Dez breves considerações para uma autocrítica necessária sobre a cobertura do rompimento das barragens de rejeitos de mineração, em Mariana (MG), ocorrido na última quinta (5). Ressalto que há coberturas muito justas sendo realizadas pelas imprensas tradicional e alternativa. Ou seja, o objetivo não é generalizar, mas convidar à reflexão:
1) Onde você escreve apenas “Samarco'', como responsável pela catástrofe da barragem de Mariana, acrescente “Vale'' e “BHP''.
2) Essa foi uma das maiores catástrofes ambientais do país e vai alterar a vida de milhões de pessoas e animais. Trate isso como tal e não como curiosidade mórbida.
3) Acidente, Papai Noel e Coelho da Páscoa… Investigações estão em curso, mas o uso irresponsável da palavra “acidente'' faz crer que tudo isso seria inevitável, concedendo ao acaso uma culpa que pode ser de empresas e governos,
4) Se todo pequeno tremor de terra derrubasse barragem, não sobrava uma hidrelétrica de pé no Brasil, como me disse ontem um velho engenheiro barrageiro.
5) Publicar release da empresa sobre o ocorrido em formato de notícia sem checar uma informação é passaporte para o inferno sem escalas.
6) Reportagens sobre a tragédia humana são importantes para que o país tenha a dimensão do caos que se estabeleceu. Mas o estrago trazido ao não tratar das responsabilidades dos atores econômicos e políticos nunca será compensado pela cobertura “humanizada'' que você teve orgulho de fazer.
7) Importante a solidariedade de pessoas que seguem para ajudar e mandam doações. Do ponto de vista da empatia social, não da necessidade material. Porque deveria ser a Vale a estar pagando agora até pelo banho e tosa do cachorro atingido pela massa de dejetos e não a sociedade brasileira.
8) O governo mineiro tratar a empresa ora como “vítima'' ora como “responsável'' mostra que a Síndrome de Estocolmo, quando um agredido passa a ter simpatia pelo agressor, atinge sempre a administração pública de forma patética.
9) Se o governo federal existisse e fosse autônomo, Dilma teria pego um avião imediatamente para sobrevoar o local, colocaria a Vale contra a parede e aproveitaria a comoção pública para reabrir a discussão sobre a regulamentação da mineração no Brasil, com efetiva participação das comunidades atingidas e foco na responsabilidade empresarial e no direito ao território e à dignidade humana.
10) Pouco depois do mar de lama chegar à praia, o assunto será substituído por outro. Mas a tragédia acontecerá de novo em Minas Gerais, como tem acontecido periodicamente. (Fonte: Leonardo Sakamoto)
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