“Meu corpo estigmatizado pela dor, pelo cansaço e a saúde fragilizada. Mas, a boca conseguia balbuciar, mesmo assim, como um clamor, frases bíblicas que mais se assemelhavam minha realidade no momento: “Javé ouve minha prece, dá ouvidos às minhas súplicas!”. “O Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça”. A cruz pesa!“.”Jesus cai por terra! O Cirineu o ajuda”. “O samaritano recolhe o caído à beira da estrada”. “Vinde a mim todos que estão cansados e oprimidos que vos aliviarei”.
Esse é o trecho de uma carta-desabafo que recebi de uma amiga ao relatar a sua experiência de abandono, de exílio existencial e solidão durante as vicissitudes da vida pelas quais passou e que escolhi como abertura na reflexão sobre o evangelho hodierno. A minha amiga, como Jesus, não havia escolhido e nem desejado “fazer a experiência” da cruz e do abandono como formas de purificação ou de aproximação ao divino. Ela, como Jesus, havia escolhido de enfrentar a vida e seus desafios com coerência e fidelidade a um projeto que era maior que ela. Com certeza, havia intuído que ao tentar se manter fiel a valores e pessoas haveria de pagar pessoalmente com choro, perseguição, ameaças, abandono e, talvez, até com a própria vida.
O fato de “saber medir” as conseqüências de uma determinada escolha não significa “saber lidar ou eliminar”, automaticamente, as conseqüências ameaçadoras que advêm dela. O fato de “saber mergulhar” conscientemente nas conseqüências dolorosas de uma decisão/escolha de vida, sem recuar, sem se apavorar, sem se desesperar, não é enfrentamento fatalista, nem uma espécie de autoafirmação heróica do “super-homem” de Nietzsche que não foge perante o sofrimento, nem um “imperativo categórico” Kantiano, e sim, mera procura de honestidade consigo mesmo. Esta produz felicidade e paz interior. Vida readquirida e reconquistada. Algo que nenhum capital poderá comprar.
Jesus acabava de ser reconhecido por Pedro como “o messias”. O messias no imaginário judeu era o libertador glorioso, o vitorioso, o super-homem. Esta era a identidade que era atribuída àquele que era apontado como messias-ungido de Deus! Jesus, entretanto, havia construído para si uma identidade antagônica àquela elaborada por uma nação inteira. Jesus se encarava como um servidor e ainda por cima, sofredor. Não que Jesus fosse partidário e defensor de uma visão sacrifical segundo a qual, ao se sacrificar, iria salvar a humanidade. Ao contrário: Jesus gostava de viver e queria viver! Até no momento final Jesus suplicou o Pai para que lhe tirasse o cálice-perspectiva do martírio-morte. Jesus começou a construir a sua nova identidade de servo sofredor a partir de uma análise-avaliação realista, histórica, da sua prática-missão. Dos frutos que havia colhido até então, e das conseqüências que vinha assumindo e haveria de arcar para se manter fiel ao projeto de libertar pessoas escravas-dependentes. Libertá-las de seus complexos de culpas e de inferioridade. Das feridas de seus corpos, de seus fantasmas e medos interiores. Da corrupção e cooptação das hierarquias sacerdotais, do Sinédrio e dos representantes do império romano invasor.
Não a sua visão de adivinho divino, e sim a capacidade de ler a sua própria história, os sinais dos tempos, os meandros do ser e do poder humano-diabólico, permitiram que Jesus pudesse intuir que a sua missão teria um desfecho sangrento. Jesus podia ter recuado e esperado. Teria ganhado “a sua vida”, mas certamente teria perdido a sua guerra interior, a sua existência-ser-dignidade. A sua firme decisão de marchar a Jerusalém pode cheirar a “fanatismo” ou pode indicar um erro estratégico caso Ele imaginasse que acolá se manifestaria o Reino de Deus....
Jesus queria apontar coerentemente que a vida nova-salvação surge dos “servos derrotados e sofredores”, dos invisíveis da história. Daqueles que podem até “perder” a sua vida, - pois ela lhes é tirada pelas mãos dos “vencedores-super-homens” e carrascos orgulhosos que querem vencer sempre – mas conseguem, entretanto, dar-lhe pleno sentido. E isto lhes basta!
Esse é o trecho de uma carta-desabafo que recebi de uma amiga ao relatar a sua experiência de abandono, de exílio existencial e solidão durante as vicissitudes da vida pelas quais passou e que escolhi como abertura na reflexão sobre o evangelho hodierno. A minha amiga, como Jesus, não havia escolhido e nem desejado “fazer a experiência” da cruz e do abandono como formas de purificação ou de aproximação ao divino. Ela, como Jesus, havia escolhido de enfrentar a vida e seus desafios com coerência e fidelidade a um projeto que era maior que ela. Com certeza, havia intuído que ao tentar se manter fiel a valores e pessoas haveria de pagar pessoalmente com choro, perseguição, ameaças, abandono e, talvez, até com a própria vida.
O fato de “saber medir” as conseqüências de uma determinada escolha não significa “saber lidar ou eliminar”, automaticamente, as conseqüências ameaçadoras que advêm dela. O fato de “saber mergulhar” conscientemente nas conseqüências dolorosas de uma decisão/escolha de vida, sem recuar, sem se apavorar, sem se desesperar, não é enfrentamento fatalista, nem uma espécie de autoafirmação heróica do “super-homem” de Nietzsche que não foge perante o sofrimento, nem um “imperativo categórico” Kantiano, e sim, mera procura de honestidade consigo mesmo. Esta produz felicidade e paz interior. Vida readquirida e reconquistada. Algo que nenhum capital poderá comprar.
Jesus acabava de ser reconhecido por Pedro como “o messias”. O messias no imaginário judeu era o libertador glorioso, o vitorioso, o super-homem. Esta era a identidade que era atribuída àquele que era apontado como messias-ungido de Deus! Jesus, entretanto, havia construído para si uma identidade antagônica àquela elaborada por uma nação inteira. Jesus se encarava como um servidor e ainda por cima, sofredor. Não que Jesus fosse partidário e defensor de uma visão sacrifical segundo a qual, ao se sacrificar, iria salvar a humanidade. Ao contrário: Jesus gostava de viver e queria viver! Até no momento final Jesus suplicou o Pai para que lhe tirasse o cálice-perspectiva do martírio-morte. Jesus começou a construir a sua nova identidade de servo sofredor a partir de uma análise-avaliação realista, histórica, da sua prática-missão. Dos frutos que havia colhido até então, e das conseqüências que vinha assumindo e haveria de arcar para se manter fiel ao projeto de libertar pessoas escravas-dependentes. Libertá-las de seus complexos de culpas e de inferioridade. Das feridas de seus corpos, de seus fantasmas e medos interiores. Da corrupção e cooptação das hierarquias sacerdotais, do Sinédrio e dos representantes do império romano invasor.
Não a sua visão de adivinho divino, e sim a capacidade de ler a sua própria história, os sinais dos tempos, os meandros do ser e do poder humano-diabólico, permitiram que Jesus pudesse intuir que a sua missão teria um desfecho sangrento. Jesus podia ter recuado e esperado. Teria ganhado “a sua vida”, mas certamente teria perdido a sua guerra interior, a sua existência-ser-dignidade. A sua firme decisão de marchar a Jerusalém pode cheirar a “fanatismo” ou pode indicar um erro estratégico caso Ele imaginasse que acolá se manifestaria o Reino de Deus....
Jesus queria apontar coerentemente que a vida nova-salvação surge dos “servos derrotados e sofredores”, dos invisíveis da história. Daqueles que podem até “perder” a sua vida, - pois ela lhes é tirada pelas mãos dos “vencedores-super-homens” e carrascos orgulhosos que querem vencer sempre – mas conseguem, entretanto, dar-lhe pleno sentido. E isto lhes basta!