segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Vidas paralelas: Sérgio Moro e Tomé de Souza por Fábio de Oliveira Ribeiro


Quando cá chegou, Tomé de Souza mandou despedaçar índios hostis na boca do canhão. Foi assim que ele separou os portugueses dos índios numa capitania fracassada (em que colonos haviam adotado o modo de vida indígena), inaugurou a centralização da Colônia e seu novo Direito Penal.Enquanto não for dissecado, estudado e cientificamente exorcizado esse ato fundador continuará a ecoar em cada chacina praticada por policiais e legitimada pelo Judiciário. O Estado se mantém violentamente apartado do povo porque o encara como um inimigo que deve ser despedaçado. A proibição da pena de morte expressamente prescrita na CF/88 tem sido desprezada pelos juízes há décadas. Precisamos de um novo início. Caso contrário toda e qualquer modificação introduzida no Direito Penal será corrompida para se ajustar ao ato fundador de Tomé de Souza. Nenhuma norma legal que pudesse beneficiar Lula foi aplicada. Tipos penais bem definidos foram distorcidos e ajustados para satisfazer o desejo dos juízes de impor a sanção e a prisão. Portanto, Lula também foi metaforicamente despedaçado na boca do canhão.

A substituição do Direito pelo exercício cruel de um poder ilimitado, que não reconhece qualquer Lei em relação a determinados réus, não é uma novidade no Brasil. Ele nasceu junto com o nosso país em meados do século XVI. Logo, quem fala em Lawfare se afasta do nosso problema. A proposta de Sérgio Moro não é nova e paradoxalmente inova. Ela reafirma o princípio fundador do nosso Direito Penal. Mas o Ministro da Justiça fez algo que nenhum legislador ousou fazer desde os tempos da Colônia: ajustar a Lei à prática cotidiana inspirada no ato do primeiro vice-rei enviado ao Brasil pelo rei de Portugal. Regredimos formalmente ao século XVI, sem dúvida. Mas por outro lado nos libertarmos da hipocrisia de uma proibição da pena de morte que tem sido cotidianamente violada nas ruas e nos Fóruns. Se a Lei é matar ou morrer, ninguém tem direito a vida: nem os policiais nem os juízes.

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