Tirar a vida de uma pessoa talvez seja a expressão mais amarga e vergonhosa de que nós ‘supostos humanos’ continuamos agindo como ‘animais’. Em alguns casos, até mais cruéis e letais do que eles. A cínica autonomeação ‘homo sapiens’ não nos livra do fato de termos que admitir que praticamos e justificamos torturas, espancamentos, homicídios e linchamentos, mesmo quando não somos ameaçados ou agredidos. Não é segredo para ninguém que o nosso País promove e vive uma permanente hecatombe. As estatísticas mostram que o Iraque é aqui! Nessa última década a média de homicídios chega a 50 mil por ano no Brasil. Uma guerra civil que ceifa, em sua maioria, negros e jovens. Em São Luis os homicídios conheceram um aumento de mais de 350% nesses últimos 15 anos. O número de novos registros de armas cresceu 4.000% de 2004 a 2015 no Brasil, sem falar no comércio clandestino de armas sofisticadas que entram no País. Os vis linchamentos chegam a ser, em média, mais que um por dia. Nunca se matou e violentou tanta mulher como nesses últimos dois anos! As torturas nas cadeias continuam com a mesma intensidade que na época da ditadura. A disseminação das drogas e das overdoses fatais em todos os rincões e classes sociais produz lutos em milhões de famílias. E, enfim, os ‘cidadãos de bem’ que aplaudem a pena de morte, o ‘homicídio legalizado’, chegam à vergonhosa percentagem de 58% dos brasileiros, com o evidente apoio de cristãos, católicos ou evangélicos que sejam. Seus dignos representantes no congresso nacional são conhecidos como ‘os deputados da bala, da bíblia e do boi’, uma tríade fatal! São pessoas que manipulam a Palavra da Vida para justificar suas ações de morte. Uma verdadeira carnificina ética!
A quinta palavra que inspira libertação é lapidária e imperiosa: ninguém deve matar outro humano, nem mesmo para puni-lo por um crime de homicídio. Os autores bíblicos, mesmo condicionados pela cultura específica da sua época, já tinham compreendido as dinâmicas da psicologia humana. Sabem que os humanos se deixam cegar pelo ódio, sentem-se sufocados pela sede de vingança, promovem guerras para alcançar poder e glória, e não conseguem se desvencilhar do rancor que lhes carcome a alma. Perdem a liberdade para continuar a acreditar na vida. Repetem mecanicamente as arbitrariedades e os abusos do Faraó que se apossou deles! Justamente para nos libertar da espiral da violência em que somos catapultados os autores bíblicos nos orientam a ‘Não odiar o nosso irmão no nosso coração, a não nos vingar, a não guardar rancor contra os filhos de nosso povo’ (Lev. 19.17). E concluem, positivamente, ‘Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o Senhor’ (vv.18). A prática do amor e do respeito inibem a pulsão da vingança. Ajuda-nos a compreender que a nossa missão é defender os ‘templos vivos’ que foram moldados à imagem e semelhança do Criador. Certamente haverá quem diga que é fácil falar assim quando não se faz a dramática experiência de ser vítima de um crime hediondo ou de não ter tido familiares e amigos ceifados pela fúria do ódio e da violência. Não nos cabe julgar. Nem as vítimas que invocam vingança, nem os próprios homicidas. Como cristãos e cidadãos cabe-nos compreender e combater a raiz de toda violência que contém sempre algo injusto e patológico. E, sem justificar ou livrar o autor de um homicídio, temos o imperativo ético e moral de exigir um julgamento justo, uma pena que restaure a sua dignidade e liberdade interior, e jamais a insânia do castigo punitivo! Jesus de Nazaré tinha compreendido que, em geral, a tendência do ser humano é a de revidar. De responder com violência a uma violência sofrida. Por isso que Ele, contra toda a lógica predominante, não tinha receio em exigir dos seus discípulos que ‘não enfrentassem o malvado usando a sua mesma prática. Que oferecessem a outra face quando esbofeteados’(Mt.5,39). Longe de promover uma atitude passiva e submissa, Jesus aponta para o único caminho possível: a não violência ativa e corajosa, a que desmascara e apequena os violentos e promove os misericordiosos e os construtores de paz.
(Este blogueiro escreve, mensalmente, na coluna do O Jornal do Maranhão, da Arquidiocese de São Luís )
(Este blogueiro escreve, mensalmente, na coluna do O Jornal do Maranhão, da Arquidiocese de São Luís )
Nenhum comentário:
Postar um comentário