Com o domingo de Ramos mergulhamos na assim chamada Semana Santa. Nela somos convocados a fazer memória não somente da paixão e morte de Jesus, mas dos sofrimentos e das angústias de tantos homens e mulheres de hoje. A paixão de Jesus se torna a paixão da humanidade que, como Ele, é presa, traficada, detida, processada, e condenada de forma injusta. Ao mesmo tempo somos chamados a encarar a paixão e a morte não como um abandono de Deus, nem como um castigo, e sim, como um ‘carregar a própria e alheia cruz’ na certeza de que a vida é mais forte do que a brutalidade e a violência humana. A acolhida festiva e carregada de expectativa que os discípulos de Jesus lhe reservam em Jerusalém se transforma rapidamente num drama, e num momentâneo fracasso do profeta da Galileia, na sua missão de desencadear o novo jeito de governar de Deus. Daí que a liturgia hodierna nos propõe desde já a narrativa da paixão de Jesus.
O evangelho ou os evangelhos quando começaram a ser escritos, tiveram a preocupação de apresentar como principais e primeiros acontecimentos tudo o que se referia à paixão, condenação e morte de Jesus, e a sua Ressurreição. Os evangelhos começaram por aqui: no drama da morte de Jesus! Sabemos que os relatos mais antigos são os de Marcos. Os demais evangelistas bebem das informações que ele nos deixou. Nesse domingo nós meditaremos sobre a versão de Mateus. Podemos observar logo algumas características da sua narração:
1. Mateus que escreve a Judeus convertidos ao cristianismo tem a preocupação em mostrar que tudo o que aconteceu a Jesus já estava previsto pelas sagradas escrituras que eles conheciam. Mateus quer tirar aquela idéia que ainda existia na sua época de que o Messias que viria seria um todo-poderoso, um vencedor imbatível. Ao contrário, ele afirma que Jesus devia cumprir as escrituras, as que o vêem como o servo sofredor e não como um vencedor à moda humana. Com isso Mateus nos diz que todo discípulos é chamado a passar pela paixão e cruz.
2. Outro elemento que chama a atenção é que Mateus repudia todo recurso às armas, à violência. (v.52) Com aquelas palavras a Pedro, de guardar a espada, Jesus estava afirmando que os seus seguidores são os filhos da paz, e devem condenar todo tipo de recurso à violência. Algo que temos dificuldade de assimilar ainda hoje! O seguidor de Jesus não pode responder à violência da mesma forma.
3. Mateus é o único que nos informa que a ‘terra tremeu, os mortos ressuscitaram, o sol se escureceu...’(27, 51-56). Evidentemente são imagens teológicas para significar que estava surgindo justamente com a morte de Jesus o mundo novo, a nova era. Uma nova e inédita etapa na história da humanidade. Estas eram as expectativas do povo de Israel e Mateus faz questão de dizer que isso já começou com Jesus de Nazaré, o único e verdadeiro Messias. Não através de vitórias esplendorosas, e sim mediante o sofrimento. As mortes e as violências, a partir de agora, devem ser encaradas não com ânimo desesperado ou como abandono por parte de Deus, mas como algo que faz parte do ‘mundo novo’ inaugurado por Jesus. Portanto, algo que pode ser superado e vencido.
4. Mateus é o único que relata a morte de Judas. Tudo indica que é mais uma ‘imagem’ criada pelo teólogo Mateus, e quer nos dizer que todo discípulo que vive e convive com Jesus, e trai a sua mensagem e a sua prática, acaba se autodestruindo.
Por fim, somente Mateus nos fala dos guardas que vigiam o sepulcro de Jesus (27,62-66). Às vezes nós somos tentados em pensar que o mal e o poder da injustiça triunfaram. Que o justo foi derrotado e silenciado. Os ‘vencedores’ ficam tripudiando do inocente, mas Deus não trai os seus filhos e envia sempre alguém para fazer rolar a pedra que nos mantém cativos do nosso medo, do nosso desespero e desânimo. A luz, enfim, aparecerá para continuar a nos mostrar o caminho da vida.
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