Pedro/pedra, capaz de discernir onde precisa abrir e fechar. Onde ser terno e onde endurecer. E os dois juntos – Jesus e o grupo/pedra – se fortalecem reciprocamente, e testemunham a presença de um Deus que manifesta o ‘poder do seu reino’ na fragilidade e na grandeza do serviço e do martírio. Na contramão dos ‘messias’ desse mundo. Na contramão dos ‘pontífices’ desse mundo!
A identidade de uma pessoa nunca se dá de uma vez por todas. Ela está sempre em construção. Aliás, podemos ter várias identidades ao longo da nossa vida. E termos várias identidades ao mesmo tempo. Tudo isso a depender dos contextos em que nos achamos, e da compreensão e consciência que temos de nós mesmos e do mundo em que estamos. Ter várias identidades não significa ter várias personalidades. Ou até, várias máscaras. Significa, em primeiro lugar, ter a capacidade de estar atento ao que somos e queremos num determinado momento histórico. E ouvindo o que a realidade externa nos pede constantemente. Em suma, se ‘identificar’ com projetos, urgências, pessoas, modelos, imperativos éticos. Realidades que estão em permanente mutação. E fazer tudo isso sem se quebrar por dentro. O evangelho de hoje trabalha isso de forma original e profunda. Narra o momento chave em que Jesus de um lado, e os discípulos do outro, começam a tomar consciência que está para nascer uma nova identidade antes desconhecida. Para os dois. A identidade de Jesus e dos discípulos, tomados individualmente, e do grupo como um todo. E essa identidade individual e coletiva que se dá ao mesmo tempo implica a assunção de novas práticas, novas escolhas, novas relações. Seja no nível pessoal que coletivo. Na narração evangélica fica claro desde o início qual é identidade de Jesus segundo as pessoas em geral. As que não o conheciam, e que não conviviam com ele. Identificavam-no com um dos profetas do passado. Não conseguiam ver o novo que Jesus trazia e produzia. Jesus, porém, sabe que a convivência com aquele grupo de seguidores havia produzido neles/as algo diferente. E os interpela, os questiona para que tenham a coragem de se expor e manifestar. De assumir para ele e para a sociedade o grau de identificação/compromisso com o Mestre.
A pergunta de Jesus, de fato, não é uma mera pergunta de ‘sondagem’ sobre o que pensam dele. É um questionamento que tem a ver com opções existenciais próprias e não delegáveis a outros: ‘e vós que dizeis que é o filho do homem?’ Isso é um divisor de águas. A depender da ‘resposta’ assume-se um novo projeto de vida. Mudam as relações humanas, estilo e atitudes pessoais. Assume-se uma nova identidade. Tudo isso ocorre porque não se trata de uma resposta doutrinária, de dogmática. Trata-se de uma nova relação com o que interpela. Trata-se de aceitar de construir uma nova identidade pessoal e coletiva com o ‘outro’ (Jesus) diferente da identidade assumida anteriormente. Pedro em nome do grupo reconhece que Jesus é o enviado. Ou seja, se compromete a construir a sua vida daí em diante não a partir de ‘outros messias’, mas a partir da proposta do enviado Jesus. Identifica-se com suas propostas e práticas em favor dos pequenos de Israel/humanidade. E renuncia a outras práticas que não estavam em conformidade com as de Jesus. Jesus, do outro lado, reconhece a assume a nova identidade de Pedro/rocha e do grupo. Uma rocha frágil, insegura, incoerente, mas que ao se espelhar/identificar num ‘messias sofredor’, humano e servidor, torna-se sólida. Pedro/pedra, capaz de discernir onde precisa abrir e fechar. Onde ser terno e onde endurecer. E os dois juntos – Jesus e o grupo/pedra – se fortalecem reciprocamente, e testemunham a presença de um Deus que manifesta o ‘poder do seu reino’ na fragilidade e na grandeza do serviço e do martírio. Na contramão dos ‘messias’ desse mundo. Na contramão dos ‘pontífices’ desse mundo!
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