terça-feira, 24 de dezembro de 2019

Um Natal diferente: NADA DE VOTOS, DIGA E FAÇA PARA AMIGOS E 'INIMIGOS' O QUE O CORAÇÃO MANDA!

Será que temos ainda algo novo e original a dizer nesse Natal? Algo diferente daqueles votos estereotipados, convencionais, e repetitivos e, por cima, reencaminhados por terceiros? Uma mensagem de paz, de respeito, de justiça, ou um gesto de solidariedade, de comunhão, de generosidade que já não tenham sido apropriados por aqueles que vêm pregando sistematicamente a violência, o ódio, a eliminação e a intolerância contra os seus supostos rivais e inimigos?  Pessoas e grupos que, hipocritamente, nesse dia de luz se permitem arrotar palavras tenras e melífluas, desejando paz e amor a todos e, por cima, evocando o ‘Menino de Belém’. Aquele mesmo que era perseguido pelo ‘Herodes de turno’, respaldado e assessorado pelos inescrupulosos aproveitadores ‘homens do templo e das sagradas escrituras’.... Natal não pode ser um dia de trégua numa realidade social e política em que o nosso País está profundamente dividido. Chega de hipocrisia e falsidade! É urgente nesse Natal assumirmos e expressarmos o que realmente cremos. Desejar a amigos e inimigos o que o coração mandar, mas sem evocar o ‘menino Jesus’! É inaceitável que ao longo do ano inteiro se combata com agressões, preconceitos, intolerâncias, hostilidade, - ou com medidas provisórias e decretos, - os vizinhos, os cidadãos, os trabalhadores, as crianças, as mulheres, os idosos, os índios, os negros, os colegas de trabalho, os moradores de rua, os hospitalizados e, no Natal, veste-se a pele do cordeirinho manso, generoso e puro! 
Chegou a hora de vivermos um Natal de coerência interior, nem que seja somente nesse dia! Que tenhamos a coragem de dizer àqueles que consideramos amigos e irmãos de fé e de caminhada: vocês continuam sendo importantes para mim/nós, pois graças a vocês tenho força de enfrentar decepções e sofrimentos, necessidades e carências. Vocês me ajudam a RENASCER toda vez que experimento a tentação do ‘não sentido, da morte interior, do desespero, da desmotivação, do desânimo. VOCÊS SÃO UM NATAL PARA MIM’! 
Que tenhamos também a coragem de dizer àqueles que não consideramos irmãos nem de fé e nem de caminhada, e que achamos que não se comportam como irmãos humanos, pois continuam a semear ódio, morte, mentiras, corrupção, esperteza, violência e desagregação: ‘meus prezados chegou a hora nos olharmos com outros olhos e nos tratar de forma mais humana, pois a nossa vida biológica é breve. Aproveitem esse Natal não para lançar mais ‘fake news’ de esperança e paz, de harmonia e luz, mas comecem a viver o que pregam somente nesse dia de Natal! Contem com a minha-nossa colaboração. Queremos que façam a experiência real de RENASCER! Juntos, tomemos consciência que precisamos caminhar mais para que vocês sintam quanto dói a ofensa, o chicote moralista, a perseguição e a calúnia, a tortura e a bala, a fome e a ferida jamais tratada’
Nesse Natal sejamos originais, uma vez na vida. Nada de votos, e sim, esforço sincero para vivenciar sistemática e permanentemente a verdadeira mensagem que brota da manjedoura de Belém: a PAZ é fruto da luta firme de homens e mulheres de boa vontade que sabem construir justiça e direito para todos! 

quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

Violência contra os indígenas do Maranhão, e a justiça infame. Uma reflexão inadiável

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Mal baixou a poeira do trágico assassinato que ceifou a vida de três indígenas na Terra Indígena Canabrava, sábado 07, que o Juiz de Barra do Corda, Sr. Quiroga Filho, informou, no dia 11 de dezembro, que irá levar a júri popular três índios Guajajara da mesma Terra Indígena supostamente envolvidos numa tentativa de homicídio de um delegado de Grajaú. Há cerca de dez anos atrás, o policial quis forçar a passagem por uma barreira erigida pelos índios na BR 226. Mesmo alertado para respeitar a decisão indígena, o delegado reagiu extraindo o revólver, dando alguns tiros intimidadores, e provocando a ira dos índios presentes que reagiram à sua agressão ferindo-o, levemente, na mão. Foi o suficiente para o juiz considerar os índios potenciais assassinos!
 O Senhor Quiroga Filho é o mesmo juiz que condenou em março deste ano três indígenas acusados de ter assassinado em 1999 dois comerciantes de Barra do Corda que, lastimavelmente, transitavam pela BR 226 logo após o atropelamento de um filho do cacique Moisés Guajajara. À época, um grupo de mais de 40 pessoas revoltadas com mais uma morte trágica, dominados pela comoção e sob uma forte emoção, acabaram ‘vingando a morte do parente’ nos primeiros transeuntes brancos que apareceram naquele momento. A Funai, para aplacar os ânimos dos regionais que ameaçavam invadir as aldeias, apresentou à justiça três jovens Guajajara, - alguns de menor idade, - que passaram longos sete anos na 9ª Delegacia de São Luís, à espera de um julgamento que veio, de forma viciada, 20 anos mais tarde. Mais uma vez, os crimes cometidos por indígenas nunca prescrevem!  Com eles a ‘justiça demora, mas não falha’!
No dia 13 de dezembro foi veiculada e confirmada a notícia de que mais um indígena Guajajara foi encontrado esquartejado juntamente com outra pessoa não indígena, dentro da T.I. Arariboia. A vingança parece ter sido o movente mais plausível. 
E, finalmente, no mesmo dia veio a confirmação da chegada à Barra do Corda da Força Nacional de Segurança Pública encaminhada pelo atual ministro da justiça, Sérgio Moro, no intuito de repor a ordem e a segurança naquela conflituosa região. 
Há, nesse complexo tabuleiro, peças que exigem uma análise mínima, aprofundada, pois há, de sobra, inúmeras e trágicas tendências e coincidências.

Dois mundos, duas culturas, duas identidades
No imaginário comum majoritário, seja ele o regional/popular, bem como o institucional/burocrático, os índios Guajajara estariam perfeitamente ‘integrados’ ou, como outros afirmam, ‘aculturados’, ou seja, destituídos da sua cultura originária, específica. Os índios, hoje, seriam perfeitamente conscientes de seus deveres e direitos para com a sociedade e o estado. Logo, nessa lógica de pensamento, os índios são plenamente responsáveis de todos os seus atos. Aceita-se, ainda, o cômodo equívoco segundo o qual o fato de os índios possuírem tecnologia, e usarem bens de consumo típicos da sociedade não indígena, estariam assumindo, simultaneamente, também seus modelos culturais. O fato de um indígena, por exemplo, saber falar razoavelmente bem o português e manipular com destreza um celular não significa, no entanto, que ele tenha deletado, automaticamente, as suas categorias de compreensão e de interpretação do universo adquiridas em seus processos de socialização na sua aldeia. É muito comum ouvir expressões tais como ‘eles, os índios Guajajara, são iguais a nós’, para significar que ‘eles perderam a sua cultura’! Portanto, ‘chega de considerá-los diferentes e coitadinhos. Eles sabem muito bem o que fazem! ’, e assim por diante. Em tudo isso há um claro propósito de ignorar a existência de diferentes e distintos níveis de compreensão de mundo entre os próprios índios Guajajara. Muitos não indígenas não conseguem entender que ao lado de setores indígenas profundamente conhecedores da complexidade da realidade social, cultural e política, regional ou nacional, existem outros setores do mesmo povo que mal falam a ‘língua oficial’ e que possuem formas de compreensão limitadas à sua realidade local, e que mantêm relações esporádicas com a sociedade do seu entorno. Longe de transformar todos os índios, indistintamente, em meras vítimas ‘relativamente capazes’, tolhendo-lhes responsabilidade e autonomia decisória, é inegável que não se podem jamais ignorar os distintos níveis de compreensão, de conhecimento e de responsabilidade (penal, inclusive) existentes, hoje, no complexo e amplo mundo dos Guajajara. 
Não se pode desconhecer que o povo Guajajara, na sua vasta pluralidade cultural, vem vivenciando o que poderíamos definir como uma espécie de ‘mutação identitária’! No intricado jogo de aceitação e de desconfiança, de disputas e de colaboração, de agressão e de tolerância com seus vizinhos, os Guajajara vêm sendo obrigados a reformular permanentemente o seu ‘Ser Guajajara’ tendo em vista a sua sobrevivência física e étnico-cultural. Diante das mudanças rápidas e radicais da sociedade em geral, os Guajajara tiveram que acelerar e reformular também o seu ‘ritmo cultural’. De um lado, evitando a sua incorporação pura e simples ao ‘ser não indígena’ e, do outro, procurando manter ainda em suas mãos, de forma razoavelmente autônoma, as rédeas do jogo da ’convivência social’. Ou seja, continuar a ser Guajajara de forma diferente, mas sem assumir o ‘ser do outro’. Aceitar, conviver e colaborar com o ‘SER Karaiw/branco’ sem abrir mão do seu ‘SER Guajajara’. Como diria o grande bispo católico Dom Hélder Câmara ‘Mudar, sempre, para continuar a ser o mesmo’! 

A sociedade etnofóbica da ‘tolerância zero’!
Sem querer mistificar um passado recente, observa-se, contudo, que uma década atrás havia, ainda, entre os não-indígenas, pessoas que reivindicavam com certo orgulho uma indefinida ascendência indígena. Parecia haver um esforço sincero em reconhecer a normal existência e aceitação das diferenças culturais. Muitos ‘Karaiw’ entendiam que também entre os indígenas coexistiam, misturadas, contradições e formas de colaboração/solidariedade, como ocorre em qualquer sociedade. Ao contrário, hoje em dia, tem-se a impressão que vem prevalecendo um desavergonhado julgamento popular, quase consensual, de condenar, sumariamente, tudo o que procede do universo indígena. O cometimento de ilícitos por parte de ‘alguns índios’, se transforma para o conjunto da sociedade num ‘ilícito coletivo’, de todos os indígenas, indiscriminadamente! É como se os índios não poderiam jamais cometer um crime, mas somente ser vítimas! É como se os indígenas, - idealizados por desconhecimento e ignorância, - fossem ainda os últimos representantes da pureza e da convivência harmoniosa que os não indígenas já não conseguem mais produzir. Ao não corresponderem, parcialmente, a essas formas de mistificação, os indígenas parecem ter destruído definitivamente aquele ‘paraíso terrestre’ que os não indígenas haviam projetado, e onde eles mesmos se sentiam ainda contemplados e acolhidos. A raiva da decepção e da desilusão justifica qualquer tipo de ação repressiva, policial ou não. E libera o ‘EU censor e moralista’, para praticar todo tipo de agressão e insulto, desprezo e humilhação moral contra aqueles dos quais se esperava só coisa boa, mas que não corresponderam! E se, além disso, existe uma fonte inspiradora de cunho negativo para tais ações anti-indígenas, - que tem sua origem na própria presidência da República, - então, todos os regionais podem se sentir investidos de uma espécie de mandato legítimo para atentar à integridade física e moral de qualquer indígena que aparecer no caminho! Estariam, afinal, cumprindo com o seu dever cívico de colaborar com o chefe supremo da nação!

Justiça infame: aos amigos os favores da lei; aos ‘índios’ os rigores da lei!
Um outro elemento que salta aos olhos em todos esses acontecimentos é que a justiça formal, aquela que é ‘tramada’ nos fóruns, delegacias, gabinetes e varas, utiliza como metodologia sistemática a dos ‘dois pesos, duas medidas’, a segunda do freguês que é indagado e processado. Se é verdade que esta parece ser, talvez, uma tendência generalizada no nosso País quando se trata de ‘pobre, preto, puta e... periférico’, no entanto, no caso em que o suspeito ou o réu é um indígena, sabe-se, de antemão, que a sua condenação é certa. Na onda do ‘punitivismo e do subjetivismo judicial’ que assola amplos setores da atual ‘Justiça’ do nosso País, Juízes e Promotores, disputam entre si ‘a pena exemplar’ a ser infringida ao réu indígena. E quase sempre é acolhida com aplausos por uma imensa plateia sempre mais ávida de castigos, não de ‘restauração humana’! 
Levar, por exemplo, a júri popular um caso que envolve indígenas na região de Grajaú-Barra do Corda, - em cujos bancos (do júri) jamais sentará um representante indígena, - é condenação certa, considerados os sentimentos de ódio e de intolerância existentes contra os vizinhos indígenas. Ou, julgar, com os olhos e os condicionamentos de hoje, - após 20 anos do cometimento de um crime, - a responsabilidade penal dos envolvidos indígenas, soa a má fé. Não somente porque o crime deveria estar prescrito, ou porque os réus ficaram a esperar ‘injusta e provisoriamente’, na cadeia, por longos sete anos um julgamento imparcial, mas também porque nunca lhes foram oferecidas as condições ‘diferenciadas’ mínimas de defesa. De fato, nem juiz e nem promotores em momento algum consideraram as evidentes dificuldades de compreensão linguística e cultural, disponibilizando, por exemplo, um tradutor ou um antropólogo. Nada de específico e diferenciado para os indígenas que, ironicamente, são considerados ‘iguais a nós’ (a nós, quem, afinal?) na hora de serem punidos pelos ‘karaiw/brancos’! Ficaremos aguardando, contudo, que essa mesma ‘Justiça’ seja célere e eficiente em identificar e capturar os assassinos dos três indígenas assassinados no dia 07, entre El Betel e Boa Vista, do adolescente indígena esquartejado no dia 12 do mesmo mês na T.I. Arariboia, e de muitos outros homicídios e atropelamentos fatais de Guajajara, jamais investigados, e julgá-los com a mesma ‘imparcialidade’ que os ‘três réus indígenas’ atualmente aprisionados em Barra do Corda!

O tempo acabou! ‘Chega de diálogo e de negociação com índios’!
Um último elemento a ser considerado nessa análise despretensiosa nos é ditado pelo ‘modus operandi’ daquelas instituições federais ou estaduais, (PF, Polícia Civil, Secretarias, Varas, Eletronorte, etc.) que lidam direta ou indiretamente com os indígenas, os Guajajara da BR 226, especificamente. Parece existir, - embora com as devidas exceções, - uma tácita compreensão de que o diálogo, a negociação paciente, o ‘antropologicamente correto’, as audiências públicas, o respeito das competências formais em Terras Indígenas, os TACs, etc. se esgotaram de vez. Tem-se a impressão que segundo esse conjunto de instituições chegou a hora de começar a tratar os índios sem lhes conceder ‘privilégios e atenuantes’ de qualquer gênero. Como se, até agora, elas tivessem praticado rigorosamente tudo isso! Nesse momento atual não sentem nenhuma pressão social para inibir ou censurar seus abusos. Os povos indígenas, hoje como no passado, continuam sendo considerados um ‘estorvo ao progresso do País’. Eles e seus imensos territórios mal aproveitados estariam atrasando o pleno desabrochar do gigante que se autodefine produtivo, ordeiro, democrático. Para os senhores do desenvolvimento a qualquer preço é inaceitável tolerar qualquer tipo de ‘baderna, onda, mobilização, barreira, vigilância, vandalismo’ indígena à implantação escancarada de um modelo econômico e cultural que é patentemente espoliador. 
Poucos setores da sociedade percebem que, hoje em dia, a única forma que os povos indígenas possuem para serem vistos, ouvidos e respeitados continuam sendo aquelas formas de resistência ativa consideradas ‘ilegais’ pelo estado e seus asseclas. Acabou a comoção nacional quando um índio é assassinado. E não são mais objeto de solidariedade e de atenção pela imprensa subserviente suas ‘insignificantes’ reivindicações por água potável, educação diferenciada, assistência médica respeitosa, estradas de acesso, terra livre, etc. Poucos enxergam nas cegas omissões, nas reiteradas negligências e nas criminosas cumplicidades do estado e de várias instituições, com relação aos povos indígenas, verdadeiros atos ilegais a serem coibidos e punidos. Nesse momento alucinante da nossa história é como se o estado fosse incapaz de cometer ilícitos, ou como se ele tivesse em mãos um amplo e permanente mandado de ‘excludente de ilícito’ para aprontar impunemente contra os povos indígenas e tantos outros grupos sociais.  Muitos indígenas se distanciam de ‘um conjunto de leis, decretos, portarias, liminares, PECs, etc.’ pregados por um estado que os excluiu sempre mais, e que os indígenas não o reconhecem como parceiro. Por causa disso, os povos indígenas no Brasil acabam assumindo aos olhos de tantos hipócritas institucionalizados uma aparente ‘ilegalidade’. Contudo, mediante suas ‘legítimas mobilizações’, eles desmascaram e responsabilizam, diretamente, um estado cada vez mais agressor e que age impunemente. E o destituem  de sua pretensa ‘legalidade e legitimidade’. Em outras palavras, o estado, hoje, no que diz respeito à sua relação com os povos indígenas, é o verdadeiro criminoso a ser combatido e detido! 

Existem, de fato, inúmeras provas em que o estado, ao longo desses 4 anos, através de suas políticas e polícias, - sob o pretexto de combater o ilícito indígena, -‘têm invadido’ a alma e o território dos Guajajara. Tem violado, sem mandado judicial, os domicílios indígenas, ameaçando e agredindo pais de família, destruindo e roubando objetos e bens pessoais, e prendendo como reféns pessoas inocentes e torturando-os para que entregassem ‘os supostos culpados’. No caso específico do trecho indígena na BR 226, altamente conflituoso, se de um lado é inegável uma participação indígena no cometimento de ilícitos, do outro lado é indiscutível a proteção e o suporte que é fornecido por grupos externos. Pessoas poderosas que vivem no entorno e que jamais são investigadas e questionadas pela Polícia Civil e/ou Federal, ou pela própria Promotoria Regional. É mais fácil prender o ‘peixe pequeno e mais frágil’ e, sob o pretexto de garantir paz e segurança ‘aos cidadãos de bem’, cometer abusos de todo tipo contra ele. Se houvesse, de fato, por parte do estado, o real interesse em debelar a praga dos assaltos e de outros ilícitos, começar-se-ia a investir na ‘inteligência’ e em políticas públicas específicas. Algo que não interessa ao estado-cúmplice!
O recente envio da Força Nacional de Segurança Pública à Terra Indígena Canabrava, além de se constituir numa ‘ilegalidade’, - pois em momento algum as comunidades indígenas afetadas foram consultadas sobre a sua necessidade e/ou conveniência, - irá impactar, mais uma vez, negativamente, o cotidiano das comunidades. E, dessa forma, adiar-se-á, mais uma vez, uma solução definitiva para os conflitos existentes. Algo que jamais virá mediante a intervenção de um grupo militar armado, e despreparado para lidar com indígenas. Infelizmente, no atual momento histórico, tudo parece encontrar solução na bala, no grito, na farda, na porrada e na prisão. Silenciados estão, contudo, os gritos e as dores de centenas de aldeias das Terras Indígenas desse Estado, e de tantas outras que abrigam milhares de indígenas sedentos de paz, de harmonia, de convivência fraterna, e de respeito. 

São Luís,18 dezembro, 2019

Claudio Bombieri – Comboniano e presidente da Associação Carlo Ubbiali

sábado, 14 de dezembro de 2019

3º Domingo de Advento - Não um 'messias' poderoso, mas um povo de messias servidores e libertadores! (Mt.11, 2-11)

Quando numa sociedade aumentam os níveis de decepção e de sentimentos de fracasso, em geral, aparece com mais vigor, a íntima expectativa de um ‘salvador da pátria’! Um messias onipotente que, com braço forte e língua afiada, transmita aos decepcionados e aos desanimados impotentes a sensação de segurança e de superação de seus problemas e dramas sociais. Esta parece ser uma constante na história da humanidade em quase todas as culturas. Em geral, reflete a postura de um povo que perdeu as esperanças em si mesmo. Que se acha incapaz de enfrentar com sucesso os desafios que vem experimentando. Que delega para uma espécie de super-homem ideal e externo a si próprio o que ele mesmo deveria e poderia fazer. Esta era a situação percebida por vários setores da sociedade judaica na época de Jesus de Nazaré. João Batista era a expressão mais evidente de tudo isso. Ele imaginava o ‘salvador da pátria’ como uma espécie de ‘purificador social’. Com métodos fortes, de forma autoritária, sem muita conversa, e sem exigir colaboração e ajuda de ninguém, o ‘messias’ de João viria para atender às expectativas de um povo que havia deixado de acreditar em si próprio. Do mesmo jeito que ocorre hoje em dia no nosso país. João fica decepcionado com Jesus porque o Mestre da Galileia parece não corresponder a suas específicas expectativas e cobra dele um esclarecimento urgente e definitivo. Afinal, Jesus aparecia como o anti-messias. Ele ‘perdia’ tempo com doentes e mendigos, com mulheres e crianças, se preocupava até com aqueles ‘impostores’ que, ao contrário, deviam ser eliminados, 
Com razão, João pede a Jesus que esclareça essa sua postura que vai na contramão de tudo o que ele tinha aprendido e pregado. E Jesus, mais uma vez, decepciona João Batista. Não responde à sua pergunta se, de fato, era ele próprio o messias ou devia esperar outro. Jesus desloca radicalmente a questão e mostra a João e a todos aqueles que como ele acreditavam num salvador da pátria forte e poderoso qual é a missão de Jesus e de todos os que acreditam nele e na sua metodologia. Jesus lista seis ações, -  como seis foram os dias da criação, - em que ‘as pessoas’ se transformam e se recriam. Ações em que não um salvador da pátria realiza prodígios, mas onde as pessoas, de forma prodigiosa, começam a enxergar, a ouvir, a caminhar, a dialogar, a renascer. E onde em  lugar da 'vingança de Deus 'o ‘alegre anúncio’ de uma vida nova é dirigido aos pobres, e não aos poderosos de sempre. Messias são todos aqueles que aprendem a acreditar e a caminhar com outros irmãos que fazem a experiência das suas mesmas fragilidades e qualidades, que começam a enxergar o poder que têm dentro de si, que não se deixam vencer pelo desânimo e pela decepção, e nem pelo aparente fracasso. E que descobrem que cabe a eles mesmos, os pobres, a missão de mobilizar outros pobres para que juntos, como uma ‘nação de messias’, possam ser ‘alegre anúncio e salvação’ para todos, e não para alguns eleitos. Que ninguém renegue o ‘messias’ que tem no seu coração, na sua mente, na sua alma, nos seus braços, nas suas pernas! Para que sejamos um povo de messias  humildes,servidores....libertadores dos 'falsos Messias...'!

sábado, 7 de dezembro de 2019

Dois caciques pais de família Guajajara são covardemente assassinados e outros dois feridos na Terra Indígena Canabrava, Maranhão


Uma chacina ensanguentou o asfalto da BR 226 numa aparente pacata manhã desse sábado, 7 de dezembro, entre as aldeias El Betel e Boa Vista, na Terra Indígena Canabrava, no eixo Grajaú-Barra do Corda, Maranhão. Não foi atropelamento, - algo que ninguém divulga, - e nem o trágico resultado de um dos famigerados assaltos que ocorrem na região. As vítimas foram, mais uma vez, dois pais de família Guajajara que habitam as numerosas aldeias que margeiam a estrada. O balanço atual (às 16.00 horas da tarde de sábado) é de dois mortos e de pelo menos 02 feridos. Várias fontes indígenas locais convergem em seus relatos. Segundo eles um carro branco teria passado atirando pela BR 226, logo após uma grande reunião na aldeia Coquinho, - que contou com a presença de muitos caciques para debater questões relacionadas aos impactos produzidos pela Eletronorte na terra Indígena Canabrava. Na breve ladeira que leva à aldeia El Betel um número não identificado de pessoas de dentro de um carro branco começou a atirar nos índios que transitavam à beira da estrada. Foi morto, no instante, um cacique que vinha na moto, e ferido outro que vinha junto na garupa. Mais adiante, nas proximidades da aldeia Boa Vista foram desferidos mais tiros ferindo vários indígenas. Segundo Genildo Guajajara, um dos feridos, morador da aldeia Filipe Bone, veio a falecer um pouco mais tarde e outro em situação grave. O fato produziu uma forte revolta nos demais indígenas que fecharam imediatamente a BR 226 com troncos e pedras. Um ônibus que vinha transitando na BR ao ver a tentativa dos índios de bloquear a estrada, e ignorando o que havia acontecido, acelerou, temendo que fosse um assalto. Em resposta os manifestantes apedrejaram o ônibus, mas sem ferir nenhum passageiro.
Segundo o cacique Genildo Guajajara, embora seja cedo para identificar os motivos reais de tal ataque, considera que os criminosos, ao agirem dessa forma covarde, se sentiram inspirados e, de alguma forma, amparados pela postura anti-indígena do atual presidente da República. “Sempre tive em alta consideração o exército brasileiro. Alimento uma profunda admiração por tudo o que o marechal Rondon fez pelos índios do Brasil. Agora, irônica e tragicamente, o mesmo exército produz em suas fileiras um grande inimigo que odeia e detesta índios. Muitos criminosos e racistas se acham no direito de fazer aquilo que o primeiro mandatário faria nas mesmas circunstâncias!’ Caciques indígenas informam que amanhã, domingo 8, uma comissão estadual de Direitos Humanos estará se deslocando até a BR 226 para tentar ‘apaziguar os ânimos’. Que não seja mais uma embromação para adiar uma inadiável e competente investigação, e capturar os responsáveis dos homicídios desse sábado, e levá-los ao banco dos réus. Afinal, na vizinha Barra do Corda, três índios Guajajara estão cumprindo uma pena de 47 anos por um homicídio ocorrido 20 anos atrás na mesma BR 222, mesmo após ter cumprido 07 (sete) anos na nona delegacia de São Luís, aguardando um julgamento que só aconteceu em março desse ano. ‘Para os inimigos só os rigores da lei,’ para uma ‘justiça’ que vem tirando sistematicamente a venda da imparcialidade. A situação na BR 226 é de profunda indignação e de imprevisível desfecho.  


Festa da Imaculada Conceição – Todos nascem na Graça e pela Graça, e não no pecado!


Todo filho de Deus nasce sem mácula. Sem pecado original algum! É concebido ‘de forma imaculada’!Todo homem e toda mulher é gerado pela Graça, e herda, ao nascer, só a Graça e o Amor do Pai/Mãe, Senhor da vida. Maria, na qualidade de filha de Deus, - e não por ser a mãe biológica de Jesus, - foi gerada e nasceu na Graça e pela Graça. Da mesma forma que um bebê desse planeta amado e moldado pelo Pai/Mãe! Por que Deus deveria ‘poupar’ só Maria de ser concebida sem mancha se para Deus toda vida é fruto do seu ‘sopro criativo amoroso’? E não como resultado de um pecado original que jamais chega a ser mais forte e mais determinante que o Amor e a Graça de Deus! Maria nasceu, - igual a cada um de nós, - embalada no imenso carinho e no puro afeto divino. Por que celebrar, então, a Imaculada Conceição de Maria? Justamente para lembrar para os seres humanos, homem e mulher, que mesmo condicionados pelas fragilidades e pelas maldades, podemos produzir dentro de nós e para o mundo a Graça e o Amor nos quais fomos gerados. Dito com outras palavras: descobrir dentro de nós o ‘amor originário’ – e não um suposto ‘pecado original’. E, a partir dessa consciência, transformar pela graça e pelo amor uma realidade que, aparentemente, se deixou imbuir desde o começo pela força brutal do ódio, da violência, da indiferença, do egoísmo. Que nunca esqueçamos o amor originário do Pai/Mãe no qual fomos gerados, mesmo quando fazemos a experiência do nosso pecado!