoral que chega ao meio século, nasce do clamor dos povos e das comunidades, dos trabalhadores e trabalhadoras do campo, indígenas, posseiros, quilombolas, seringueiros, fecheiros, mulheres e jovens, atingidos por barragens e demais empreendimentos. A força das mulheres e da espiritualidade estava presente desde o início da celebração de abertura na grande tenda, movida pelas músicas e cantos populares do campo, das águas e das florestas, seguida da defumação e benzimento, a fim de pedir licença e purificar a manhã de atividades e programações do primeiro dia. Todas as refeições durante o evento acontecem em cozinhas solidárias organizadas pelas caravanas regionais e contam com alimentos doados produzidos nas comunidades e territórios dos trabalhadores e povos do campo. Esse é um Congresso que se constrói com as comunidades trabalhadoras e é feito por elas. Dentre as autoridades eclesiásticas presentes, estiveram os bispos Dom Gilberto Pastana (arcebispo de São Luís), Francisco Lima (diocese de Carolina e bispo referencial da CPT Maranhão) e José Ionilton Oliveira (bispo da Prelazia do Marajó e presidente da CPT). “Compartilhamos a alegria por acolher este evento e a preocupação natural com o trabalho e empenho da equipe. Nosso desejo é que aproveitem o tempo para partilhar suas esperanças. A gente sai fortalecido e enriquecido para continuar a caminhada. Como dizia o Papa Francisco, tudo está interligado, então não podemos estar em isolamento”, declarou Dom Gilberto.

“A CPT recebeu de Deus o chamado para encarnar a missão libertadora. Agradecemos aos grupos de base, regionais, articulações, grandes regiões, mas a gratidão maior se estende aos trabalhadores e trabalhadoras rurais. Nós existimos para vocês, com vocês e por vocês. Nós não existimos para nós mesmos. Neste momento de viver o Congresso e celebrar os 50 anos, vocês foram e são essas presenças, resistências e profecias. Estamos unidos em uma mesma causa, que é defender os povos da terra, das águas e das florestas, e o ar puro. É defender a vida”, afirmou Dom Ionilton. As memórias dos saudosos bispos Dom Enemézio Lazzaris (bispo de Balsas e ex-presidente da CPT) e Dom Xavier (de Viana) foram enaltecidas pelo vice-governador do Maranhão Felipe Camarão, que também declarou preocupação com os índices apresentados pela CPT no caderno Conflitos no Campo 2024, em que seu estado aparece em primeiro lugar no número de conflitos: “Reforçamos que o caminho para o combate à violência no campo se dá pela educação no campo, a regularização fundiária, a reforma agrária, a preservação do meio ambiente e a valorização da agricultura familiar. É preciso resistir contra aqueles que querem atacar a nossa soberania, que querem mandar no nosso Judiciário, na nossa democracia. Resistimos, sobreviveremos e venceremos”. Dentre os últimos atos na abertura, esteve a instalação de uma urna do Plebiscito Popular contra a Escala 6×1 e pela taxação das grandes fortunas. A urna estará presente durante todo o congresso, sendo os três bispos os primeiros a registrarem seus votos de compromisso com as causas das trabalhadoras e trabalhadores do campo e da cidade.

Algumas falas de participantes do V Congresso da CPT

Mariozan (Raizeiro), engenheiro ambiental, do pontal do Triângulo Mineiro, município de Santa Vitória –Regional Uberlândia/MG: “Viemos de longe, viajamos dois dias e meio de ônibus, mas na ânsia de aprender, trocar sementes e outras coisas. Trabalhamos com a cura da comunidade a partir das plantas medicinais do Cerrado. Infelizmente no nosso território vivemos o auge da monocultura da cana, mas a gente faz o contraponto, mostrando o Cerrado e lutando para preservar para as futuras gerações.”


Gil Quilombola, da região da Baixada, Quilombo Cajapara, município de Serrano do Maranhão/MA: “Nós temos nosso modo de vida coletivo, nossa diversidade cultural, a pescaria artesanal, a agricultura familiar. É uma junção de saberes que a gente tem e que impactam o nosso modo de vida. A nossa expectativa é imensa de viver os 50 anos da CPT, pra a gente sair levando mais força para as outras pessoas que não puderam vir.”

Liliani, articuladora da CPT em Canindé/CE: “Viemos celebrar os 50 anos de muita resistência e profecia, e aprender pra levar pra a comunidade, principalmente na nossa luta pela água de qualidade.”

Gilberto, da Escola dos Ventos em Caetés/PE: “O Congresso está muito bonito, tem muita gente do Brasil inteiro. Viemos trocar experiências e compartilhar a nossa articulação contra o avanço dos empreendimentos.”

Kleicianny, Assentamento Terra Firme – Uberlândia/MG: “Nossa comunidade se destaca pela esperança, pela unidade e coletividade. A nossa expectativa neste Congresso é a melhor possível, de que alguma política pública precisa ser implementada neste espaço.”

Eloi, liderança Guarani Nhandewa e conselheiro do Cepi/Paraná: “Venho de uma retomada de território indígena, onde trabalhamos com reflorestamento, revitalização de nascentes, de rios e agroecologia. A gente tem muita proximidade com os movimentos sociais de luta pela terra, e a nossa expectativa é aprender, conhecer e poder passar um pouco da nossa experiência de luta pela terra, por dignidade e por respeito.”


segunda-feira, 21 de julho de 2025

FOME EM GAZA É MAIS UMA PROVA DO GENOCÍDIO DO GOVERNO SIONISTA DE ISRAEL!

Até agora, a desnutrição matou 76 crianças e outras 600.000 correm risco iminente de morte pelo mesmo motivo. Muitas delas já estão hospitalizadas, mas os hospitais não têm os meios mais básicos para salvá-las. Seus pais e médicos são deixados para vê-las morrer. Você consegue imaginar tamanho estado de desamparo e angústia por parte de mães e pais que já abriram mão de suas porções de comida para tentar, em vão, salvá-las? Muitas crianças agora se sentem culpadas até mesmo por dizerem um simples "Estou com fome": elas sabem que até mesmo dizer isso fará seus pais sofrerem. Os mercados agora estão vazios; não se consegue nem encontrar produtos a preços exorbitantes. Ter dinheiro não significa nada, porque não há nada para comprar. Isso não é pobreza ou falta de recursos: é fome forçada e deliberada. É uma arma de guerra. Centenas de caminhões carregados com ajuda humanitária e alimentos estão presos na fronteira. Bastaria uma decisão para deixá-los passar. Os poucos que ocasionalmente conseguem entrar não são suficientes. E até agora, pelo menos 995 pessoas morreram e 6.000 ficaram feridas enquanto buscavam ajuda. Todas as manhãs, mesmo na minha família, inicia-se uma discussão interminável sobre como sobreviver ao dia. Não comemos carne, frango, ovos, nozes ou laticínios desde fevereiro. Meu irmão vagueia pelas ruas procurando algo para comprar. Quando ele encontra comida sem gosto e inadequada, sinto-me privilegiada; a cada mordida, a culpa me atormenta, sabendo que muitos não têm dinheiro nem para beber um gole de água. O pior da fome é o quão humilhante ela é. Aqui estamos, morrendo lentamente, enquanto o mundo assiste e deixa tudo isso acontecer. Até mesmo um renomado professor judeu especializado em estudos sobre genocídio disse recentemente que não teve escolha a não ser reconhecer o mesmo.

"Tendo crescido em um lar sionista, vivido a primeira metade da minha vida em Israel, servido nas Forças de Defesa de Israel como soldado e oficial e passado a maior parte da minha carreira pesquisando e escrevendo sobre crimes de guerra e o Holocausto, essa foi uma conclusão dolorosa de se chegar, e à qual resisti o máximo que pude", disse Bartov, professor de estudos sobre Holocausto e genocídio na Universidade Brown. "Mas dou aulas sobre genocídio há um quarto de século. Consigo reconhecer um quando vejo um", disse ele. O falecido Papa Francisco costumava ter o cuidado de não tomar partido abertamente em conflitos internacionais. Mas ele era um crítico ferrenho dos ataques retaliatórios de Israel contra a população palestina em Gaza e na Cisjordânia. Ele nunca os chamou de genocídio diretamente, mas em "Esperança", um livro com entrevistas lançado em inglês no início de 2025, ele destacou que alguns especialistas internacionais afirmam que "o que está acontecendo em Gaza tem as características de um genocídio". Francisco prosseguiu dizendo: "Devemos investigar cuidadosamente para avaliar se isso se enquadra na definição técnica (de genocídio) formulada por juristas e organizações internacionais".


domingo, 20 de julho de 2025

MAIS UMA COP COMBONIANA. PORQUE, PARA QUE? Por Claudio Bombieri

Mais uma COP a reunir em Belém, PA, os principais países poluidores do planeta no intuito de se enganarem reciprocamente numa suposta busca de saídas realistas e oportunistas para adiar o ‘Ponto de não retorno’ que nunca ficou tão próximo como agora! E, concomitantemente, mais uma ‘COP comboniana’, na capital do Pará, pela segunda vez. Talvez menos ambiciosa, mas, quem sabe, com igual presunção de reacender a chama da defesa da badalada ‘ecologia integral’. E, talvez, na ilusão de que, a partir de mais um encontro planetário, se transforme, enfim, numa prática histórica efetiva, e não somente uma estereotipada ‘prioridade provincial formal’. Por trás de tudo isso há, certamente, um longo, denso e inegável processo histórico-cronológico que poderia ser resgatado em toda a sua amplitude, desde o início, quando do Iº Social Fórum em Porto Alegre, no longínquo 2001 e que tinha como lema ‘Um outro mundo é possível’. Não cabe, aqui, contudo, fazer esse trabalho paciente e meticuloso de resgate e apreciação do que podem ter significado para os Combonianos em geral, e para os do Brasil, especificamente, os inúmeros e constantes encontros paralelos/alternativos de caráter global, realizados ao longo desses quase 25 anos em concomitância aos megaeventos mundiais. 

Para quem tem tido a oportunidade de participar direta ou indiretamente da convocação, preparação e execução dos históricos ‘encontros combonianos’ não passa batida a constatação de que, inicialmente, havia nos participantes, uma difusa convicção de que era urgente, - como ainda o é, - inclusive para o próprio instituto, debater não somente questões globais relacionadas às enormes e variegadas ‘mutações sociopolíticas e econômicas’ e seus derivados, mas também tentar rever, traçar e assumir, internamente, no nível micro, em nível provincial, projetos, opções, escolhas, metodologias, sensibilidades que pudessem nos ajudar a repensar e a reformular o todo. Em suma, à luz das macromutações readequar os rumos da missão/evangelização, da formação de base e permanente, da metodologia de administrar e organizar a participação do grupo e a sua coordenação, entre outros. Dito de outra forma e parafraseando o lema do Social Fórum poderíamos dizer que se acreditava que ’Um outro Instituto/Província é possível’.

Não temos observado ao longo desses anos, em que pesem as novas sensibilidades e o aparecimento de uma nova geração que participou escassamente ao longo do processo por óbvios motivos, uma tentativa de analisar crítica e sistematicamente os desfechos, os avanços, as mudanças de rumos, e, porque não, os resultados concretos desses encontros combonianos. Certamente, tem havido a clássica avaliação de fim-de-encontro que, sistematicamente cai no vazio no dia seguinte, mas referimo-nos, essencialmente, a um olhar mais atento, profundo e sistêmico do ‘conjunto da obra’ até para ver se, efetivamente, esses ‘encontros globais’ têm sido fonte de inspiração e de práticas concretas e, simultaneamente, expressão real e histórica delas, ou se, ao contrário, continuam sendo movidos por uma espécie de obscura força inercial, e nada mais. Essa tentativa de jogar luz sobre o processo como um todo é algo que deveria ser feito internamente, mas também institucionalmente, entre as províncias combonianas que têm enviado representantes, ou do continente americano ou de outros.  Não seria legítimo, por exemplo, se perguntar quais foram, de fato, as resoluções que foram implementadas nos diferentes níveis (provincial, continental, e no instituto)? Houve, concretamente, o esforço de criar mecanismos reais para dar continuidade e consistência às intuições e encaminhamentos que emergiam, progressivamente, nos diferentes encontros? Seria algo paradoxal se perguntar se valeu a pena e o porquê? A sensação que temos é de que até a lembrança histórica, não a documental, tenha evaporado com o tempo!

Causa-nos estranheza observar como ao se promover mais um encontro de tamanha envergadura, como o que vai ocorrer em Belém, dentro em breve, exista uma sorta de corrida automática às inscrições como se isso fosse um positivo reflexo concreto e coerente de uma sensibilidade e de um compromisso já efetivos, na província, na ordem da ‘ecologia integral’, nesse caso específico. Constatamos, todavia, que há ainda uma clara discrepância entre o que é proclamado e registrado em documentos provinciais formais e as práticas concretas das pessoas/missionários, comunidades combonianas, nessa dimensão. Não se trata, tampouco, de constatar as normais contradições próprias dos humanos, mas de enxergar um desvio ou omissão de intencionalidade, consciente ou não. Concretamente, torna-se urgente se perguntar se existe, de fato, uma sincera preocupação com a ‘integridade da criação’, - como se falava inicialmente, - como estamos a enfrentar nós, aqui, no Brasil, as assim chamadas ‘questões climáticas’ na atualidade? Quem de nós está a refletir, debater, produzir sobre os dramas da seca na Amazônia, a desolação dos ribeirinhos, a destruição praticada pelas dragas dos garimpeiros, os efeitos catastróficos da extração de minérios em várias aldeias indígenas e a sua industrialização em numerosas cidades desse País? Ou a progressiva e alarmante destruição do Cerrado, a monocultura da soja, as inundações no Sul do Brasil e suas vítimas, só para citar algumas? Quais foram os encaminhamentos operativos que surgiram ao longo dos anos nessa dimensão e que foram efetivamente acatados pela nossa Província, e se sim, quais mudanças concretas produziram na nossa Província? E, simultaneamente, como toda essa inegável riqueza de debate e de reflexões acumuladas interferiram na ‘formação de novas consciências, metodologias e sonhos’ e numa sensibilidade mais apurada dentro do próprio Instituto como um todo?

Acreditamos que não se trata de produzir alguns artigos supostamente científicos a respeito, pois existem em abundância, e nem de aderir, simplesmente a determinadas ‘plataformas’, mas de se perguntar onde nós nos situamos neste contexto sócio-histórico ambiental como missionários Combonianos do Brasil, defensores dos ‘últimos e abandonados’ como frequentemente nos autoproclamamos. Surge natural se perguntar se vale a pena continuar a promover e a sustentar ainda essas manifestações que, talvez, nesse momento concreto veiculem mais a imagem de uma contraditória e decadente vitrine de uma opção que já vem definhando há bastante tempo. Não se trata, aqui, de cuspir sentenças e de fazer sumários julgamentos históricos, - pois, afinal, estamos todos no mesmo barco, - e sim, de nos rever e avaliar com franqueza a partir do que somos e do que queremos nesse momento histórico, a partir dos recursos humanos que possuímos, sem medo de deixar emergir no grupo, divergências e conflitos patentes ou latentes. Será que ao afirmar isto estaríamos enganando a nós mesmos ou, porventura, o que aqui se coloca seria ‘totalmente falso’? Ou, por acaso, estaríamos deixando nos levar nas asas da memória de um tempo nostálgico, utópico, considerado luminoso, glorioso, mítico e que já não existe, mas que nos ilude de que nós somos ainda os profetas e defensores de causas e lutas de vanguarda, ‘ecologicamente corretas’? 

Que esta simples reflexão e provocação, - mesmo não encontrando confirmação, - seja, pelo menos, entendida como um mero e legítimo parecer de quem não alimenta mais esperança para um debate aberto e franco na atual conjuntura interna, nas suas instâncias formais onde tende a reinar, necessariamente, o clima de ‘fraternidade e de comunhão’ acima de tudo. E, ao mesmo tempo, que esses questionamentos sejam expressão de uma tênue e subjetiva percepção ou de um simples registro de quem, desde o seu ponto de vista singular, acredita que, talvez, tenha chegado a hora de nos olhar com desarmante franqueza, como grupo Comboniano do Brasil, sem subterfúgios e sem maquiagens, em assembleias formais ou não, e reconhecer com humildade e realismo as nossas rugas e rusgas. E, quem sabe, ao reconhecê-las, possivelmente possamos redescobrir um outro rosto mais autêntico e mais bonito. 

Piquiá, 21 de julho, 2025


sábado, 19 de julho de 2025

16° domingo comum - Chega de submissão a uma tradição engessada e patriarcal e seja discípula que escuta e segue o Mestre!

Estranho comportamento o de Marta! Justamente na hora em que o amigo Jesus a visita ela inventa serviço. E mais: exige que a irmã Maria faça o mesmo, ou seja, renuncie a escutar o Mestre e mergulhe nos afazeres domésticos como ela faz. O que parece ser uma caricatura na realidade para o nosso teólogo Lucas é a manifestação de uma postura ideal perante o visitante Jesus. Quando Jesus nos visita, esqueçam o resto e se coloquem a seus pés para ouvi-lo! Só que não era a atitude conveniente para uma mulher à epoca. Afinal, lugar de mulher era na cozinha! Maria rompe com a tradição, entende o momento oportuno para crescer em humanidade ao aprender com o Mestre. Oportunidades assim não aparecem todos os dias. O nosso evangelista que tem um olhar atento ao papel das mulheres discípulas nas primeiras comunidades cristãs não se intimida perante as clássicas posturas machistas e patriarcais e deixa claro que Jesus prefere a escolha de Maria. Caberá à vítima da tradição, Marta, se libertar e romper com um passado de submissão e se sentar ao lado do Mestre para ouvir, debater e se confrontar como todo discípulo e discípula deveria fazer!

quinta-feira, 10 de julho de 2025

XV DOMENICA - Dio è amato e venerato quando amiamo visceralmente i suoi figli feriti e agonizzanti

La parabola del “Buon Samaritano” ci mostra qualcosa di paradossale. Ci dimostra come la religione puó impedire l'esercizio della caritá che è il fulcro della nostra vita religiosa! Quando un "religioso devoto" si preoccupa esclusivamente di "obbedire ai precetti rituali e alle norme liturgiche" della sua religione – credendo che così facendo compiacerebbe il suo Dio – finisce spesso per mettere in secondo piano i "figli di Dio" e i loro bisogni, che è ciò che veramente conta! Se il presunto amore per Dio non si traduce in amore viscerale e compassionevole per il "prossimo escluso e ferito" – indipendentemente di chi sia – non è altro che alienazione pura. Gesù è ancora più diretto: non basta "amarlo come se stessi", ma dobbiamo amarlo 'come Dio ama' perché il metro di paragone non è "se stessi", ma il Padre misericordioso. Ma come ama Dio? Dio ama come un umano carico di compassione e che si avvicina, assiste, si prende cura, guarisce i suoi figli feriti e agonizzanti, anche se ció lo rende "infedele e impuro" agli occhi della sua religione. Dopotutto, per Gesù, la più grande 'impurezza religiosa' è la mancanza di compassione e di misericordia verso i 'suoi prossimi' che sono umiliati, deportati, bombardati e torturati, sotto i nostri "occhi spietati e negligenti"!  

15º domingo comum - Deus é amado e venerado ao amarmos, visceralmente, os seus filhos feridos e agonizantes!

A parábola do ‘bom samaritano’ nos mostra algo paradoxal. Prova como a religião e suas obrigações pode impedir o exercício da caridade que é o cerne da vida religiosa! Quando um ‘religioso devoto’ se preocupa exclusivamente em ‘obedecer a preceitos rituais e normas litúrgicas’ da sua religião, - achando que com isso estaria agradando ao seu Deus, - acaba, frequentemente, colocando em segundo lugar ‘os filhos de Deus’ e suas necessidades que é o que, de fato, importa! Se o suposto amor a Deus não se traduz em amor visceral e compassivo, ao ‘próximo excluído e ferido’, - sem se importando quem ele seja, - não passa de uma mera alienação. Jesus é mais direto ainda: não é suficiente ‘amar o próximo como a si mesmo’ mas que temos que amá-lo como Deus o ama, pois o metro de comparação não é ‘si mesmo’, mas o Pai misericordioso. Mas, como é que Deus ama? Deus ama ao se aproximar, se compadecer, assistir, cuidar e curar o outro que é necessitado e agonizante, mesmo que isso o torne ‘um infiel e impuro’ perante a sua religião. Afinal, para Jesus, a maior impureza religiosa é a falta de compaixão e de misericórdia para com o nosso próximo que está sendo humilhado, deportado, bombardeado e torturado, debaixo dos nossos ‘olhos impiedosos e omissos’!  


Se não por Deus, façam-no pelo que resta de humano na humanidade... Artigo de Mimmo Battaglia, arcebispo de Nápolis

 O planeta ressoa com os tambores da guerra em todas as direções do horizonte. Na Ucrânia, treze mil civis dizimados pelo fogo; em Gaza, cinquenta e sete mil vidas apagadas em vinte e um meses de cerco; do Sudão, quatro milhões de corpos marchando em busca de um lenço de sombra; em Mianmar, três milhões e meio de rostos espalhados entre cinzas e selva; e, acima de tudo, uma cidade invisível que não para de crescer: cento e vinte e dois milhões de refugiados lançados ao vento como sementes. 

Esses números – vocês os sentem pulsar? – deveriam gelar o sangue, mas se dissiparão como névoa se não aproximarmos nossos ouvidos à batida que eles conservam. Cada número é uma testa que arde, uma fotografia desbotada apertada na mão, uma voz que pede apenas um minuto sem sirenes. A vocês que detêm as alavancas do poder – governos falsamente democráticos, conselhos de administração lubrificados como engrenagens, alianças militares com vozes de metal – eu digo que o Evangelho não dá descontos nem suaviza a verdade. Não pede carteirinhas, não exige incenso: exige que se reconheça um homem quando o vemos, que se chame de mal o que esmaga o homem. "Tive fome e me deste de comer, era estrangeiro e me acolheste" não é um enfeite piedoso: é uma norma primária escrita com o pulso de Deus. Não existem cláusulas, não existem notas de rodapé minúsculos para esconder o egoísmo. Se querem ser guia e não leme desgovernado, detenham os comboios carregados de morte antes que atravessem a última fronteira; desmantelem as maquinarias que gotejam chumbo e forjam arados, tubulações, carteiras escolares. Levem os orçamentos de guerra à mesa de um professor cansado: transformem milhões destinados a mísseis em salas de parto iluminadas, ambulâncias capazes de chegar até os sofrimentos mais remotos. E vocês que se afundam nas poltronas vermelhas dos parlamentos, abandonem dossiês e gráficos: atravessem, mesmo que por apenas uma hora, os corredores apagados de um hospital bombardeado; sintam o cheiro de diesel do último gerador; ouçam o bipe solitário de um respirador suspenso entre a vida e o silêncio, e então sussurrem – se conseguirem – a frase "objetivos estratégicos".

O Evangelho – para quem crê e quem não crê – é um espelho impiedoso: reflete o que é humano, denuncia o que é desumano. Se um projeto esmaga o inocente, é desumano. Se uma lei não protege o fraco, é desumana. Se um lucro cresce às custas da dor de quem não tem voz, é desumano. E se não querem fazê-lo por Deus, pelo menos o façam por aquele pouco de humanidade que ainda nos mantém de pé. Quando os céus se enchem de mísseis, olhem para as crianças que contam os buracos no teto em vez das estrelas. Olhem para o jovem soldado enviado para morrer por um slogan. Olhem para os cirurgiões que operam no escuro num hospital destruído. O Evangelho não aceita os seus comunicados "técnicos". Descasca qualquer verniz de pátria ou interesse e deixa-nos perante a única realidade: carne ferida, vidas destruídas. Não chamem de "danos colaterais" as mães que escavam entre os escombros. Não chamem de "interferência estratégica" os jovens a quem roubaram o futuro. Não chamem de "operações especiais" as crateras deixadas pelos drones. Podem até tirar o nome de Deus se isso lhes assusta; chamem de consciência, honestidade, vergonha. Mas ouçam-no: a guerra é o único negócio em que investimos a nossa humanidade para obter cinzas. Cada bala já está prevista nas planilhas daqueles que lucram com os escombros. O humano morre duas vezes: quando a bomba explode e quando o seu valor é traduzido em lucro. Enquanto uma bomba valer mais do que um abraço, estaremos perdidos. Enquanto as armas ditarem a agenda, a paz parecerá loucura. Portanto, desarmem os canhões. Silenciem os títulos da bolsa que sobram às custas da dor.

Restituam ao silêncio a aurora de um dia que não manche as ruas de sangue. Todo o resto – fronteiras, estratégias, bandeiras infladas pela propaganda – é névoa destinada a dissipar-se.Só restará uma pergunta: "Salvei ou matei a humanidade que me foi confiada?" Que a resposta não seja mais uma sirene na noite. Convertam os planos de batalha em planos de semeadura, os discursos de poder em discursos de cuidado. Sentem-se ao lado de mães que vasculham os escombros para salvar um bichinho de pelúcia: vocês descobrirão que a estratégia suprema é impedir que uma criança perca a infância. Levem o cheiro de pedras queimadas para dentro de seus palácios: deixem que impregne os tapetes, lembrando a cada passo que ninguém se salva sozinho e que o único caminho seguro é trazer cada homem de volta para casa inteiro de corpo e coração. A nós, povo que lê, cabe o dever de não desistir. A paz brota na sala de estar - um sofá que se alonga; na cozinha - uma panela que se duplica; na rua - uma mão que se estende. Gestos humildes, obstinados: "você vale", sussurrado àquele que o mundo descarta. O grão de mostarda é mínimo, mas se torna uma árvore. Assim é o Evangelho: duro como pedra, tenro como o primeiro choro. Exige uma escolha clara: construtores da vida ou cúmplices do mal. Não há terceiras vias. Dobre, Cristo, o orgulho dos poderosos, convide os forjadores de armas a dobrar o ferro em pás, convoque todas as consciências a se abrirem e a defenderem o frágil com a teimosia de quem sabe que o bem é moeda que não se desvaloriza. Cada minuto de atraso grava um novo nome no mármore.

Que esta página – despida de retórica, áspera de Evangelho – se torne um espelho: quem se olha nela decida se permanecer servo da violência ou se tornar servo dos seus irmãos. Deus do respiro negado, arranca a mesa aos senhores que vendem o mundo a golpes de cúpulas. Inverte as suas cartas de ferro: que o chumbo espalhado volte a ser torrão, que o balanço armado se torne berço. Oferece aos poderosos o espelho que não sabem quebrar: o rosto de uma criança sem noite, o tremor de um médico que ficou sem luz. Faz com que não consigam desviar o olhar até que o privilégio se transforme em vergonha e a vergonha em justiça. Lembre-nos de que a carne vale mais que o emblema, que quem lucra com o sangue cava a própria cova, que a aurora não pertence a quem tem canhões, mas a quem guarda um abraço. Silencie as sirenes, dobre as bandeiras inchadas de barulho e devolva-nos um silêncio capaz de fazer florescer o futuro.

sábado, 5 de julho de 2025

14ª domingo comum - TODOS SOMOS ENVIADOS PARA CUIDAR DE TODOS, E NÃO SÓ ALGUNS CONSAGRADOS!

Há uma produção descontrolada de violência contra gente indefesa, contra o ambiente, e contra o bom senso, mas são poucos os operadores de paz, de sabedoria e de diálogo. Há uma messe superabundante de alimentos, e armazéns abarrotados de mercadorias e de acumuladores prepotentes de lucro e de prestígio, mas são poucos os operários da justiça e da equidade. Carências antigas as nossas, já detectadas por Jesus de Nazaré, outrora, na sua terra. O Mestre, no entanto, - diferentemente de nós que deixamos a solução das nossas necessidades nas mãos de poucos iluminados e experts supostamente ungidos, - convida e envia a todos, 72 discípulos, ou seja, um número que coincide com a totalidade de povos conhecidos à sua época! Jesus deixa claro que a salvação real, histórica da humanidade não passa por algum poderoso ou por um consagrado messias, mas pela dedicação abnegada de todos em cuidar de todos. É urgente promover e aderir a um mutirão planetário de acolhida recíproca e de abertura ao outro, na simplicidade e na autenticidade, sarando feridas, oferecendo amparo e colo, derrubando preconceitos e expulsando os demônios do ódio, da intolerância e da truculência. 

sexta-feira, 4 de julho de 2025

Número de mortos em Gaza é 65% maior que oficial, diz estudo

Pesquisa independente estimou 75 mil mortes diretas pela guerra entre outubro de 2023 até janeiro de 2025, cerca de 30 mil a mais do que a contagem oficial do Ministério da Saúde de Gaza.Com a entrada de jornalistas na Faixa de Gaza severamente restrita pelos israelenses, a fonte de dados sobre o número de vítimas da guerra costuma ser o Ministério da Saúde local, controlado pelo Hamas – e Israel sempre rejeitou esses números, alegando que eles seriam exagerados.  

Agora, um estudo independente mostra que a contagem real de mortos é provavelmente ainda maior que os números oficiais. Uma pesquisa conduzida pelo economista Michael Spagat, do Royal Holloway College, da Universidade de Londres, estimou que, até o início de janeiro deste ano, mais de 80 mil palestinos haviam sido mortos na guerra de Israel em Gaza, 65% a mais do que os nomes que constam nas listas do Ministério da Saúde local. Para Spagat, especializado em guerras contemporâneas e na contagem de vítimas de conflitos, um dos aspectos importantes do seu trabalho é "lembrar-se de cada vítima". Que os nomes dos mortos estejam pelo menos escritos em listas, como o Ministério da Saúde de Gaza faz atualmente. Ele considera as listas oficiais "amplamente corretas" – mesmo que o ministério seja controlado pelo Hamas, classificado como uma organização terrorista pela União Europeia (UE), pelos Estados Unidos e outros países. "O Ministério da Saúde de Gaza lista os nomes dos mortos com seu número de identificação, idade e sexo. Isso pode ser facilmente verificado", afirma. (IHU)

Europa envia cães de ataque para Israel, que foram transformados em armas brutais contra civis: "Havia sangue por todo o chão"

Poucos segundos depois de os soldados entrarem na casa da família Hashash, no campo de refugiados de Balata, na Cisjordânia, os cães começaram o ataque. Certa manhã, em fevereiro de 2023, enquanto os militares invadiam seu bairro, Amani Hashash se lembra de ter entrado furtivamente em um quarto com seus quatro filhos. Ao ouvir os soldados israelenses entrando na casa, gritou para avisá-los de que eles estavam no quarto e não representavam nenhuma ameaça. A porta do quarto se abriu momentos depois, e um cachorro grande, sem focinheira, entrou correndo e investiu contra eles. Mordeu Ibrahim, de três anos, que dormia no colo da mãe. Hashash conta que fez o possível para afastar o animal, que sacudia e sacudia o menino, gritando e arrastando-o para fora do quarto. "Era o maior cachorro que eu já tinha visto", conta. "Ele não parava de morder meu filho e tentar empurrá-lo. Eu gritava e batia nele, mas ele continuava puxando-o". Ela conta que implorou aos soldados que parassem o animal, mas eles não conseguiram controlá-lo. Quando finalmente conseguiram levá-lo, Ibrahim estava inconsciente e sangrando profusamente. Os soldados injetaram sedativos nele e chamaram uma ambulância, que o levou ao hospital, onde foi submetido a uma cirurgia de emergência. "Quando vi seus ferimentos, fiquei angustiada, pois ele tinha muitos e profundos ferimentos", lembra Hashash. "Os médicos disseram que ele estava em estado crítico. Ele tinha um ferimento de seis centímetros e meio e outro de quatro centímetros. Eram tantos ferimentos que o cachorro não deixou nenhuma parte das costas de Ibrahim sem ser mordida", explica ela. O menino precisou de 42 pontos e 21 injeções para tratar uma infecção contraída das mordidas. Fotografias dos ferimentos sofridos no ataque, vistas pelo The Guardian e pela Arab Reporters for Investigative Journalism (ARIJ), mostram inúmeros ferimentos e marcas de mordidas.
As Forças de Defesa de Israel se recusaram a comentar o caso. O cão que atacou Ibrahim era provavelmente um pastor belga Malinois. Hashash identificou essa raça a partir de fotografias de diferentes variedades de cães usados ​​pelos militares. Originalmente usada para pastorear ovelhas, essa raça é agora amplamente utilizada pela Oketz, a unidade canina das Forças de Defesa de Israel. É altamente respeitada no país e muito temida nos territórios palestinos. Os comandantes da unidade Oketz explicaram no ano passado ao pesquisador americano de guerra urbana John Spencer, que participou de diversas operações com as IDF, que 99% dos aproximadamente 70 cães militares que o exército compra a cada ano vêm de empresas europeias, um número que as IDF não negou quando solicitadas a confirmar.