Continuamos mergulhados, e somos ainda muito condicionados pela cultura do formalismo. Ou seja, de olhar as aparências e descuidar da essência, do ser. Preocupamo-nos com o vestir de acordo com a etiqueta, de falar com moderação, sem exaltação, de ter movimentos calculados e pausados, de ter uma ‘aparência física prazerosa’, de cumprir rigorosamente certas normas de convivência social, de observar tradições religiosas mesmo que obsoletas, etc. Quando falamos em formalismo nos vem espontâneo relacioná-lo a uma certa hipocrisia. Uma falsidade de comportamento, ou seja, a pessoa diz: ”Eu por formação não sou formalista e nem legalista, mas tenho que me comportar assim, porque a sociedade exige, a igreja pede, a empresa obriga, etc...’ Deixamos, assim, de sermos radicalmente autênticos. Tememos intimamente o julgamento e a condenação da sociedade e acabamos nos submetendo a ela. Fazemos violência ao nosso ser mais profundo. Perdemos a oportunidade de ‘quebrar’ com certas normas e tradições arcaicas para que a autenticidade, a coerência de vida, e os verdadeiros valores que contam possam emergir definitivamente.
Jesus se encontrou no mesmo dilema. De um lado sentia a pressão dos especialistas das leis e dos preceitos religiosos que exigiam obediência cega. E, do outro, aparecia um sentimento interior de que tudo aquilo era uma forma para esconder a falta de amor e de piedade. Jesus percebia que se usava a tradição religiosa e as normas para esconder as próprias hipocrisias. E para continuar a dominar e a controlar as débeis consciências das pessoas que temiam castigos divinos e condenações humanas. Jesus, a bem da verdade, não queria implodir todo tipo de lei ou norma, só por ser tal, só porque era lei ou norma, mas queria que as pessoas em geral e os próprios especialistas compreendessem que se as normas não levam à prática do amor a Deus e ao próximo, à conversão, à misericórdia, à justiça, em nada servem! É como se ele dissesse: “ Normas e leis, pode até ser, mas o que vem em primeiro lugar é tirar de dentro de nós e do nosso meio a inveja, o ódio, o rancor, a calúnia, o espírito de vingança, as ciumeiras, pois são obstáculos fatais à compaixão, à capacidade de servir e de acolher, de perdoar, de dialogar e construir junto com os outros”. Afinal, são ‘esses mandamentos’ que contam na vida! Querendo ou não, nós cristãos somos ainda herdeiros da prática farisaica. Obedecer ,ou fingir que estamos obedecendo às pequenas normas, às tradições inventadas ‘por quem sabe lá quem’, parece que nos dá mais segurança. Parece até que somos mais aceitos pelas pessoas que nos vêem, mesmo que seja só fachada. Chegou a hora de reafirmar, como Jesus, que a coerência e autenticidade de vida deve prevalecer sobre a hipocrisia, a falsidade, o legalismo tapado e o fingimento.