A sede de punição não poupa sequer o juiz de Barra do Corda o Sr. Elias de Quiroga que após 20 anos da data do cometimento do homicídio de dois cidadãos, por um grupo indignado de indígenas, condena a 47 anos três deles que à época eram jovens de menor idade e que haviam sido entregues à justiça pela FUNAI para aplacar a revolta da população local.
Uma inaudita indignação havia tomado de conta de um grupo de mais de 50 indígenas, após terem visto esmagado por um caminhão o filho do Cacique Moisés em outubro de 1999. Os três passaram 07 (SETE) anos na Nona Delegacia no Bairro do São Francisco à espera de uma processo que veio só nessas semanas. A disputa pela competência à época protelou de forma inédita um julgamento e deixou três jovens numa cela de 3 x 4m. por longos sete anos. Como se não bastasse, o atual juiz de Barra do Corda, diferentemente dos seus colegas anteriores, entendeu que deviam serem punidos ainda mais. Retomou o processo e os condenou abusivamente a 47 anos sem direitos de serem devidamente assistidos por um intérprete e sem condições de compreender o que se passou no imaginário cultural coletivo daqueles indígenas ao praticar aquele crime. Mais que isso: com medo da reação e da possível resistência das aldeias a uma ordem de prisão o magistrado com o delegado local ENGANARAM os três pedindo que se apresentassem para uma audiência corriqueira, onde à noite seriam trazidos de volta, mas ao chegarem a Barra do Corda foi dada a ordem de prisão e encarcerados imediatamente. As famílias dos três continuam abaladas e sem entender uma sentença tão absurda e desumana. Os caciques da região vêm pedindo auxílio às Defensorias estadual e da União para exigir justiça. Aqui abaixo a carta que os caciques dirigem às Defensorias Estadual e da União.
Senhores Defensores,
ao cumprimentá-los, vimos através desse, solicitar os seus valiosos serviços para nos ajudar a ‘fazer justiça’ para três nossos parentes indígenas que se encontram presos na delegacia de Barra do Corda por causa de uma sentença pronunciada pelo Juiz daquela Comarca, Sr. Elias de Quiroga no dia 29 de março deste ano. São acusados de um crime que ocorreu em outubro de 1999. Esses nossos parentes com mais um grupo se deixaram vencer pela revolta e pela indignação por terem visto o filho do nosso parente Moisés Guajajara sendo atropelado na BR 226, que atravessa a nossa terra. Movidos por forte e descontrolada emoção, por mais um atropelamento, acabaram matando os primeiros viajantes que apareceram na estrada. Eram dois moradores de Barra do Corda. Nunca houve intenção de matar para roubar, ou seja, cometer latrocínio, como o citado juiz entendeu. Houve sim, uma espécie de revolta coletiva incontrolável como uma família nossa faria ao ver um seu filho sendo esmagado sem ser socorrido.
À época, diante da pressão da opinião pública e dos riscos concretos de invasão das aldeias por parte da população local, a FUNAI acabou oferecendo três jovens, - os acima citados, - por serem, supostamente, de menor idade. Eles foram encarcerados na nona delegacia em São Luís, e acolá passaram longo e inexplicáveis 7 (sete) anos esperando um justo e legal processo que nunca houve. Havia, à época uma disputa por competência, se cabia à Justiça Federal ou à Justiça Comum processar os acusados. Só depois que o STJ determinou que a competência fosse da Comarca de Barra do Corda, - 12 anos após o ocorrido, - é que o processo começou a caminhar. Ocorre que, recentemente, o juiz, talvez preocupado com a prescrição do processo e, no nosso entender, motivado por um íntimo e inexplicável desejo de punição, condenou no dia 29 de março de 2019 os três parentes a 47 anos de prisão.
Lamentamos, também, a forma como isto ocorreu, sendo que a justiça local, através do oficial de justiça e da Polícia Civil, enganou eles e seus familiares, pois se valeu de uma esperteza para prendê-los. Não ofereceram mandado de prisão, e sim uma simples intimação do Delegado, sequer assinada e, como sempre acontecia, os três aceitaram pacificamente ir até Barra do Corda. Ao chegar à Delegacia foram imediatamente algemados e trancafiados, sem mais, nem menos. Só à noite seus filhos e esposas souberam que haviam sido presos. Sequer deixaram se despedir!
Queremos ressaltar, enfim, que ao longo desses anos, e principalmente, com o atual juiz, em momento algum houve uma atenção diferenciada em virtude das peculiaridades culturais e do escasso entendimento da língua portuguesa e dos mecanismos da justiça. Nunca houve um intérprete, por exemplo, nos interrogatórios, para traduzir os depoimentos e/ou os termos técnicos, sem falar na pena a eles reservada que tem sido rigorosamente igual ou pior de qualquer um. Diante de tudo isso, nós abaixo-assinado, caciques e parentes próximos dos detentos solicitamos a sua preciosa intervenção e mediação para que ‘justiça seja feita’!
Desde já agradecemos.
Seguem assinaturas dos caciques e nomes das aldeias....
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