'Enfim, o real conflito, o geral conflito, o drama histórico maior que lateja no fundo (que digo? na superfície) desta causa “menor” em torno da TI Maró é aquele que assola a Amazônia hoje, e que confronta os povos e gentes da terra, a gente do rio e da floresta, do peixe e da mandioca, que luta para manter seu modo de vida tradicional, – sem prejuízo de serem atendidos pelos serviços públicos a que têm direito como cidadãos brasileiros, os quais sempre lhes foram, não obstante, negados –, a uma legião de sereias políticas, empresariais e midiáticas que lhes acenam com a miragem da “possibilidade do desenvolvimento socioeconômico” (tomamos o eufemismo usado na sentença [p.25]) como constituindo a única forma pela qual estas comunidades ribeirinhas-caboclas-indígenas poderão se libertar do que as ditas sereias lhes apontam como sendo a miséria, ignorância, pobreza e sordidez em que estariam mergulhadas. O que a história recente nos ensina, muito pelo contrário, é que a “possibilidade do desenvolvimento econômico” produz, quando ela passa ao ato – aceitando-se, por antífrase, que tudo o que enumeramos no parágrafo anterior possa ser chamado de “desenvolvimento econômico” –, a dissolução progressiva dessas comunidades tradicionais, sua extinção, o acaparamento de seus territórios por grandes empresas agroexportadoras e por grileiros e especuladores profissionais, com o consequente engrossamento da população pobre das periferias das cada vez maiores, mais caóticas e mais inviáveis cidades da Amazônia.'
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