Nós nos habituamos a celebrar o Natal como sendo a festa do nascimento de Jesus. Porém, não sabemos exatamente quando e onde ele nasceu. Não existem registros confiáveis que nos possam assegurar que Cristo tenha nascido no dia 25 de dezembro. O que se sabe com certeza é que neste dia, no mundo greco-romano, festejava-se o nascimento de Mitra, o deus indo-europeu da luz celeste, considerado o guardião da verdade e inimigo da mentira. Também não sabemos com segurança se Jesus nasceu em Belém. Hoje a maioria dos estudiosos da Bíblia acredita que a afirmação do nascimento de Jesus em Belém seja apenas uma construção teológica, inspirada na profecia de Miquéias (5,1), com o objetivo de relacioná-lo com o rei Davi e, assim, identificá-lo com o Messias esperado pelo povo hebreu. O mais provável e lógico é que Jesus tenha nascido em Nazaré (Jo 1,46). Esse tipo de recurso teológico era muito natural naquela época. Para eles o importante não era um dado histórico exato, mas o significado simbólico e metafórico de um determinado fato ou personagem. Quando o cristianismo se expandiu neste ambiente encontrou esta festa e fez um processo de inculturação. Transformou o nascimento de Mitra na festa do nascimento de Jesus, considerado pelos cristãos a "luz que brilha nas trevas” (Jo 1,5) e que era cheio de pura "graça e verdade” (Jo 1,17). Assim o dies natalis (dia do natal) de Mitra foi sendo transformado em dia do nascimento de Cristo. O objetivo dessa extraordinária construção cultural foi introduzir sem muita violência e sem muito impacto sociocultural o culto cristão no ambiente greco-romano. Aliás, cabe dizer que o cristianismo, inteligentemente, realizou o mesmo processo para tantas outras coisas.
Sei perfeitamente que alguns cristãos detestam que se fale dessas coisas. Eles acreditam que uma fé genuína pode ser mantida no século XXI com "estórias da carochinha”. Pensam que o cristianismo pode se conservar escondendo certas verdades. Se assim fosse o cristianismo não estaria em crise na Europa, ambiente onde ainda se insiste, dentro das Igrejas, em proclamar como verdade absoluta aquilo que é apenas periférico. Se o cristianismo, ao invés de insistir obsessivamente na veracidade histórica de certos episódios, soubesse apresentar o significado simbólico-antropológico que está por detrás de certas narrativas, ele conseguiria dar aos homens e às mulheres de hoje muito mais esperança (1Pd 3,14-17). Nesta perspectiva é importante dizer que no Natal não celebramos um fato cronológico. O que celebramos no Natal, antes de tudo, é o fato de que o Filho de Deus se humanizou, ou seja, se tornou como nós. E com este fato extraordinário celebramos outro não menos importante: a alforria de toda a humanidade e a sua elevação à categoria de filiação divina. Ao nascer de mulher, isto é, ao assumir a condição humana, Cristo declara totalmente absurda qualquer forma de escravidão das pessoas. De modo que se pode afirmar que o Natal é a celebração da humanidade do Filho de Deus e da divinização da humanidade. Por essa razão, para o cristianismo, é inaceitável qualquer coisa que violente a dignidade humana. (Fonte: José Lisboa Moreira - síntese do artigo)
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