sábado, 27 de fevereiro de 2021

FUNAI edita mais uma Instrução Normativa para explorar recursos indígenas...'em parceria'!!!!!

 A Fundação Nacional do Índio – Funai, em conjunto com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama, expediu no dia 24 de fevereiro de 2021, a Instrução Normativa 01/2021, em que autoriza a “parceria” entre indígenas e não indígenas para a exploração econômica dos territórios, sem nenhuma consulta aos afetados, no caso os povos indígenas. Na prática, a Instrução Normativa conjunta da Funai/Ibama ataca frontalmente o usufruto exclusivo dos territórios indígenas e, em consequência, a proteção a esses territórios e ao meio ambiente, ao qual os indígenas estão ligados de forma fraterna e sustentável. Esta Instrução Normativa concebe a participação dos indígenas em uma Comissão Mista para aprovação das formas de exploração dos territórios. Esse mecanismo poderá levar ao acirramento de numerosos conflitos, de toda ordem, sem falar na insegurança jurídica que vai criar. Mais um absurdo desse governo que vai comendo pelas beiradas terras indígenas e direitos garantidos na Constituição!


sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

“E daí? Não sou coveiro” (J.Bolsonaro) - Covardia mãe da crueldade (Montaigne) e servidão voluntária (La Boétie) - Trechos de uma palestra de Marilena Chaui

 

Inimigo da tirania, o filósofo Montaigne escreveu um ensaio intitulado “A covardia é a mãe da crueldade”. A covardia, explica o filósofo, nasce do medo do outro que, por isso, deve ser eliminado de maneira feroz. O covarde é impulsionado pelo temor de que o outro, sendo melhor do que ele e corajoso, possa vence-lo e por isso é preciso extermina-lo, seja fisicamente, seja moralmente, seja politicamente. O cruel é um mentiroso porque se apresenta com a máscara da coragem quando, na verdade, habitado pelo medo, é movido pela cólera e não há nada pior para uma sociedade do que um governante cruel e colérico, pois não julga segundo a lei e sim segundo seu medo.

Um dos contrapontos mais belos ao ensaio contra a covardia e a crueldade, é aquele sobre a amizade, que Montaigne dedicou à memória de seu amigo, Etienne de La Boétie, que morreu prematuramente e que, como Montaigne, se erguera contra a tirania, escrevendo um texto conhecido como Discurso da servidão voluntária no qual reencontramos a figura do tirano como covarde e cruel. O Discurso da servidão voluntária, como seu título indica, debruça-se sobre um enigma: como os homens, seres que a Natureza fez livres, usaram a liberdade para destruí-la? Como é possível uma servidão que seja voluntária? De fato, escreve La Boétie, servidão voluntária é alguma coisa que a Natureza, ministra de Deus e boa governante de todas as coisas, se recusou a ter feito. Mais do que isso. Servidão voluntária é algo que a própria linguagem se recusa a nomear, pois essa expressão é uma contradição nos termos, uma vez que vontade livre e servidão são opostas e contrárias: toda vontade é livre e só há servos por coerção ou contra a vontade, coisa de que até os animais dão prova. O enigma, portanto, é duplo: como homens livres se dispuseram livremente a servir e como a servidão pode ser voluntária?

A força do tirano covarde e cruel vem da ampliação colossal de seu corpo físico por meio de seu corpo político, que dá lhe mil olhos e mil ouvidos para espionar, mil mãos para espoliar e esganar, mil pés para esmagar e pisotear.

A força do tirano, explica La Boétie, não está onde imaginamos encontrá-la: nas fortalezas que o cercam e nas armas que o protegem. Pelo contrário, se precisa de fortalezas e armas, se teme a rua e o palácio, é porque é covarde, sente-se ameaçado e precisa exibir signos de força ou atos de crueldade. Fisicamente, um tirano é um homem como outro qualquer – tem dois olhos, duas mãos, uma boca, dois pés, dois ouvidos; moralmente, é um covarde, prova disso estando na exibição dos signos de força e nos atos de crueldade. Se assim é, de onde vem seu poder, tão grande que ninguém pensa em dar fim à tirania? Responde La Boétie: sua força vem da ampliação colossal de seu corpo físico por meio de seu corpo político, que dá lhe mil olhos e mil ouvidos para espionar, mil mãos para espoliar e esganar, mil pés para esmagar e pisotear. O corpo físico do tirano não é ampliado apenas pelo corpo político como corpo de um colosso, também sua alma é ampliada por meio das falsas leis, que lhe permitem distribuir favores e privilégios e seduzir os incautos para que vivam à sua volta para satisfazê-lo a todo instante e a qualquer custo.

Entretanto, é preciso perguntar: quem lhe dá esse corpo político gigantesco, sedutor e malévolo? A resposta é imediata: somos nós quem lhe damos nossos olhos e ouvidos, nossas mãos e nossos pés, nossas bocas, nossos bens e nossos filhos, nossas almas, nossa honra, nosso sangue e nossas vidas para alimentá-lo e aumentar-lhe o poder com que nos destrói. Por isso, diz La Boétie: não é preciso lutar contra ele, basta não lhe dar o que nos pede; se não lhe dermos nossos corpos e nossas almas, ele cairá. Mas, se é tão clara a resposta, maior então é o enigma da servidão voluntária, pois se é coisa fácil derrubar a tirania é preciso indagar por que servimos voluntariamente ao que nos destrói.

Consentimos em servir porque também nós esperamos ser servidos. Servimos ao tirano porque somos tiranetes: cada um serve ao tirano porque deseja ser servido pelos demais 

A resposta de La Boétie é terrível: consentimos em servir porque também esperamos ser servidos. Servimos ao tirano porque somos tiranetes: cada um serve ao tirano porque deseja ser servido pelos demais que lhe estão abaixo; cada um dá os bens e a vida ao tirano porque deseja apossar-se dos bens e das vidas dos que lhe estão abaixo. A servidão é voluntária porque há desejo de servir, há desejo de servir porque há desejo de poder e há desejo de poder porque a tirania habita cada um de nós e institui uma sociedade tirânica, ou seja, a tirania não se encontra no topo do social, mas espalhada por ele e a crueldade se espalha por toda parte. A covardia se manifesta na crueldade física, psicológica, moral e política com que cada um deseja esmagar e exterminar quem recusa a tirania. Não há apenas o tirano, mas uma sociedade tirânica e cruel.

Disso o Brasil é um exemplo perfeito, no qual a violência não é percebida ali mesmo onde se origina e ali mesmo onde se define como violência propriamente dita, isto é, como toda prática e toda ideia que reduz um sujeito à condição de coisa, que viola interior e exteriormente o ser de alguém, que perpetua a crueldade nas relações sociais de profunda desigualdade econômica, social e cultural.

Assim, diante da pergunta: 'E daí?' ... porque nada acontece diante da crueldade que assola o país? tem como resposta: porque a tirania é o modo de ser de nossa sociedade. (Marilena Chaui)

Áreas protegidas ajudam a conservar sumidouros florestais de carbono

O estado precário do papel da bacia do Rio Amazonas como sumidouro de carbono demonstra a necessidade de proteger as florestas que restam na região e no mundo. Áreas protegidas e terras indígenas são algumas das mais valiosas ferramentas para ação climática, combinadas com políticas de comando e controle do desmatamento. O novo mapa revela que 27% da cobertura florestal do planeta que atua como sumidouro líquido de carbono está em áreas protegidas. Observações de áreas individuais mostram o quão efetivo essas áreas podem ser para manter o CO2 nas florestas. Por exemplo, no Brasil há um contraste evidente entre as emissões da Terra Indígena Menkragnotí e as áreas desprotegidas ao redor. As árvores na área protegida continuam a absorver aproximadamente 10 milhões de toneladas de CO2 a mais do que emitem por ano – o equivalente a emissões de 2 milhões de carros. A área ao redor da terra indígena, no entanto, se tornou uma fonte de emissões por meio da abertura de áreas para mineração, pecuária e plantio de soja. Reconhecer Terras Indígenas e áreas protegidas, e garantir a aplicação da lei nessas terras, é uma estratégia reconhecida na proteção da floresta em pé e do carbono estocado nessas florestas.( Fonte:Nancy Harris e David Bibbs, publicada por WRI Brasil)



"O empecilho do meio ambiente, o negócio dos índios, o Bolsonaro vai passar por cima, e aí a tendência é asfaltar até Manaus" - II Parte

Uma consulta no site do CAR mostra que a área está 100% dentro da Floresta Nacional do Aripuanã e tem 98,6% de seu território coberto por mata nativa. O anúncio diz, porém, que a área está "pronta para a agricultura".Quando indagado sobre os documentos dos lotes, em encontro filmado com câmera escondida, o corretor disse que só poderia cedê-los após o envio de uma carta de intenção de compra. Ele não quis revelar a identidade do pretenso dono das áreas. O corretor sugeriu ainda que seria possível desmatar até 50% de cada lote — o que constituiria irregularidade mesmo que as áreas fossem de propriedade particular. Segundo o Código Florestal, donos de terras na Amazônia devem preservar pelo menos 80% de suas propriedades. Questionado sobre restrições ambientais que hoje limitam atividades agropecuárias na Amazônia, ele disse acreditar que elas serão suprimidas pelo atual governo. "O empecilho do meio ambiente, o negócio dos índios, o Bolsonaro vai passar por cima, e aí a tendência é asfaltar até Manaus", afirmou. Alguns meses após o encontro, a BBC contatou o corretor para informá-lo de que ele havia sido gravado e pedir esclarecimentos sobre suas colocações, mas ele não se manifestou.

Terra indígena à venda

Outro anúncio encontrado no Facebook oferece um lote de 21 alqueires (o equivalente a 57 campos de futebol) "todo em mata, com toda madeira ainda para tirar" no município de Buritis (RO), por R$ 126 mil. Com base em coordenadas geográficas citadas no anúncio, a BBC descobriu que a área está dentro da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau, que abriga o maior trecho de floresta preservada em Rondônia. Órgãos do governo já contaram 209 habitantes indígenas no território, mas a população total é maior, pois há registro de cinco grupos isolados na área, com número desconhecido de integrantes. Em encontro gravado com câmera escondida, o pretenso proprietário do lote à venda, Alvim Souza Alves, admitiu que a área fica dentro da terra indígena, mas disse integrar um grupo que busca regularizar a ocupação com autoridades em Brasília. Ele também disse esperar que o caso seja solucionado pelo governo Bolsonaro.

Investigação da BBC encontra em plataforma facebook dezenas de anúncios em que vendedores negociam pedaços da floresta ou áreas recém-desmatadas, que eles não possuem, por valores que chegam à casa dos milhões de reais.

 Uma investigação da BBC encontrou na plataforma dezenas de anúncios em que vendedores negociam pedaços da floresta ou áreas recém-desmatadas, que eles não possuem, por valores que chegam à casa dos milhões de reais. Há áreas à venda até mesmo dentro de unidades de conservação e de terras indígenas. Segundo a lei, é proibido vender áreas que sejam parte de terras indígenas ou unidades de conservação. São áreas de domínio público que se destinam exclusivamente a populações tradicionais. A investigação deu origem ao documentário Amazônia à venda: o mercado ilegal de áreas protegidas no Facebook, disponível a partir de meio-dia (hora de Brasília) desta sexta-feira (26/02) no canal da BBC News Brasil no YouTube e transmitido mundialmente pela BBC.

O documentário mostra que o mercado ilegal de terras na Amazônia está aquecido com a perspectiva de que o Congresso anistie invasões recentes e permita que invasores obtenham os títulos das áreas. Atualmente, só áreas públicas desmatadas até 2014 são passíveis de regularização, mas a bancada ruralista e o governo federal articulam um Projeto de Lei que prorrogaria o prazo. O documentário revela também como a grilagem — ocupação ilegal de terras públicas — avança na Amazônia brasileira. É um padrão que se repete. Grupos de grileiros se organizam em associações com CNPJ, contratam advogados, mantêm laços com políticos e pressionam órgãos públicos a lhes conceder as áreas invadidas. Como eles não detêm a propriedade oficial da terra, muitos invasores usam um registro oficial, o Cadastro Ambiental Rural (CAR), para reivindicar as áreas griladas e colocá-las à venda, tentando dar um aspecto de legalidade às transações. O problema é que o CAR não é prova de direito à propriedade sobre uma área. E, por ser autodeclaratório, em tese, qualquer pessoa pode registrar qualquer parte do território nacional como se fosse sua dona e usar isso em uma futura batalha jurídica pela posse da terra.

Após vários meses de pesquisa, foram mapeadas dezenas de anúncios com aparentes ilegalidades em diversos Estados amazônicos. Muitos vendedores admitem nos próprios anúncios que desmataram as áreas e não têm títulos que comprovem a propriedade dos lotes. Desmatar floresta sem autorização é crime com pena de até quatro anos de prisão e multa. Já vender terras sem possuir títulos que comprovem a propriedade pode ser enquadrado como estelionato, segundo advogados entrevistados. O crime tem pena de até cinco anos de prisão e multa. Já compradores podem ter a posse invalidada pela Justiça ou ser enquadrados no crime de invasão de terras públicas, caso se comprove que sabiam que as áreas eram públicas. Em nota, o Facebook afirmou que usuários têm de seguir as leis ao fazer negócios pela plataforma e que está à disposição das autoridades para tratar das questões levantadas pela investigação. Entre as áreas à venda que foram identificadas, há um terreno dentro da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau (RO), dois na Floresta Nacional do Aripuanã (AM) e um na Reserva Extrativista Angelim (RO). As áreas foram localizadas cruzando-se as coordenadas geográficas com mapas e imagens de satélite. As duas áreas à venda na Floresta Nacional do Aripuanã somam 1.660 hectares (o equivalente 1.660 campos de futebol) e foram oferecidas ao custo de R$ 3,2 milhões no total. Os lotes foram anunciados no Facebook por um corretor de Porto Velho, Alcimar Araújo da Silva, que tem um escritório no centro da cidade. O post mostra o número de registro de um dos lotes no Cadastro Ambiental Rural (CAR).


A esquerda a foto do Estado da Rondônia em 1985 e à direita....hoje, após o desmatamento descontrolado!

terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Terra Yanomami: “famílias inteiras com covid onde o garimpo está fora de controle”

 "Esse é um dos momentos cruciais para a defesa dos povos indígenas, porque em 30 anos não víamos a situação dos Yanomami e Yekweana chegar aos níveis de sucateamento que temos visto hoje". O alerta, dado em entrevista ao programa Bem Viver, é da antropóloga Ana Maria Machado, membra da rede Pró-Yanomami e Yekweana e uma das organizadoras do relatório “Xawara: rastros da Covid-19 na terra indígena yanomami e a omissão do estado” , lançado no final do ano passado. Segundo ela, o abandono e o avanço do garimpo ilegal são os principais vetores de doenças, como a covid-19, na Terra Indígena Yanomami, a maior do país, localizada nos estados do Amazonas e Roraima, na fronteira do Brasil com a Venezuela, em um corredor de 9,6 milhões de hectares. Morada de cerca de 30 mil indígenas, está entre as mais impactadas com o desmatamento ilegal na Amazônia brasileira. Xawara é como os Yanomami chamam desde os antepassados o que hoje conhecemos como pandemia. A palavra dá nome ao que eles chamam booshikë, que nós conhecemos como minério. De acordo com suas regras culturais, o booshikë deve ficar quieto, dentro da terra, caso contrário causaria muitas doenças e mortes, se espalhando como uma fumaça. A corrida incessante pelo ouro, aliada à conivência e omissão das autoridades são justamente o que têm causado inúmeras doenças e levado à morte crianças e bebês Yanomamis, como explica o relatório de 105 páginas publicado pelo Instituto Sociambiental (ISA) e produzido pelo Fórum de Lideranças Yanomami e Ye'kwana e da Rede Pró-Yanomami e Ye'kwana, a partir de dados levantados no período de março a outubro de 2020. (Fonte: IHU)

15 milhões de Brasileiros estão passando fome....

 A conjuntura não era boa e o ano de 2019 encerrou com o fantasma da volta do Brasil para o Mapa da Fome. Em 2020, na eclosão da pandemia, a falta de comida na mesa virou uma realidade não somente para aqueles que estão em vulnerabilidade social, mas também para quem ‘se virava’ e tinha um trabalhado mesmo que informal. “As pessoas ficam desprovidas de renda, de início se endividam, depois já não tem mais condições de garantir compras de alimentos, mesmo os de mais baixo valor e pior qualidade”, aponta o economista Francisco Menezes. E se na cidade a falta de qualquer tipo de trabalho é o início de um caminho inevitável para a fome, no campo o desmonte de políticas à agricultura familiar e pequenos produtores empurra essas pessoas para as mesmas condições daqueles que vagam pelos centros urbanos sem renda. Até mesmo a suspensão das aulas impactou esses produtores, pois também eram grandes fornecedores para programas de merenda escolar. “Criou-se um problema que impactou fortemente sobre a alimentação das famílias com filhos na rede de escolas públicas, por deixarem de contar com o que era servido nas escolas. Do outro lado, a agricultura familiar que tinha a garantia de fornecimento de no mínimo 30% dos alimentos para as escolas, ficou sem esse mercado”, detalha Francisco. Ele também lembra que já “entre 2017 e 2018 já tínhamos mais de 10 milhões de pessoas vivendo em situação de insegurança alimentar grave, ou seja, em situação de fome”. Assim, sem estarmos em situação favorável ainda sofremos a pandemia que acelera o agravamento desse quadro. “Se projeta que teríamos hoje em torno de 15 milhões de pessoas em situação de fome”, pontua. (Fonte: IHU)


'ARMAI-VOS UNS OS OUTROS'

 ‘Armemo-nos e partam’! Muitos conhecem a proverbial frase pronunciada por Benito Mussolini, o ditador fascista italiano, às vésperas da II Guerra Mundial. Reflete a atitude mesquinha de quem se subtrai a cumprir uma ordem que ele mesmo deu! Todos devem se armar, mas somente ‘os outros’ deverão arcar com as consequências de tal ordem. No caso específico, ir para a guerra. Pouco mais de um século mais tarde, outro candidato a ditador, no Brasil, conclama a população a ‘armar-se’. Não há uma guerra mundial ameaçando o País, mas os números das vítimas por homicídio são, tecnicamente, de ‘guerra civil’. Mediante repetidos e insistentes decretos presidenciais o atual presidente vem tentando flexibilizar sempre mais o porte e a posse de um número sempre maior de armas para ‘os cidadãos de bem’ se defenderem dos ‘bandidos’. Há, nisso, uma tácita admissão do fragoroso fracasso das instituições de segurança em proteger os ‘cidadãos normais’, ou seja, os que não podem e nem querem comprar armas. A fixação um tanto mórbida do atual mandatário com armas de fogo vem de longe. Remonta ao ano de 1995 quando o então candidato a deputado federal Jair Bolsonaro foi abordado por dois assaltantes que lhe roubaram a sua inseparável pistola Glock 45. Em várias entrevistas ele teve que admitir que, mesmo armado, naquela circunstância, se sentiu impotente. E, uma vez desarmado, permitiu que mais uma arma de fogo circulasse no comércio da criminalidade do Rio de Janeiro. Não é uma preocupação com a segurança da população que move o presidente em sua cruzada armamentista. E nem a tentativa de fazer justiça a um suposto clamor popular por segurança via armamento individual do cidadão. Há em jogo inconfessáveis intenções em engordar o cofre das indústrias bélicas nacionais e internacionais. Aquelas que abastecem as milícias urbanas, os grupelhos radicais ultraconservadores e violentos. Há, na atual conjuntura nacional, uma inegável tentativa de ‘preparar’, via armamento individual, aqueles setores da população identificados com o ‘Duce’ e dispostos com ele a defender um possível autogolpe institucional. 

Só os frouxos e os trogloditas sem argumentação e sem responsabilidade social apostam no falso poder civilizatório das armas. Os números oficiais não desmentem: quanto mais armas existem em circulação, mais crimes são cometidos! Contudo, essa argumentação é considerada uma falácia inaceitável para aqueles ‘cidadãos de bem’ que colecionam armas de R$ 3.000,00, enriquecem com sua venda e crescem politicamente à custa do medo e do sentimento de desamparo que domina e paralisa os ‘cidadãos comuns’. Mais uma vez o governo dessa ‘pacífica nação’ vai na contramão de numerosos Países, - como é o caso, por exemplo, dos EUA pós Trump, - que tendem a restringir sempre mais o acesso às armas por parte dos cidadãos de bem ou não. Chegou a hora de inverter radicalmente as prioridades sociais, e trazer de volta o País à sobriedade e à sanidade moral. Em vez de aumentar as armas pessoais de quatro para seis, faz-se urgente aumentar os impostos sobre os lucros e sobre as grandes fortunas dos sonegadores recalcitrantes. Faz-se urgente multiplicar, - biblicamente falando, - alimentos, salários e investimentos em saúde, habitação, empregos, universidades... E no desarmamento dos ‘cidadãos de bem’, fardados ou não! Afinal, já o Mestre da buliçosa Galileia dizia que ‘quem de espada fere, de espada será ferido’!


AS COISAS DE CARAVAGGIO - POR ROMÉRIO RÔMULO

 



Há coisas como o dia, como a noite

como as maçãs dormidas no seu prato.

há coisas pelos anjos, que intranquilos

revelam um macabro sobre tudo.

há coisas que são poucas e devassas

há coisas muitas, pedras, feitas breves

numa sangria de cuidado e morte.

que coisas arrebatam e nos queimam

de pura dor e sofridão intensa?

as coisas reveladas são mais duras

que a irrevelada ação que as sustenta?


há coisas tão medonhas enterradas

e outras só encanto nos seus vôos

que ávido de tudo me carrego

neste mar de sangrias infundadas.

umas coisas me dizem que sou bruto

tantas outras me regem que sou sábio

e dilaceram meu ânimo de bicho

ou corrompem um ombro puro osso.

sábado, 13 de fevereiro de 2021

6º domingo comum - 'Fica curado, e volte a conviver conosco, porque somos todos irmãos'! - Mc 1,40-45

 A transgressão de Jesus exibida na sinagoga, e fora dela, inspira e dá frutos. Um hanseniano parece ter captado o jeito livre de Jesus diante da lei, e reproduz a sua ousadia e atrevimento. Relegado ao ‘isolamento social’ pela sua doença, o hanseniano, ‘duplamente impuro’ – social e ritual, - se rebela às normas. Invade a aglomeração criada ao redor de Jesus e o interpela. Ele não busca prioritariamente a cura física. Ele quer ser readmitido ao convívio social. Quer que lhe sejam devolvidos a sua dignidade e o seu direito de conviver com amigos e familiares. Mesmo sabendo do poder de Jesus o ‘transgressor atrevido’ deixa a Jesus a opção de curá-lo ou não. O Mestre ignora as filigranas da lei dos doutores e sacerdotes, estende a mão e o toca. Jesus é movido pela compaixão, e não pelas exigências legais! Mesmo que isto signifique ser considerado um impuro. Jesus acolhe a súplica do hanseniano e ordena com autoridade ‘Eu quero (não os sacerdotes):fica curado’! Ou seja, ‘volte a viver conosco, porque você sempre foi um de nós, um irmão, não um apestado! Experimente a alegria de abraçar e de ser abraçado! Vá e esfregue na cara dos sacerdotes esse seu novo status social e existencial’! O empedernido transgressor curado não foi se mostrar aos sacerdotes como previa a lei. Simplesmente reproduzia o que o seu Curador fazia: divulgar e pregar a inédita emancipação trazida por Jesus: somos todos irmãos, filhos do mesmo Pai-Mãe!


quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Funai inicia nova etapa da ação de barreiras sanitárias no Maranhão

 A Fundação Nacional do Índio (Funai) iniciou, na última semana, a quarta etapa da ação de barreiras sanitárias em Terras Indígenas (TIs) do Maranhão onde vive o povo Awa Guajá. Os trabalhos ocorrem em parceria com o Batalhão de Polícia Militar do Estado e têm o objetivo de intensificar a vigilância e o controle de acesso aos territórios indígenas durante a pandemia. Por meio da Frente de Proteção Etnoambiental Awá, a Funai mantém seis barreiras sanitárias em funcionamento contínuo desde o mês de outubro do ano passado, localizadas no entorno de Terras Indígenas do Maranhão onde vivem os Awá Guajá e os grupos em isolamento voluntário e de recente contato da mesma etnia.

Além de monitorar a movimentação de pessoas e veículos nas imediações das TIs Alto Turiaçú, Awá, Caru e Arariboia, as barreiras permitem identificar e coibir a prática de ilícitos ambientais, bem como a promoção de ações de educação em saúde e de direitos indígenas para a população que mora no entorno das áreas indígenas.“Durante as atividades, as equipes também identificam e comunicam a ocorrência de casos suspeitos de covid-19 à vigilância epidemiológica dos respectivos municípios. Além disso, várias frentes de ilícitos ambientais já foram desarticuladas pela atuação das barreiras sanitárias”, comenta o coordenador de Políticas de Proteção e Localização de Povos Indígenas Isolados da Funai, Geovanio Oitaiã Pantoja, que pertence à etnia Katukina.

A Medida Provisória (MP) 1027, editada pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, autorizou a Funai, de forma excepcional e temporária, a efetuar pagamento de diárias a servidores e militares que atuarem em barreiras sanitárias. A MP busca facilitar a atuação dos parceiros governamentais no suporte a essas barreiras, permitindo, assim, a manutenção e o aprimoramento dos trabalhos. Atualmente, a fundação mantém mais de 300 barreiras sanitárias em funcionamento no país.

(Assessoria de Comunicação/Funai)


sábado, 6 de fevereiro de 2021

V domingo Comum - Na vida do seguidor não entra satanás...xô satanás, xô satanás! (Mc. 1, 29-30)

Sábado estranho o de Jesus. Vivido em plena transgressão. Vai à sinagoga não para ouvir, e sim para pregar. Prega o oposto dos doutores da lei. Diante da contundência dos conteúdos de Jesus, alguém, cheio de complexos e culpas, entra em crise. Descobre-se possuído e manipulado. A lavagem cerebral exercida pelos ‘ideólogos da lei’ é escancarada pelo leigo pregador de Nazaré. É preciso se libertar do entulho demoníaco que aquele espaço sagrado veiculava. No evangelho hodierno, Jesus, após sair da sinagoga, sempre de sábado, comete mais uma transgressão. Mas, agora, com a cumplicidade dos apóstolos que percebem que o Mestre não liga para as exigências do sábado. Levam-no para a casa da sogra de Pedro: mulher e doente. Duplamente impura. E, por isso, duplamente agraciada: Jesus a pega pela mão e a cura. Para Jesus o ser humano, macho ou fêmea, está acima de toda proibição e norma social elaborada por  religiosos manipuladores e machistas. Marcos faz questão de frisar que Jesus pegou a mulher doente pela mão e a ajudou a ‘levantar-se’. O mesmo verbo utilizado para indicar a ‘ressurreição’ de alguém. A mulher ‘levantou-se’ dentre os excluídos, os relegados à invisibilidade social. Torna-se pessoa nova, viva e atuante, habilitada para servir. Um serviço espontâneo e gratuito. Uma 'diaconia' voluntária! Na sociedade em que tudo exige retribuição 'a cidadã invisível' e doente aponta para a gratuidade e para a gratidão. Hoje, como ontem, os piores infratores são os que se consideram 'guardiões da lei'. E os piores inescrupulosos são os que se fazem chamar de patriotas e defensores da família e da propriedade. É preciso que o seguidor de Jesus atualize e reproduza a mesma transgressão de Jesus: recolocar em primeiro lugar o cuidado e a proteção de tantos indefesos e inúmeros agredidos pelos demônios genocidas, pelos hipócritas legisladores e pelos 'falsos pastores' que rondam os palácios e os templos.... 

 

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

CARLO UBBIALI - 20 LONGOS "BREVES" ANOS DE AUSÊNCIA SEMPRE PRESENTE!


 20 anos atrás, ao voltar com vários colaboradores de uma solenidade de formatura de um casal indígena que acabava de se formar em magistério, nas proximidades de Araguanã, no dia 04 de fevereiro de 2001, vinha a falecer num acidente de carro o Padre Carlo Ubbiali, amigo, irmão e companheiro. Ele havia nascido em Brignano (Bergamo - Itália) aos 28 de junho de 1939. Após o curso preparatório é enviado pelo então bispo de Cremona, ao Brasil, na diocese de Viana, no estado do Maranhão. Padre Carlo chega a Viana num momento delicado. Após a morte do bispo Dom Francisco Hélio Campos, considerado pelo regime militar como bispo perigoso por ter assumido a causa dos direitos dos lavradores e pobres daquela terra, é nomeado bispo de Viana o capuchinho Adalberto Abílio Paulo da Silva. Padre Carlo após um breve período de serviço pastoral em São Vicente Ferrer transfere-se para Boa Vista do Gurupi, na diocese de Cândido Mendes, hoje Zé Doca. Começa a ter os primeiros contatos com a realidade indígena, pois Boa Vista era uma cidade muito freqüentada pelos índios Tembé, Ka' apor e Timbira que ocupavam a  Alto Turiaçu. Fundador do Regional CIMI -MA (Conselho Indigenista Missionário do Maranhão) começa a articular a pastoral indigenista nos estados do Maranhão e Tocantins e a desencadear campanhas e mobilizações. A mais significativa destas, e que marcou a vida do padre, foi a sua participação em 1981 na transferência de um grupo de índios Guajá, índios nômades e com poucos contatos, para garantir-lhes a integridade física na atual Terra Indígena Awá-Guajá. Além disso, em 1982 articula com outras personalidades e movimentos de São Luís e do Maranhão inúmeras mobilizações de resistência à instalação da Alumar, ao Projeto Carajás e à ferrovia que originou impactos nocivos aos povos indígenas e comunidades situados às suas margens. Em 1990 em ocasião da assembléia nacional do Cimi é eleito vice-presidente nacional da entidade, sendo presidente Dom Tomás Balduíno. O último sonho da vida dele era iniciar um projeto de educação formal dos índios Awá-Guajá e a criação de uma escola de Ensino Médio para os índios Guajajara na Terra indígena Pindaré como forma de eles se tornarem artífices do seu futuro segundo seus valores, sua cultura, seus projetos de vida. Algo que se efetivou após alguns anos. 

Após 'longos' breves 20 anos, o missionário de Brignano, Bergamo, continua marcando presença e inspirando quantos se colocam ao lado da causa indígena. Imagino, por um momento, o que Carlos diria e faria, hoje, ao ver as tentativas da Funai em liberar garimpos e mineração em todas aquelas terras ainda não plenamente homologadas e diante de um presidente da República cuja prioridade para este ano coloca a 'mineração em terras indígenas', ignorando a situação de calamidade que o País vem enfrentando. Hoje, Carlos teria a nobre idade de 82 anos e não me é difícil imaginar o que aquele idoso faria se estivesse vivo e atuante no nosso meio...Certamente dedicaria mais tempo a leituras e momentos de espiritualidade que ele cultivava sistematicamente; daria mais tempo a amigos e a momentos de confraternização, aproveitando tudo o que a vida, a amizade, a fraternidade oferece de bonito e gostoso; continuaria fazendo algumas visitas seletivas a algumas aldeias próximas, dirigindo pessoalmente o seu carrinho e permanecendo nas aldeias ouvindo contos e cantos, histórias e estórias de um passado não tão mítico de povos resistentes e....anotando tudo naquela caderneta encardida que sempre levava junto. Não dispensaria, ao chegar à sua base em São Luís - como ele havia escolhido poucos meses antes de falecer, - chamar colaboradores e amigos para tomar juntos um vinho e assar uma carne vermelha, e entre uma análise e outras, não deixaria de apreciar algumas lorotas dando gargalhadas contagiantes. Pois, aqui estamos, hoje, 20 anos de presença real, não de um fantasma ou de um espírito desencarnado, mas de uma pessoa que nunca se ausentou entre aqueles que não desistem em senti-lo próximo!