Em terras maranhenses, poucos assuntos incitam discussões tão acirradas quanto a implantação do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA). "Se, por um lado, ele simboliza nossa ‘janela para o espaço’, por outro, ele se tornou um nefasto violador de nossos direitos fundamentais", atacou o advogado Danilo Serejo Lopes, quilombola integrante do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial (Mabe). Quem ouve a afirmação assim, de passagem, pode pensar que é exagero. Mas não é – o próprio presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), o matemático e também maranhense José Raimundo Coelho, concordou com parte das críticas colocadas pelos militantes do Mabe durante a 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em São Luís (MA). "Estive em Alcântara recentemente e vi com meus próprios olhos: a situação lá ainda carece de muitos cuidados", admitiu o presidente da AEB.No início da década de 1980, no âmbito do programa espacial brasileiro, o poder público apropriou-se de aproximadamente 52 mil hectares de terras alcantarenses. Cerca de 300 famílias foram realocadas nas chamadas ‘vilas agrárias’. "Além disso, o Estado nos deu terras em regime individual, mas nunca soubemos o que é isso; nossas áreas sempre foram de uso comum", contextualizou Lopes, lembrando que, em sua maioria, eram terras inférteis. Tal sucessão de episódios foi a gênese de um trauma social que é, ainda hoje, uma das questões mais candentes do Maranhão. "Não somos contra o CLA, não somos contra o programa espacial brasileiro", afirmou Lopes pelo Mabe. "Entendemos sua importância estratégica e queremos, de fato, que nossos filhos tenham a chance de se inserir como partes pensantes desses projetos. Mas não podemos permitir que continuem nos privando do direito constitucional de vivermos em nossas terras." No fim das contas, entre consentimentos e desavenças, a base de Alcântara não deixa de ser um retrato típico da contradição generalizada que é o Brasil. Afinal, trata-se de um centro de tecnologia de ponta circundado por terras onde o século 21 mal chegou; um ambiente de prosperidade científica regada à tecnologia aeroespacial de fronteira nas barbas do litoral do Maranhão – o estado mais pobre do país segundo o último censo do IBGE. (Fonte: IHU)
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