Primeira longa entrevista exclusiva de um papa para a televisão estadunidense. Há um elemento de novidade pouco notado, inerente à entrevista concedida por Francisco ao programa “60 minutes” da CBS. Entre os pontos mais relevantes esteve a resposta à questão sobre a possibilidade de as mulheres serem ordenadas presbíteras ou diáconas.
Sobre o primeiro ponto, a resposta foi muito clara: a possibilidade não existe. Sobre o segundo, o papa disse que, se fossem “diáconas com a Ordem Sagrada, não”. O que isso significa? O diaconato pode ser entendido como um ministério que tem dignidade em si mesmo e por si mesmo, ou pode ser entendido como o primeiro grau que leva ao acesso ao presbiterado. Portanto, o papa, na minha opinião, deu a entender o que o diaconato poderia se tornar (mesmo que feminino), imaginando também uma forma que não seja mais o primeiro grau da ordem sagrada, mas sim uma expressão da unção batismal. O outro tipo, aquele que permite o trânsito para o presbiterado, permaneceria limitado como é hoje.
Esse “sim” e “não” devem ser entendidos: o papa está travando uma batalha cultural contra o clericalismo e não acredita que uma espécie de clericalismo feminino seja a solução para o problema feminino na Igreja. Portanto, não me parece correto dizer que o papa disse “não ao diaconato feminino”: sobre os outros temas, ele já permitiu que fossem discutidos mesmo que discordassem dele, mas, sobre isso, deixou claro que, na sua Igreja totalmente ministerial, isto é, onde cada um realiza um serviço (na linguagem eclesial “ministério” significa “serviço”), cada ministério tem sua importância e dignidade. É o clericalismo que faz com que o ministério presbiteral seja considerado mais importante. E, na sua Igreja sinodal, essa igualdade na diversidade deveria adquirir uma maior importância.
Então, para mim, parece ser um “sim” ao diaconato feminino permanente. Mas o que isso significaria, concretamente? Se as mulheres tivessem acesso a esse “diaconato permanente”, uma mulher poderia administrar o batismo, distribuir a comunhão, abençoar os cônjuges, presidir um funeral. No entanto, a questão será objeto dos trabalhos do Sínodo.
Francisco instituiu um grupo de trabalho precisamente sobre esse assunto, mas o que é importante de ser sublinhado aqui é, para além dos ordenamentos internos da Igreja, a questão cultural de fundo. Que é a questão feminina. O Papa Francisco parece temer claramente que a ideia de cooptar mulheres para o clero seria uma rendição ao clericalismo, aquele que, por exemplo, considera o padre como ‘dono de casa” na paróquia, tal como o marido é o dono de casa na casa patriarcal, ou seja, em muitas das nossas casas, mas isso não resolveria a questão feminino. Eu entendo, mas isso não resolve a questão feminina que permanece com toda a sua evidência (assim como o clericalismo): para dizer isso, porém, não é preciso dizer que o papa é contra o diaconato feminino. Suas palavras não me parecem dizer isso.
O ponto de vista dele me ajuda a entender melhor, penso eu, como ele gostaria que a sua Igreja fosse. Mas temo que o clericalismo e o machismo ainda são tão fortes que ambos exijam administrações massivas de anticorpos.
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