segunda-feira, 31 de maio de 2021

Tem gente morrendo de Covid, tem gente morrendo por bala, tem gente morrendo de solidão, tem gente morrendo de fome; mas morre-se mesmo é de desgoverno

 “Todas as semanas, atendo mais ou menos cinco pacientes dizendo que estão doentes, mas, quando examinamos, notamos que, na verdade, não é doença, é fome”, disse médica que trabalha em uma unidade de saúde de Sobradinho, cidade-satélite do Distrito Federal. “Em 15 anos de profissão, nunca imaginei que ouviria relatos como os que tenho ouvido ultimamente. Ainda mais em uma cidade tão rica”, completa a profissional, em entrevista para reportagem de El País.

Os profissionais ouvidos constatam que os pacientes estão doentes de fome e o único remédio para isso é comida. Mas, como pudemos demonstrar em trabalho realizado pela FIAN Brasil (Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas) e pelo Grupo de Pesquisa O Direito Achado na Rua, conforme o livro recentemente lançado O Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas: Enunciados Jurídicos (Brasília, 1ª edição, 2020), essa situação é resultado do empobrecimento da população brasileira, com o desemprego alcançando a cifra 14,5% em 2021. Em 2020, o país ficou na 22ª colocação, devendo alcançar a 14ª maior taxa de desemprego do mundo em 2021, conforme levantamento da Austin Rating, a partir das projeções do último relatório do FMI. Desemprego e fome. O número de pessoas com insegurança alimentar grave ou moderada, 27,7% da população está neste grupo. Significa dizer que cerca de 58 milhões de brasileiros correm o risco de deixar de comer por não terem dinheiro. Os atendentes da área de saúde ouvidos na entrevista do El País, lançam o diagnóstico: fome e crise de ansiedade. O nervosismo ocorre principalmente por não saber como proporcionar uma vida digna à família.

Por isso a FIAN BRASIL pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para ingressar como amicus curiae na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 831, exatamente para obrigar o governo federal a investir em medidas de combate à fome no contexto da pandemia de Covid-19. Mas o vírus capitalista do cansaço incessante, diz em artigo o filósofo e ensaísta Byung-Chul, autor, entre outras obras, de Sociedade do Cansaço, fará que “Em breve teremos vacinas suficientes para vencer o vírus. Mas não haverá vacinas contra a pandemia da depressão”.

Contudo, morre-se, principalmente de desgoverno. Ou seja, pela incapacidade civil de o presidente Bolsonaro exercer o cargo e as funções atinentes à Presidência da República, com seu consequente afastamento desse exercício, numa atuação destrutiva que provoca a situação de risco e insegurança a que expõe o povo brasileiro e provocando uma letalidade que ultrapassa em linha ascendente um total superior a 450 mil mortes de pacientes por Covid-19. (Fonte: IHU)

O paradoxo “verde”: mais energias renováveis significa mais mineração

Os governos em todo o mundo estão empenhados em estabelecer metas para transformar suas economias de modo que não contribuam mais para os gases responsáveis pelo aquecimento da atmosfera ou, mais corretamente, tenham uma contribuição líquida zero. Isso significará eliminar gradualmente o motor de combustão interna e aumentar drasticamente as tecnologias de energia renovável, como a eólica e a solar. No entanto, enfrentar o desafio da “economia verde” hoje significa pressionar o acelerador sobre a atividade de mineração. Mesmo que apenas a curto prazo, as taxas de extração deveriam aumentar, embora os cientistas garantam que com o tempo a reciclagem em grande escala deveria ser capaz de atender à demanda por matérias-primas essenciais, como o lítio. No momento, os metais e minerais são muitas vezes comprados em países que não são os principais consumidores dessas matérias-primas. Dois terços da produção anual total de grafite do mundo vêm de minas na China. Uma proporção semelhante do cobalto mundial vem da República Democrática do Congo. 

As novas iniciativas de mineração muitas vezes recebidas com resistência devido aos impactos negativos que podem ter sobre o meio ambiente e a saúde. Atividades como a construção de painéis solares também levantaram sérios problemas porque foram associadas a abusos de trabalho, como é o caso dos uigures na China. Mas Herrington e sua equipe acreditam que um debate urgente precisa ser iniciado sobre onde e como essa inevitável nova atividade de mineração será praticada. "Não acredito que o público compreenda todas as implicações da revolução verde ainda", disse o responsável pelo departamento de Ciências da Terra do Museu de História Natural de Londres à BBC. "Provavelmente estamos falando apenas de um pico de curto prazo na mineração, mas temos que trabalhar rápido, porque sabemos que se não reduzirmos os níveis de dióxido de carbono agora, isso será um problema no futuro." (Fonte;IHU)


domingo, 30 de maio de 2021

Santíssima Trindade - A missão trinitária de libertar/salvar gente dos falsos deuses da violência e do ódio!

O que está em jogo na solenidade da Santíssima Trindade é a identidade do Deus em que nós afirmamos crer! Que Deus é esse? Será que é o mesmo que é invocado por aqueles que perseguem, torturam, humilham, escravizam, matam? Não é suficiente, portanto, dizer que 'eu crio em Deus', mas é preciso se perguntar em qual Deus 'você crê'. O Deus de Jesus, por exemplo, não era, certamente, o mesmo 'deus' que era invocado pelos sacerdotes do templo, e nem por Herodes ou Pilatos. O de Jesus era um Deus de compaixão e de misericórdia, já o Deus invocado pelos sacerdotes do templo e pelos governantes em seus palácios, era o Deus da glória, do poder, da lei, da punição e do castigo.

O evangelista Mateus ao longo de todo o seu evangelho quer deixar claro que Jesus é o ‘Emanuel’, ou seja, O DEUS CONOSCO. Quem vê Jesus, vê o Pai. O Deus de Jesus, se pudesse ser visto, Ele agiria como Jesus agiu: acolhendo, curando, perdoando, sendo compassivo e amoroso. Para Mateus, Deus não deve ser mais ‘procurado, buscado’, pois Ele já se tornou concreto e visível na pessoa de Jesus. Se Deus, então, já está conosco, só nos cabe acolhê-lo, e não buscá-lo! Temos, portanto, que agir como Deus-Pai agiria, e Jesus nos mostrou o modo certo! Já no capítulo 18 de Mateus Jesus afirma que ‘onde dois ou mais estão reunidos em meu nome EU ESTAREI NO MEIO DELES’ e no evangelho de hoje reafirma aos seus seguidores que ‘EU ESTAREI COM VOCÊS TODOS OS DIAS....’ Ou seja, Jesus não foi embora. Jesus não vive nas nuvens ou nos altos céus. E nem vai voltar porque Jesus está definitivamente CONOSCO. É o Emanuel, o 'Deus que está permanentemente presente' na sua igreja e que continua a inspirar gestos de serviço e de amor ilimitado. 

Nesse sentido o evangelho de hoje nos dá algumas dicas claras do que significa ‘batizar todas as pessoas no nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo’. Aqui não se trata de dica litúrgica, ligada ao sacramento do batismo, de como batizar corretamente. Não se trata, tampouco, de doutrina. As palavras finais de Jesus são uma ordem, um imperativo aos seus seguidores para que todas as pessoas, povos, ‘mergulhem’ (batismo era mergulho nas águas) na experiência de ser amado e acolhido por um Deus Gerador de vida, por um Filho que acolhe e age como o Pai e pelo ‘Espírito’ que é sopro de vida, energia que transforma e santifica. Santificar significa se separar do mal e agir como Deus Pai age em Jesus. Hoje nós somos esses ‘filhos e filhas’ que podem e devem manifestar o Deus Pai, cheio de compaixão e amabilidade que se manifestou em Jesus, desmascarando todos aqueles que apresentam um deus vingador e justiceiro. Hoje, nós não temos a missão de pregar doutrinas, teologias, ou dogmas trinitários, mas de ajudar as pessoas a se deixar imergir-batizar no amor e na comunhão profunda que existe entre Jesus e o Pai, E, ao mesmo tempo, a missão de libertar tantos irmãos e irmãs que continuam a viver na dependência da miséria, da violência, da mentira, da hipocrisia, do ódio, da indiferença humana, da manipulação que cega! Ou seja, a missão trinitária de salvar gente!


sábado, 22 de maio de 2021

Poema de natal - Por Vinícius de Moraes.

 

Para isso fomos feitos

Para lembrar e ser lembrados

Para chorar e fazer chorar

Para enterrar os nossos mortos

Por isso temos braços longos para os adeuses

Mãos para colher o que foi dado

Dedos para cavar a terra.


Assim será a nossa vida

Uma tarde sempre a esquecer

Uma estrela a se apagar na treva

Um caminho entre dois túmulos

Por isso precisamos velar

Falar baixo, pisar leve, ver

A noite dormir em silêncio.


Não há muito o que dizer

Uma canção sobre um berço

Um verso, talvez, de amor

Uma prece por quem se vai

Mas que essa hora não esqueça

E por ela os nossos corações

Se deixem, graves e simples.


Pois para isso fomos feitos

Para a esperança no milagre

Para a participação da poesia

Para ver a face da morte

De repente nunca mais esperaremos...

Hoje a noite é jovem; da morte, apenas

Nascemos, imensamente.


 


(Fonte: Vinícius de Moraes. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Companhia José Aguilar Editora, 1974, p. 223)

Pentecostes: 'soprar' para a brasa da vitalidade não apagar, e poder 'incendiar' a humanidade.....!

 19 Ao anoitecer daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas, por medo dos judeus, as portas do lugar onde os discípulos se encontravam, Jesus entrou e, pondo-se no meio deles, disse: “A paz esteja convosco”. 20 Depois dessas palavras, mostrou-lhes as mãos e o lado. Então os discípulos se alegraram por verem o Senhor. 21Novamente, Jesus disse: “A paz esteja convosco. Como o Pai me enviou, também eu vos envio”. 22 E, depois de ter dito isso, soprou sobre eles e disse: “Recebei o Espírito Santo. 23 A quem perdoardes os pecados, eles lhes serão perdoados; a quem não os perdoardes, eles lhes serão retidos”. (Jo 20.19-23)


Muitas vezes em certos momentos da nossa vida fazemos a experiência de passar por diferentes circunstâncias (dor, doença, crise matrimonial, decepções....) que nos deixam desnorteados. Descobrimo-nos incapazes de compreender o sentido daquelas experiências, e o que Deus queria nos dizer naqueles momentos. Com o passar do tempo ao lembrar esse nosso passado podemos dizer que também naquelas experiências muitas vezes dolorosas o Espírito de Deus estava presente mesmo parecendo ausente. Isso porque o que parecia triste e traumático, com o passar do tempo nos ajudou a nos sentir mais humanos e mais sensíveis. Houve, podemos dizer, uma revelação do Espírito de Deus na nossa vida justamente quando nem imaginávamos! Um verdadeiro sopro de vida que nos fez ver as coisas com outros olhos e nos ajuda a enfrentar a vida com uma nova atitude. Esta mesma experiência foi feita pelos apóstolos e seguidores de Jesus, muito tempo depois que Jesus tinha morrido e depois de terem ficado por um bom tempo sem rumo, quase que paralisados. Mas, como acontece também na nossa vida, encontramos pessoas especiais, ouvimos palavras certas no momento certo, escutamos testemunhos significativos, tudo isso faz despertar na gente algo novo, algo iluminador. De repente o que nos parecia nebuloso se torna claro, o que parecia abandono e morte se torna acolhida e vida renovada. Pentecostes que era uma festa que lembrava os 50 dias após a promulgação dos mandamentos de Moisés, se torna, agora a festa da presença do Espírito de Jesus ressuscitado que reanima a sua igreja-comunidade e envia como missionários do Pai aquelas pessoas que pareciam viver sem ânimo e sem motivação. Ele envia não para anunciar leis e mandamentos, mas para que todos fizessem a experiência da compaixão e do amor para com todos.

Pentecostes representa, então, o momento em que os apóstolos depois de muita reflexão descobrem de forma coletiva, como grupo, como igreja, que o Espírito do Ressuscitado continuava a estar no meio dele, orientando e motivando e, sobretudo, enviando-os. O próprio Jesus que tinha já partido deste mundo começa a ser percebido como o mesmo mestre que haviam conhecido e que, agora, os convidava a sair do fechamento em que se haviam trancafiado. Eles começam a superar o medo. O medo de falar, de se expor, o medo de serem perseguidos. Sentem que podem ir ao encontro de todas as pessoas, de todas as culturas e contextos sociais, sem inibição. Sentem que podem anunciar e testemunhar sem ter a presença física de Jesus porque Ele tinha entrado definitivamente em suas mentes e em seu coração. Hoje, nós, podemos fazer esta mesma experiência quando sentamos juntos, como comunidade cristã, de fé, debatemos e refletimos sobre os desafios da nossa comunidade e nos perguntamos:’ Se Jesus estivesse aqui, como estava com os seus, muitos anos atrás, o que ele nos diria? Que solução ele daria? Que encaminhamento concreto escolheria?’ Pentecostes é quando a partir da nossa diversidade e diferenças começamos a falar a única e mesma linguagem. A língua do amor e do serviço! 


quinta-feira, 20 de maio de 2021

CARTA ABERTA DO ENCONTRO DOS BISPOS DA AMAZÔNIA LEGAL

 

AO POVO BRASILEIRO

“Vi, então, um novo céu e uma nova terra, morada de Deus com sua gente (…).

Nunca mais haverá morte, nem luto, nem grito, nem dor.

Sim! As coisas antigas passaram! Eis que faço novas todas as coisas” (cf Ap 21, 1- 5).

Nós, bispos da Amazônia, presbíteros e diáconos, religiosos e religiosas, cristãos leigos e leigas em profunda sintonia com o Sínodo Pan-Amazônico, reunidos nos dias 18 e 19 de maio de 2021, no exercício de nossa missão evangelizadora dirigimos esta mensagem a toda sociedade, aos povos da Amazônia, aos homens e mulheres comprometidos com a defesa da vida. E o fazemos profundamente sensibilizados pela situação de vulnerabilidade e ameaças que sofre toda casa comum, agravada pela pandemia da Covid-19, e pelo acirramento das disputas territoriais com expansão das atividades minerais e do agronegócio em terras de populações tradicionais. 

Nosso olhar vigilante

Acompanhamos estarrecidos, mas não inertes, o desenrolar de um arquitetado projeto genocida que, por sua vez, revela o devastador agravamento de uma crise que escancara a pobreza diante da escandalosa concentração de riquezas. Este é o sinal evidente da perversidade de uma economia de mercado, embasada no capital especulativo, que se alimenta das necessidades dos estados nacionais, fazendo destes seus novos consumidores. Assim, o capital sequestra a autonomia dos Estados, exige e dita os novos rumos da política, rompe com as históricas conquistas sociais, desmonta as instituições e políticas de seguridade, alimenta-se das posturas extremistas, que por sua vez buscam na religião sua legitimidade de expressão. As lutas das populações da Amazônia têm diante de si o escandaloso desafio da pretensiosa legalidade do ilícito. Ou apelamos para a garantia legal da vida e dos territórios, ou nos defendemos quando o extermínio se torna lei! Este dinamismo é escancaradamente presente diante da questão das lutas dos povos indígenas. O cenário político indigenista vivido no Brasil é de retrocesso, com o agravamento das violações dos direitos destes povos, principalmente no que se refere à regularização dos seus territórios. Eles enfrentam invasões de suas terras, incentivadas por estratégias políticas que favorecem a exploração, por garimpeiros, mineradoras, madeireiros, desmatadores, agentes do agronegócio, entre tantos outros, gerando toda espécie de violências e violações de direitos humanos e da natureza. Somam-se os incêndios, poluição das águas dos rios, contaminação de peixes, contaminação das pessoas e dos animais; assassinatos, violência sexual, pandemia, desassistência.

Preocupa-nos a cadeia de iniciativas em vista do desmonte e fragilização da legislação socioambiental e fundiária: O PL 3729/2004 que desmonta o sistema de licenciamento ambiental; o PL 2633/2020 e PL 510/2021 que abrem as “porteiras” para a grilagem de terras; o PL 191/2020 permitindo a mineração e atividades econômicas em terras indígenas; o PL 6299/2002 que flexibiliza fabricação e uso de agrotóxicos. Enquanto escrevemos estas linhas, populações que há mais de 30 anos estavam presentes em seu chão, são despejadas no Assentamento Jacutinga em Porto Nacional – Tocantins, contrariando a recomendação do Conselho Nacional de Justiça de não executar decisões desse tipo em tempo de pandemia.

Outra série de agressões vão se acumulando neste cenário que não escapa aos nossos olhos: as ameaças às unidades de conservação, o acirramento da violência no campo e na cidade, a crise migratória, o feminicídio, a exploração sexual, o trabalho escravo, o tráfico de pessoas, entre tantos. Como se não bastassem essas crises provocadas pela intervenção humana, o fenômeno das enchentes, que pode ser agravado pelas mudanças climáticas, castiga nossas populações ribeirinhas. De olho nas águas, percebemos uma iminente crise hídrica como pauta de um próximo embate. 

Somos sabedores que os governantes têm o dever constitucional de agir para evitar a destruição das riquezas naturais e implementar políticas públicas que amenizem a situação de desigualdade e pobreza, porém, na Amazônia isso não vem acontecendo. Assistimos um governo que vira as costas a esses clamores, opta pela militarização em seus quadros, semeia estratégias de criminalização de lideranças e provoca conflito entre os pequenos. Dói em nossos corações de pastores as imagens de escárnio e zombaria das dores de nossa gente: “Nossa alma está farta, em extremo, da zombaria dos satisfeitos e do desprezo dos soberbos” (Sl 123,4).

Nossa escuta contemplativa e esperançosa e nosso comprometimento inequívoco

Os caminhos traçados pelo Sínodo da Amazônia, catalogados em forma de compromisso no novo Pacto das Catacumbas pela Casa Comum, deixaram evidente a necessidade de superar uma lógica colonizadora, de escolher a periferia como centro da Igreja, de assumir o caminho da inculturação e interculturalidade, seja no campo dos ministérios como das estruturas: uma Igreja com o rosto Amazônico. Constatamos com alegria a atuação de uma infinidade de comunidades constituídas e milhares de lideranças de cristãos leigos, na sua maioria mulheres, que atuam no campo da evangelização e educação socioambiental. Não somos ingênuos de pautar nosso agir em polarizações agressivas, como insistem até mesmo alguns que dizem professar a fé em Jesus Cristo, mas não haja dúvidas de que lado nós estamos: por causa do Evangelho e do Reino reafirmamos nossa incondicional escolha por estas populações, por estes territórios, por estas vidas ameaçadas. Em nada nos fascina qualquer aproximação com esses sistemas perversos. Sentimo-nos impulsionados e animados a reafirmar alguns compromissos:

Prosseguir e avançar em nossa pauta pastoral as reflexões e indicações ousadas do Sínodo em torno dos ministérios, como apresenta o Documento Final do Sínodo nos números 103 e 111, e da formação inculturada dos nossos agentes;

Elaborar um plano estratégico com diretrizes pastorais, que encarne o sonho social, ecológico, cultural e eclesial para a Pan Amazônia;

Incentivar a questão da segurança alimentar como estratégia de cuidado pela vida;

Reafirmar nosso envolvimento efetivo com o Pacto pela Vida e pelo Brasil, unindo-nos ao “coro dos lúcidos” fazendo nossas as suas pautas: a vacina para todos, a defesa do SUS, o auxílio emergencial digno, pelo tempo que se fizer necessário e a investigação da responsabilidade pela má gestão do sistema de saúde em meio à pandemia do coronavírus. Da mesma forma tornar vivo o Pacto Educativo Global, proposto Papa Francisco, em todas as regiões da Amazônia. Conclamamos todas as instâncias eclesiais e a sociedade como um todo a unir-se neste engajamento;

Exortamos, às mais variadas lideranças de cristãos leigos e leigas, que não desanimem da luta, que renovem continuamente o senso de comunhão eclesial, que a paixão pelo Reino de Deus seja sempre alimentada, e que a sensibilidade para com os mais pobres seja permanente.

Não nos faltem a intercessão de nossos mártires, companheiros de caminhada, e o olhar benevolente da Senhora de Nazaré, Mãe da Amazônia: “esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei”! A Mãe de Deus está conosco. Sigamos em frente!



Amazônia, 19 de maio de 2021.



Participantes do Encontro Bispos da Amazônia Legal

sexta-feira, 14 de maio de 2021

Ascensão de Jesus ao céu - Não fuga sideral, mas espaço inspirador para os seus seguidores 'divinizarem' a terra! ( Mc. 16, 15-20)

No nosso cotidiano fazemos a experiência dramática de perder pessoas queridas. Pessoas de referência. Ficamos transtornados e desnorteados. Pessoas próximas de nós tentam nos consolar, e nos conformar. E nos convidam a ‘deixar partir’ aquela pessoa que nós amamos e admiramos. Com o tempo aprendemos que é possível ficar em comunhão com alguém que se foi, e que se tornou invisível aos nossos olhos. Aprendemos a manter uma ligação afetiva muito intensa, mesmo sem ter a sua presença física. 

Esta foi também a experiência dos discípulos de Jesus! A ascensão de Jesus ao céu não significa distanciamento, e nem separação dele, mas é um ‘deixar Ele ir’ para que os que o amaram, e que ficam, possam senti-lo ainda mais presente! Ir para o céu não é subir na atmosfera e se perder no universo, mas significa estar junto de Deus, e ‘governar’ o mundo como Deus-Pai governa. Este é o sentido de ‘sentar à direita do Pai’. Na antiguidade era o príncipe herdeiro que sentava à direita do rei! 

A solenidade de hoje nos convida a olhar para a terra com os olhos do céu, ou seja, com os olhos de Deus. Um Deus-Pai que olha os sofrimentos e as angústias de seus filhos e intervém. Que vê e se indigna com os demônios da prepotência e da brutalidade humana que escravizam os seus filhos, e os expulsa. Um Deus que sente a mesma dor de tantos corpos feridos, seviciados e violentados e os cura. Por isso o evangelho hodierno de Marcos parece ser a resposta à indagação do final da primeira leitura, em Atos: ‘Porque ficai aí, parados, olhando para o céu? ’  O céu não pode ser fuga de um presente feito de desafios e de incertezas, ao contrário, deve ser fonte inspiradora para ‘revolucionar’ a terra, tal qual faria o Pai se pudesse estar no nosso lugar. 

‘IDE’ e não ‘FICAI’ deve ser o lema dos discípulos de Jesus. Afinal, Ele continua a atuar ao lado daqueles seguidores que não ficam a aguardar sinais e prodígios celestiais, mas fazem irromper nessa terra os valores do céu, os sonhos de Deus. Aqueles que permanecem para sempre, e que ninguém poderá destruir. 


Sequestraram Maria de Nazaré, de Fátima, de Guadalupe, de Lurdes......

 O sequestro sempre fez parte da história da humanidade. É a arma dos covardes. Ao sequestrarem uma pessoa, exigem um preço para o seu resgate. Foi assim com José do Egito. Com medo de sua importância junto ao velho pai, seus irmãos sequestraram-no e entregaram-no aos egípcios. Não é anormal os noticiários trazerem à tona que este acontecimento continua sendo uma artimanha dos covardes. Sequestraram Nossa Senhora de Fátima. Sim, a mulher pobre de Nazaré, a primeira discípula de Jesus, esposa de José.

A Virgem apareceu a três pobres crianças, na Cova da Iria, interior de Portugal, quando pastoreavam um rebanho de ovelhas. Foram cinco aparições, com uma bela mensagem: penitência e oração. Penitência é o arrependimento por uma ação má. Oração é manter-se na intimidade de Deus, que é o Sumo Bem. Os dois pedidos de Maria completam-se, não se excluem. Para libertar o coração inclinado ao mal, é necessária uma força maior, e essa força só pode vir de Deus, pela experiência da oração e a vivência da Palavra. Grupos de católicos tradicionalistas, sequestraram a Virgem pobrezinha. Em nome do tradicionalismo e não da sã Tradição, colocam palavras na boca da Senhora. Fazem com que ela diga o que nunca disse na vida diária de Nazaré. Dizem, em nome dela, sobre o perigo do comunismo, da necessária comunhão diária, da reza do Rosário, da confissão frequente.

Pela boca destes, Maria nunca fala do Magnificat, de Javé o Deus dos pobres, de Deus que se encanta com os humildes e neles fixa os olhos. O realizador de maravilhas, como a derrubada dos tronos, do soerguimento dos pobres e humilhados. Não, ela, como é apresentada, parece ter sofrido uma amnésia quanto ao seu cântico, registrado pelo evangelista Lucas. Nos andores, sua imagem branca, é levada aos palácios, onde Herodes, continua perseguindo o Menino, para matá-lo. Invocam sua benção sobre facínoras, que manipulam a Palavra de Deus, como “A verdade vos libertará”. Tudo para ludibriar o povo, fazendo-se arautos da verdade, da honestidade, da honradez. Lobos travestidos de cordeiros, que na calada da madrugada, arquitetam mentiras, subornos. Se fazem de paladinos do bem, mas, negam a ciência, a pandemia, a vacina. Sem a necessária credencial, receitam remédios sem a comprovada eficácia. Debocham das mortes, dizendo: e daí ou eu não sou coveiro! Incentivam os conflitos, abrem guerra midiática a quem pensa diferente. Colocam as instituições do Estado ao serviço próprio.

Esquecem que Maria de Fátima, de Lourdes, de Aparecida, de Guadalupe, têm lado: o lado dos pobres. Esquecem que, em Fátima, ela apareceu a pequenos e insignificantes pastores. As políticas governamentais não contemplam os pequenos agricultores, trabalhadores sem-terra. Invadem os assentamentos, jogam veneno em suas plantações de subsistência, criminalizam o movimento dos sem-terra. Estão devastando a Amazônia, passando a boiada, dita pelo Ministro Salles. Esquecem que, em Lourdes, Maria, apareceu a uma menina e aquele lugar tornou-se uma benção para os doentes. Basta ver o descuido com a saúde do povo, a falta proposital de vacinas, a falta de oxigênio, o desvio de verbas públicas, o desmonte do SUS, a reforma da Previdência Social. Esquecem que, em Aparecida, Maria se fez preta. O racismo brasileiro é estrutural e cultural. A chacina do Jacarezinho, é um retrato de como os pretos e as pretas são tratados pelo poder público. Esquecem que, em Guadalupe, Maria se fez índia, ao lado de um pobre índio. A invasão as terras indígenas, o garimpo ilegal, a brutalidade dos madeireiros, a poluição dos rios, a derrubada e queimada das matas; é a mais cruel guerra aos nossos povos originários.

Maria de Nazaré, nunca frequentou o Palácio de Herodes. Não cantou hinos religiosos invocando as bênçãos sobre César. Não jogou água benta em Pilatos. Maria de Nazaré, de Fátima, de Lourdes, de Aparecida, de Guadalupe; percorreu caminhos de fraternidade, derrubou muros, construiu pontes. Maria, a Senhora Pobrezinha, de Belém, da Galileia, de Caná, do Calvário, do Cenáculo; não é a que entra nos palácios, que confirma a tirania, que aprova a rejeição aos glbtsq+, a que persegue os moradores de rua, que abusa dos menores.

Não, a Maria do Evangelho, é outra. E chora, quando vê que seu nome, imagem, são usados para confirmar tudo que é anti-Evangelho. Sequestraram Nossa Senhora de Fátima, em nome de uma religião ritualista, legalista, fria, sem coração, sem ternura, sem misericórdia! Que pena, sequestraram Nossa Senhora de Fátima!

Ederson Queiroz, padre, da Arquidiocese de UberabaMG.

Câmara aprova 'mãe de todas as boiadas', o fim do licenciamento

 O plenário da Câmara aprovou, na madrugada do dia 13 de maio, por 300 votos contra 122, o texto principal do relatório do deputado Neri Geller (PP-MT) sobre o Projeto de Lei (PL) nº 3.729/2004, da Lei Geral do Licenciamento Ambiental. O PL restringe, enfraquece ou, em alguns casos, até extingue parte importante dos instrumentos de avaliação, prevenção e controle de impactos socioambientais de obras e atividades econômicas no país. 

Trata-se da pior e mais radical proposta já elaborada no Congresso sobre o assunto e que, na prática, torna o licenciamento convencional uma exceção, na avaliação da Frente Parlamentar Ambientalista, pesquisadores e organizações da sociedade civil. Para eles, se transformado em lei, o projeto pode produzir recordes de desmatamento em série, em especial por eliminar restrições à derrubada da floresta estimulada por grandes obras de infraestrutura na Amazônia, como estradas e hidrelétricas. O parecer não foi debatido publicamente, dentro ou fora do Congresso. O documento foi repassado a alguns deputados só no final da semana passada. Ontem, em plena votação, parlamentares reclamaram por não ter conhecimento do texto, elaborado a portas fechadas por ruralistas, a Casa Civil e o lobby de grandes indústrias e empresas de infraestrutura.

Com apoio do “Centrão” e de bolsonaristas, a bancada ruralista derrotou, um a um, os requerimentos apresentados pela oposição e os parlamentares ambientalistas para obstruir a votação ao longo de parte da tarde e da noite. O texto de Geller foi levado diretamente ao plenário porque teve regime de urgência aprovado em 2017, depois de passar pelas comissões de Agricultura, Meio Ambiente, Finanças e Tributação. Após apreciação dos destaques, o PL segue para o Senado. Se sofrer mudanças, volta a ser debatido na Câmara, mas apenas as alterações serão analisadas. Se for aprovado pelos senadores como está, segue para sanção presidencial. (IHU)