Recentemente o ministro da Justiça Cardoso afirmou que a questão das demarcações de terras indígenas “Não é uma questão de tempo, é uma questão de cuidado”. Entendo. Loja de cristais mantida por dívida histórica, apropriações indébitas oficializadas em cartórios, barafundas da expansão agropecuária, sem que parte da sociedade e as três instâncias executivas de governo atentassem ao disposto em Lei de 1973, artigo 231 da Constituição de 1988 e Decreto-Lei de 1996. Que eu saiba, estamos em 2014. Sem pressa. Num ponto há que se concordar com o ministro: dá medo meter a mão em vespeiros políticos. A ferroada pode ser doída. No Congresso, força-se a aprovação da PEC 215, que passa do Executivo para o Legislativo o comando sobre a demarcação de terras. Algo como dar à raposa a guarda do galinheiro. O foco principal da disputa é a posse de terras valiosas da União, que demarcadas viram usufruto exclusivo de índios, o que não impede a cobiça da especulação imobiliária de garimpeiros, madeireiros, ou até grandes projetos públicos e privados de mineração e energia hídrica. Apesar da precaução ministerial, muitos não veem assim tão difíceis as questões em que a queda de braço fica mais brava. Produtores rurais dizem ter recebido as terras do governo, de papel passado, apenas Deus não tendo assinado abaixo, como queria Vinícius de Moraes.Acrescentam ser muita terra pra poucos índios, que nada fazem com elas, na espera de conquistarem celular, moto e, provavelmente, rituais de música e dança ostentação.Do outro lado, partidos políticos de esquerda e ONGs dedicadas aos direitos ambientais e de minorias acusam a produção agropecuária de ter invadido áreas constitucionalmente pertencentes aos índios.Em sua coluna na Folha de São Paulo, “Cidadania, e não apito!”, comemorando o Dia do Índio, a presidente da CNA, argumentou: “Se o problema consiste em terras, que [elas] sejam compradas a preços de mercado. Far-se-ia justiça aos indígenas injustiçados, sem que outra injustiça fosse cometida, expropriando terras de produtores rurais que as compraram legitimamente. Possuem títulos de propriedade que remontam há décadas, se não séculos”.Parece razoável. Sem dúvida, a solução é demarcação urgente e indenização justa, o que inclui benfeitorias porventura feitas. Aliviaria a tensão nos 1,5% das terras fora da Amazônia Legal, onde vivem 300 mil indígenas.Bastam recursos bem alocados, reforma na gestão da FUNAI, e firme decisão política.O que se percebe difícil, no entanto, até fora de cogitação, é estender à sociedade compreensão histórica, sociológica e antropológica para o fato de que estas terras já estavam povoadas antes do aporte colonizador.Andando um pouco mais, deveríamos entender o valor de se incorporar ao patrimônio do país tais diversidades multicultural e étnica. O mesmo que, na Ciência da Vida, representa a mais rica biodiversidade do planeta, há séculos sendo destruída ou dada de mãos beijadas.Somente um projeto educacional amplo, que ensinasse os valores protetivos representados na sobrevivência dos índios, em características culturais inatas, mesmo quando em transformação pelo contato com civilizações não tribais.Índios frequentando universidades, usando calças jeans, andando de motos, falando ao celular, ou preferindo uísque ao cauim, meus senhores, continuam sendo índios.(Fonte: Carta Capital)
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