Se o Jesus histórico voltasse a percorrer os caminhos da Galiléia e os trilhados pelos liturgistas oficiais ficaria profundamente indignado. À sua revelia foi proclamado rei, in memoria, e rei do universo! Justamente Ele que diante das pressões e mobilizações de diferentes grupos que queriam “fazê-lo” rei, fugia com habilidade e se refugiava em lugares desertos, teria que engolir, agora, um título que vai na contramão da sua prática e do seu pensamento.
É evidente que esse título reflete o processo de exaltação e divinização a que o Jesus histórico foi submetido desde cedo por parte dos seus seguidores. Não resgata, contudo, um dos traços predominantes da vida e atuação de Jesus de Nazaré. De fato, o título em si, o de rei, poderia ofuscar, ou até negar, a dimensão profético-pastoral que Jesus exerceu ao longo daqueles poucos anos de vida pública e que, de longe, melhor o define.
Essa festa, como a maioria das festas litúrgicas, deve ser re-interpretada e atualizada à luz da nossa realidade hodierna para que não se perca a intuição original quando da sua criação. A intuição inicial, originária e histórica, reflete um modo de pensar e de interpretar acontecimentos próprios da época e projeta neles as suas expectativas numa dimensão de futuro. Compreender a intuição/justificativa original (fazendo uma adequada hermenêutica) nos permite entrar em sintonia com a história que nos moldou e nos preparou o hoje que vivemos.
Longe de refletir, reproduzir, ou querer projetar/aplicar em Jesus atribuições do sistema de governo (monarquia) que vigorava na época, - e inadequadas para a nossa realidade de hoje - setores da igreja viram nesse título/festa uma forma didática de manifestar o sonho/projeto de administração/comunhão universal e cósmica ao redor dos valores manifestados e vivenciados por Jesus de Nazaré. É como se a igreja dissesse ao mundo/cosmos de hoje: em contraposição a quantos lutam, fazem guerras, exploram, conquistam, dominam, destroem e arrancam para se tornarem senhores/reis do universo, nós proclamamos que esse “habitat cósmico” pertence àqueles que sabem respeitar, defender, proteger e servir como Jesus de Nazaré, o bom pastor/servidor.
Com essa festa a igreja se contrapõe a todos os senhores, mercadores e neo-colonizadores cósmicos, que ameaçam e negam a vida de tantos seres vivos, mediante a afirmação/entronização da prática evangélica (julgamento da história, aqui e agora) da solidariedade e do serviço gratuito. Na igreja de Jesus de Nazaré para preservar o universo/cosmos e fazê-lo reviver, das investidas destruidoras dos aspirantes ambiciosos a autárquicos monarcas, só acolhendo o faminto, o sedento, o desprotegido, o abandonado, o desesperado....e os seres em extinção!
Viva a BIOCRACIA CÓSMICA!
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