Em tempos de crise financeira global falar em ‘lucrar’, ‘multiplicar’ talentos e recursos – como o evangelho hodierno apresenta - é música suave. Aos ouvidos de quantos vivem ansiosamente à procura de possuir mais e mais. Viciados e dependentes como são do consumo, dos gastos insensatos, das mordomias e dos luxos vergonhosos. Há, porém, um outro lado dessa mesma moeda/realidade. A necessidade sim, de multiplicar e valorizar, sobremaneira, tudo o que sinaliza vida, fraternidade, participação, defesa da integridade moral e física dos humanos, e de todos os seres vivos. Ameaçados como são pelas manias doentias dos que querem lucrar sempre mais dinheiro à custa dos querem preservar vida, liberdade, sobriedade, e respeito. É justamente disso que a parábola de Jesus nos fala. Não se trata, com efeito, de considerar eventuais qualidades pessoais, ou uma espécie de conjunto de habilidades a serem valorizadas e multiplicadas na esfera pessoal/individual. Não que isso não seja importane! Mas trata-se, essencialmente, de tomar consciência de que ‘ Alguém’ confiou em nós, e nos deixou a responsabilidade de dar continuidade ao seu/comum patrimônio moral e existencial: a vida, a realeza de Deus. Ele o fez considerando as capacidades 'administrativas e gerenciais' de cada um. Sem intransigências, e nem falsas piedades. Mas a todos, sem exclusão, deixou parte desse patrimônio, para cuidar com competência e criatividade. Sem se omitir e se apavorar com essa responsabilidade. Mais do que isso: nos incentiva a administrar para ampliar, diversificar e estender sempre mais esse ‘patrimônio inicial’.
Aqui entram, porém, as duas diferentes posturas/comportamentos que podemos assumir perante essa missão de vida. De um lado tomar consciência de que temos autonomia e liberdade para mexer no ‘capital de vida’ que Deus nos deixou. Mexer, porém, só se for para ampliá-lo ainda mais. Para permitir que outros, muitos, possam se aproveitar dele. E para tanto precisamos ser corajosos. Temos que nos arriscar. Experimentar formas e caminhos novos para que haja mais vida, mais esperança, e mais fraternidade. Esta é a postura daqueles de investiram, arriscaram e dobraram o capital inicial recebido. Mas há também a outra postura. Aquela de quantos acham que o patrimônio de vida deixado inicialmente por Deus é simplesmente para ser ‘preservado’ tal como o herdamos. Ou seja, a postura de quantos acham que nós somos meros guardiões do ‘capital espiritual e humano’. O que poderia ser considerada uma atitude sensata, a de pelo menos não desperdiçar o bom que foi herdado, torna-se, neste contexto, objeto de crítica dura por parte de Jesus. Afinal, o Deus de Jesus não é um ‘conservador’ e um ‘ciumento’ do capital dele! Ao contrário, é um deus que tem consciência que a vida que possuímos é ‘patrimônio coletivo’. E cabe a todos, não simplesmente ‘guardar e conservar’ a vida, mas multiplicá-la e valorizá-la. Fazê-la ‘render’ infinitamente mais. Talvez porque a vida/patrimônio nunca tenha sido tão banalizada e ameaçada como hoje.
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