O que pode parecer algo surpreendente e espetacular reservado a algumas poucas pessoas pode estar ao nosso alcance: a transfiguração de pessoas e realidades. Ou seja, a capacidade de conhecer e ver além do que vemos física e sensoriamente. Um conhecimento antecipado de pessoas e coisas. Se analisarmos o itinerário da nossa vida, podemos perceber que em determinados momentos fizemos a experiência concreta, histórica, de ter intuído o que determinados acontecimentos ou pessoas iriam significar para nós. Ou seja, perceber com uma clareza reveladora que tipo de impactos iria produzir em nossa vida. Enfim, não uma distorção da realidade produzida pela mente, e sim um sentir diferente, único, revelador. Podemos chamar essa experiência profundamente humana de ‘trans-figuração’!É a experiência que Jesus fez ao perceber intuitivamente que a sua escolha de anunciar a boa nova aos invisíveis e pequenos da sociedade, e descortinar os mecanismos que os subjugavam, iria produzir impactos fatais para a sua própria sobrevivência física. Ao mesmo tempo, porém, teve a percepção que a sua morte não seria em vão, mas daria vida algo novo, inédito (vestes brancas). Em suma, nada que não tenha sido fruto de uma profunda capacidade, por parte de Jesus, de compreender as relações humanas, os jogos e as disputa de poder, as contradições e antagonismos sociais e econômicos.
O evangelista Lucas no-lo apresenta sob uma roupagem metafórica surpreendente: o alto monte, o branco luminoso de Jesus, as 3 tendas para dois personagens que representam a lei e o profetismo. É como se o evangelista nos dissesse que Jesus previu que ao sintetizar e ao superar duas grandes dimensões da estrutura religiosa de Israel (a lei mosaica e o profetismo anti-monárquico de Elias) iria colher o reconhecimento formal de Deus (a nuvem e a voz), mas também a rejeição do próprio povo de Israel. Essa ‘transfiguração’ da história, ou seja, essa possibilidade humana de ir além das meras aparências e fenômenos externos para colher o sentido profundo dos acontecimentos, permitiu a Jesus encarar com realismo, sem pavor, sem fatalismos e sem fanatismo, o desfecho assustador e fatal que o estava aguardando. Nas horas da angústia, da dúvida, da tentação, espera-se que estejamos atentos para captar as inúmeras sinalizações emitidas por Deus através dos acontecimentos da história para nos sentir confirmados em nossas opções ou para ter coragem para redirecionar rumos e fazer outras opções.(Fonte: Padre Bombieri, 2009)
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