‘Não há como evangelizar os índios no Maranhão’. Essa foi, grosso modo, a espantosa conclusão à qual chegou o grande padre Antônio Vieira, após anos de presença missionária entre indígenas do Maranhão. Cerca de 400 anos atrás o jesuíta português afirmava que evangelizar os orientais, na Ásia, dava mais frutos, pois era o mesmo que dar forma a um pedaço de mármore. Ou seja, era uma missão dura e dolorosa inicialmente, mas ao final do esforço, o resultado ficava para sempre. Já no caso dos ‘Brasis’ - como eram chamados os indígenas do Brasil à época, - o trabalho de evangelização se assemelhava à manipulação da murta, um arbusto. Ou seja, era fácil imprimir logo uma forma ao material, mas a partir de um determinado momento começavam a aparecer novos brotos na planta que desfiguravam e desfaziam a escultura inicial.
Re-inventando os conteúdos cristãos, e mantendo os próprios
Se para muitos cristãos isto poderia ser um sinal de ‘fechamento’ à ‘boa nova’ de Jesus por parte dos indígenas, para outros é expressão de uma legítima e sadia resistência a tudo o que lhes era estranho e imposto. Resistência a tudo o que viria a ‘desfigurar e a desfazer’ a escultura ‘marmórea’ de sua própria fé e cultura. Afinal, os indígenas resistiam não tanto ao ‘evangelho’ em si, mas à metodologia e às práticas adotadas pelos ‘evangelizadores’. Muitas delas impositivas e pouco respeitosas. A reação do padre Vieira diante do fracasso parcial da sua missão evangelizadora revela, na realidade, uma determinada concepção de evangelização. Esta se identificava essencialmente com a transmissão de determinados conteúdos doutrinários, de preceitos, e de normas da igreja católica. Isto, contudo, não coincidia com a autêntica mensagem e prática de Jesus de Nazaré. Os indígenas, - os de cultura Tupi, principalmente, - em que pesem as pressões e imposições praticadas por vários missionários, têm demonstrado, historicamente, uma abertura surpreendente a inúmeros conteúdos cristãos. A sua capacidade de acolher o novo, de se adaptar a situações sempre mutantes, associado a um forte sentimento místico de liberdade e de autonomia, tem permitido que os povos indígenas conservassem até hoje suas tradições culturais e religiosas. Hoje, entre os povos indígenas do Maranhão, temos uma vasta pluralidade de práticas religiosas, fruto de uma prática evangelizadora igualmente muito diversificada.
Evangelizar os indígenas, hoje
A conclusão à qual chegou padre Vieira faz surgir, a 400 anos de distância, entre os católicos conscientes, algumas perguntas: ‘Qual a metodologia de evangelização que tem sido adotada pela igreja entre os povos indígenas? Quais conteúdos foram trabalhados? Quais sinais e testemunhos evangélicos ‘os cristãos’, os missionários e fiéis comuns, têm oferecido aos ‘selvagens e pagãos indígenas’ para motivá-los a aderir à fé cristã? Por que não temos até hoje uma ‘igreja católica indígena’? O que de fato vem ocorrendo hoje na nossa igreja é que se delega a missão de conviver eclesialmente com eles, e de anunciar o Deus de Jesus, o Pai de todos os povos, somente a algumas equipes diocesanas ou a poucas pessoas. Nós sabemos, no entanto, que a linguagem e a prática evangélica da compaixão, da solidariedade, da acolhida sem preconceitos, não exige cursos especializados. Que a defesa da dignidade inviolável de toda pessoa é missão de cada batizado, e de cada cidadão de bem. Que todos, mas principalmente quem se assume como seguidor de Jesus de Nazaré tem a missão intransferível de combater todo tipo de racismo, e defender de forma intransigente os direitos sagrados de todo filho e filha de ‘Tupã’.
A conclusão à qual chegou padre Vieira faz surgir, a 400 anos de distância, entre os católicos conscientes, algumas perguntas: ‘Qual a metodologia de evangelização que tem sido adotada pela igreja entre os povos indígenas? Quais conteúdos foram trabalhados? Quais sinais e testemunhos evangélicos ‘os cristãos’, os missionários e fiéis comuns, têm oferecido aos ‘selvagens e pagãos indígenas’ para motivá-los a aderir à fé cristã? Por que não temos até hoje uma ‘igreja católica indígena’? O que de fato vem ocorrendo hoje na nossa igreja é que se delega a missão de conviver eclesialmente com eles, e de anunciar o Deus de Jesus, o Pai de todos os povos, somente a algumas equipes diocesanas ou a poucas pessoas. Nós sabemos, no entanto, que a linguagem e a prática evangélica da compaixão, da solidariedade, da acolhida sem preconceitos, não exige cursos especializados. Que a defesa da dignidade inviolável de toda pessoa é missão de cada batizado, e de cada cidadão de bem. Que todos, mas principalmente quem se assume como seguidor de Jesus de Nazaré tem a missão intransferível de combater todo tipo de racismo, e defender de forma intransigente os direitos sagrados de todo filho e filha de ‘Tupã’.
Qual evangelização?
Muitos poderiam se perguntar: por que evangelizar os índios, hoje? Em caso de resposta positiva, qual evangelização? Qual metodologia podemos adotar? Afinal, o próprio São Paulo nos lembra que ninguém pode fugir desse imperativo: ‘Ai de mim se não anunciar a Boa Nova’(I Cor. 9,16). Podemos afirmar que os povos indígenas desse estado ao longo desses 400 anos, apesar de suas inevitáveis contradições, têm procurado acolher de um lado a boa nova e a prática evangélica de Jesus de Nazaré, sem conhecê-lo explicitamente e, do outro lado, têm tentado inverter os papéis procurando ‘nos evangelizar’. Talvez, mais uma vez, o nosso orgulho e a nossa arrogância nos tenham deixado cegos e surdos em saber captar aquelas mensagens e testemunhos que eles lançavam na nossa direção. Temos, contudo, que reconhecer que, como igreja católica, apesar das nossas contradições, temos sido ‘boa nova’ para os povos indígenas no Maranhão. Em encontros, assembléias, congressos, em inúmeras aldeias desse Estado sempre aparecem indígenas que reconhecem que a nossa igreja, principalmente nesses últimos 40 anos, foi a única que esteve ao seu lado defendendo o direito a um território próprio, a um atendimento digno na saúde, a ter acesso a uma educação diferenciada e respeitosa de sua cultura, a ajudar a superar os conflitos inter-étnicos, valorizando suas festas e tradições como expressão de um ‘Deus poliglota’, que fala a linguagem de todos os seus filhos e filhas. Uma igreja frágil, mas corajosa, despida do antigo complexo de superioridade, e em permanente escuta dos clamores e das e das conquistas desses povos. Uma igreja profética, minoritária, mas firme na denúncia contra todos aqueles que hoje como 400 anos atrás continuam a se macular do crime do racismo, do esbulho do patrimônio milenar indígena, e da violência física e simbólica contra os ‘povos originários’ desse Estado. (Síntese de um artigo escrito por este blogueiro ao Jornal do Maranhão da Arquidiocese de São Luis)
Muitos poderiam se perguntar: por que evangelizar os índios, hoje? Em caso de resposta positiva, qual evangelização? Qual metodologia podemos adotar? Afinal, o próprio São Paulo nos lembra que ninguém pode fugir desse imperativo: ‘Ai de mim se não anunciar a Boa Nova’(I Cor. 9,16). Podemos afirmar que os povos indígenas desse estado ao longo desses 400 anos, apesar de suas inevitáveis contradições, têm procurado acolher de um lado a boa nova e a prática evangélica de Jesus de Nazaré, sem conhecê-lo explicitamente e, do outro lado, têm tentado inverter os papéis procurando ‘nos evangelizar’. Talvez, mais uma vez, o nosso orgulho e a nossa arrogância nos tenham deixado cegos e surdos em saber captar aquelas mensagens e testemunhos que eles lançavam na nossa direção. Temos, contudo, que reconhecer que, como igreja católica, apesar das nossas contradições, temos sido ‘boa nova’ para os povos indígenas no Maranhão. Em encontros, assembléias, congressos, em inúmeras aldeias desse Estado sempre aparecem indígenas que reconhecem que a nossa igreja, principalmente nesses últimos 40 anos, foi a única que esteve ao seu lado defendendo o direito a um território próprio, a um atendimento digno na saúde, a ter acesso a uma educação diferenciada e respeitosa de sua cultura, a ajudar a superar os conflitos inter-étnicos, valorizando suas festas e tradições como expressão de um ‘Deus poliglota’, que fala a linguagem de todos os seus filhos e filhas. Uma igreja frágil, mas corajosa, despida do antigo complexo de superioridade, e em permanente escuta dos clamores e das e das conquistas desses povos. Uma igreja profética, minoritária, mas firme na denúncia contra todos aqueles que hoje como 400 anos atrás continuam a se macular do crime do racismo, do esbulho do patrimônio milenar indígena, e da violência física e simbólica contra os ‘povos originários’ desse Estado. (Síntese de um artigo escrito por este blogueiro ao Jornal do Maranhão da Arquidiocese de São Luis)
Um comentário:
um!! obrigado por ver esse cometário.
Quero saber mas.
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