Nessa quarta-feira, 24/06, o Congresso Nacional aprovou, com maioria de 83%, o Projeto de Lei 4.162, que regulamenta a concessão do serviço de saneamento básico em todo país. Em 2012, o Brasil assinou o pacto de universalização dos serviços de saneamento básico, através do Objetivo do Desenvolvimento sustentável (ODS) 6. De lá para cá, pode-se dizer que nada avançou em termos de alcance. A chegada da pandemia Covid-19 escancarou a aberração que são as estatísticas de saneamento no Brasil, onde as desigualdades sociais são, mais uma vez, reforçadas pelas desigualdades sanitárias. Poderia ser momento propício para os governos olharem para o histórico das gestões das empresas de saneamento que, não incomum, sobrepõem critérios políticos aos técnicos e assumirem mea culpa histórica pela ineficiência de gestão. Apesar de tantas ingerências políticas por décadas, nas empresas de saneamento, notadamente nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná, a qualidade dos serviços e a gestão financeira eficiente, no que diz respeito à geração de caixa e distribuição de dividendos, são marcas consolidadas e de interesse da iniciativa privada. Portanto, a quem interessa a possibilidade de privatização do saneamento? Essa questão merece ser dividida em duas partes aparentemente antagônicas.
De um lado tem-se o papel endêmico do setor privado. Dentro do modelo capitalista, é do interesse desse setor que o desenvolvimento produtivo seja capaz de gerar lucros e, por conseguinte , possibilite a expansão e geração de novos investimentos. No contexto do novo marco do saneamento é de se esperar que o setor privado, nacional e internacional, vá à busca da aquisição daquelas empresas cujo histórico e potencial de expansão sejam os mais elevados possíveis. De outro lado, tem-se a lacuna entre os locais mais avançados em termos de condições sanitárias e aqueles cuja inexistência do saneamento básico atinge uma parcela expressiva da população que desconhece condições mínimas de saneamento e tem sido ignorada e alçada ao grupo dos invisíveis desse país.Como o marco regulatório pretende alcançar esses invisíveis do saneamento, que residem em regiões que demandam elevado nível de investimento e baixo ou nenhum retorno financeiro se, até o presente momento, nem as empresas públicas, que não seguem as mesmas estratégias e propósitos do setor privado, não foram suficientes para contemplá-los?
Somente modelos muito bem desenhados de privatização, onde se coloque o ônus do investimento para garantir a universalização como contrapartida à privatização das empresas sólidas e bem estruturadas, serão garantidores da universalização. O atual PL 4.162 não traz mecanismos garantidores do alcance desse objetivo. E a sociedade, em sua passividade e acúmulo de desconhecimento das causas embrionárias de suas desigualdades, deve seguir à margem dos processos que a define enquanto sujeito, permitindo que o Brasil assine, mais uma vez, atestado de incompetência na sua capacidade de desenhar e implementar suas políticas públicas. Os investidores sabem fazer conta e medir o risco Brasil: seus interesses não são definidos, nem muito menos garantidos pela Constituição.
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