Parece que o ser humano tem oscilado sistematicamente entre o ardente desejo de afirmar de um lado a sua independência absoluta e, do outro, a necessidade de sentir a presença solidária dos outros em sua vida. Algo contraditório e paradoxal ao mesmo tempo. De um lado afirma e tenta viver a sua plena autodeterminação, - sinalizando que não precisaria de ‘seres externos’, - e do outro, a constatação de que todos os seres humanos vivem num regime de interdependência. Enfim, todos precisam de....todos! Se isso, aparentemente, parece ser óbvio, nem sempre é claro o que significa, na prática, ‘precisar de todos’. Afinal, podemos precisar dos outros seres humanos para usá-los, sugá-los e manipulá-los. Inclusive para tentar alcançar a tão almejada ‘independência’. Esta seria um estado de vida em que supostamente não estaríamos submetidos a normas, a leis morais e divinas, e a todo tipo de ameaça de punição. Nem ‘Deus’ encontraria espaço aqui para querer ameaçar ou condicionar a nossa plena liberdade. A única condição que nos realizaria como ‘seres humanos’. No fundo, é a histórica, permanente e inconsciente luta do ser humano em tentar se emancipar de Deus. Pelo menos daquele ‘deus’ que é concebido como limitador das amplas e plenas aspirações dos humanos....
O evangelho hodierno de João retoma mais uma das suas muitas imagens aplicadas a Jesus (pão, caminho, porta, luz). Nesta, Jesus, o veículo/meio que leva a Deus/Pai, é a verdadeira videira que dá sentido à existência dos ‘ramos’. Jesus afirma a necessidade de o ser humano/discípulo estar ‘ligado’ sistematicamente a ele. Para Jesus essa profunda ligação com a sua pessoa e com o projeto de vida que ele representa é que dá sentido à vida do ramo/ser humano. Jesus tem plena consciência que outros, antes dele, se apresentaram como videira. Que tentaram atrelar a eles todos os ramos. Que nunca valorizaram os ramos, cuidando-os. Ao contrário, os exploravam, sugavam e destruíam sem lhes dar novas chances. Jesus com isso critica aquelas estruturas e instituições que ‘usavam e abusavam’ das pessoas tolhendo sua liberdade e autonomia. E que o faziam em nome de Deus! Jesus se apresenta como a ‘verdadeira’ videira, em oposição às ‘falsas’ videiras. A autenticidade do agir de ‘Jesus/videira’ se manifesta no seu jeito de zelar, cuidar e valorizar cada ramo. Como ‘Deus’ o faria. E sem tirar a liberdade e autonomia pessoal de cada ramo prova a beleza de estar sempre em comunhão com os demais ramos e com a videira verdadeira. Aquela que não manipula, não despreza e não ameaça. A autêntica preocupação da verdadeira videira está no fato em que quando há necessidade de podar algum ramo ele o faz. Não pelo gosto de punir, destruir e se vingar, mas para que ele produza mais frutos. E se sinta plenamente realizado. É nessa produção para si e para o conjunto dos ramos/videira, que os dois podem ser sinal de uma nova convivência. É nessa interdependência regeneradora para ambos que os ramos encontram liberdade e realização.
Nenhum comentário:
Postar um comentário